O plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) retomou o julgamento que pode tornar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) inelegível pelos próximos oito anos na manhã desta quinta-feira (29). Às 9h15min, o ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE, deu início aos trabalhos fazendo a leitura da ata, e em seguida, passou a palavra ao ministro Raul Araújo, que em uma fala de mais de 1 hora, votou contra a inelegibilidade de Bolsonaro.
O segundo a votar nesta quinta-feira, ministro Floriano Marques foi enfático na sua manifestação. Disse que houve abuso de poder do ex-presidente e desvio de finalidade na reunião com embaixadores. Além disso, considerou válida a inclusão da minuta do golpe no processo. Floriano votou procedente a ação contra Bolsonaro, condenando assim o ex-presidente a ficar inelegível pelos próximos oito anos. Ele decidiu absolver o então vice-presidente Walter Braga Netto.
O ministro destacou que a reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada foi realizada de improviso, na residência oficial do presidente. O que, segundo ele mostram que não se tratou de um mero ato de agenda presidencial. A respeito do discurso proferido por Bolsonaro na ocasião, Floriano foi categórico ao dizer que houve "claro objetivo eleitoral": "Se aproximou muito de um discurso de comício em praça do Interior".
O magistrado classificou como "imoral" o ato de Bolsonaro.
A ação apura as responsabilidades do ex-presidente em reunião realizada no Palácio da Alvorada em 18 de julho do ano passado. Na ocasião, diante de vários embaixadores estrangeiros, o ex-chefe do Executivo fez uma série de ataques ao sistema eleitoral brasileiro e às autoridades encarregadas de conduzir e fiscalizar as eleições.
Ao acompanhar o relator, o ministro Floriano de Azevedo Marques dissecou o discurso do ex-presidente no evento com embaixadores e identificou quatro linhas de retórica, todas com conotação eleitoral, ressaltando ainda que o enquadramento jurídico está focado no artigo 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei de Inelegibilidade), particularmente em condutas que caracterizem desvio ou abuso de poder ou utilização indevida dos veículos ou meios de comunicação. “Diz a lei: apurada essa conduta abusiva, a Justiça Eleitoral aplicará a sanção de inelegibilidade para as eleições que se realizarem nos oito anos subsequentes à eleição que se verificou”, destacou. O ministro analisou detalhadamente a fala do ex-presidente na ocasião da reunião e destacou sete pontos.
1) O evento em questão não se inseriu nas atividades diplomáticas de representação do país perante autoridades estrangeiras.
2) A organização da reunião não ficou a cargo dos órgãos que seriam competentes para fazê-lo, o que demonstra não se tratar de um ato regular de governo.
3) O evento foi realizado fora dos lugares próprios e adequados para atos de governo, sendo realizado na residência oficial (Palácio da Alvorada).
4) O discurso proferido teve nítido caráter de estratégia eleitoral para valorizar a imagem do candidato, bem como para manchar a imagem do principal opositor e tentar criar empatia com o eleitorado, apresentando-se como candidato perseguido e contra o sistema.
5) O discurso teve também caráter voltado a deslegitimar e colocar sob suspeita o processo eleitoral, gerando potencialmente um desincentivo à participação do eleitor com vistas à obtenção de benefícios.
6) O discurso primou pela desinformação e por acusações sabidamente falsas ou no mínimo improváveis.
7) O discurso visava trazer benefício eleitoral.
“Houve desvio de finalidade, na medida em que o primeiro investigado usou das suas competências de chefe de Estado para criar uma aparente reunião diplomática com o objetivo, na verdade, de responder ao TSE e construir uma persona de candidato, servindo-se dos meios e instrumentos oficiais, inclusive de comunicação social, para alcançar o seu real destinatário, o eleitor, seja o já cativado ou aquele a conquistar”, afirmou. Ainda de acordo com o ministro, houve abuso de poder político, pois o primeiro investigado mobilizou todo o poder de presidente da República para emular sua estratégia eleitoral em benefício próprio, agindo de maneira anormal, imoral e, principalmente, grave. “Portanto, para mim, o abuso e o desvio da autoridade estão claros”, asseverou
Faltam os votos dos ministros André Ramos Tavares, Cármen Lúcia, Nunes Marques e, por último, do presidente do tribunal, Alexandre de Moraes.
Como o julgamento é terminativo, a decisão tem efeito imediato, sem possibilidade de eventual pedido de efeito suspensivo. A defesa pode ingressar com embargos de declaração no próprio TSE, mas apenas para esclarecimento de eventual omissão, contradição ou obscuridade na decisão. O único recurso capaz de mudar a decisão é o recurso extraordinário (RE), que precisa ser admitido pelo TSE antes de ser enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), onde será analisada possível afronta à Constituição.