A Justiça manteve a decisão de primeiro grau que condenou o ex-vereador de Porto Alegre Valter Nagelstein por racismo. A sentença foi definida na tarde desta quarta-feira (26) pela 8ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça (TJ). Nagelstein informou que julga a decisão equivocada e que vai recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O caso se refere a um áudio enviado por Nagelstein a apoiadores após o primeiro turno da eleição municipal de 2020. Na gravação, o ex-vereador, que foi candidato à prefeitura da Capital e ficou em sexto lugar, se refere aos vereadores recém-eleitos do PSOL como "muitos deles jovens, negros" e "sem nenhuma tradição política, sem nenhuma experiência, sem nenhum trabalho e com pouquíssima qualificação formal".
Nagesltein foi denunciado pelo Ministério Público. Em março de 2022, o juiz de direito Sidinei José Brzuska, da 3ª Vara Criminal do Foro Central da Comarca de Porto Alegre, condenou o ex-vereador a dois anos de prisão em regime aberto, com a pena substituída por prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, prestação pecuniária de 20 salários mínimos, além de multa.
Nesta quarta-feira, a relatora desembargadora Naele Ochoa Piazzeta votou contra o provimento à apelação da defesa e foi acompanhada pelas desembargadoras Fabianne Breton Baisch e Isabel de Borba Lucas, mantendo a decisão do primeiro grau.
A magistrada destacou a intenção do ex-vereador de traçar um perfil depreciativo dos parlamentares da denominada bancada negra da Câmara da Capital. Segundo ela, o réu teria vinculado a raça à ausência de qualificação para ocupar a função pública.
"Impõe-se, aqui, o questionamento sobre a pertinência de, ao listar expressões aviltantes direcionadas aos candidatos eleitos, fazer menção à raça dos vereadores, como se tanto indicasse menor capacidade à ocupação do cargo político ambicionado e ao adequado desempenho das funções parlamentares. Destaco que, para fins de apreciar o dolo da manifestação protagonizada pelo acusado, mostra-se fundamental atentar às circunstâncias que envolvem a situação sob exame, evitando-se, assim, o risco de afastamento do teor da reflexão proposta da conjuntura que a envolve", disse a relatora.
A desembargadora Naele destacou ainda que “a mera invocação do direito fundamental à liberdade de expressão ou da imunidade parlamentar, prerrogativa que, em concreto, não se aplica ao discurso sob exame, na esteira da fundamentação supra, não se presta a afastar a configuração de delito consistente na prática, indução ou incitação à discriminação ou preconceito de cor”.
Ela acrescenta também que "o emprego do termo 'negros' no contexto do discurso de desqualificação de adversários políticos supera a perspectiva particular de cada parlamentar e atinge, modo indiscutível, a coletividade de pessoas negras e a ideia de pertencimento étnico".
O caso no âmbito eleitoral
No âmbito eleitoral, Nagelstein poderá sofrer reflexos da condenação por conta da Lei das Inelegibilidades (64/1990) e da Lei da Ficha Limpa (135/2010). A legislação determina que ficará inelegível para qualquer cargo aquele que for condenado, em decisão proferida por órgão colegiado, pelo crime de racismo, entre outros delitos previstos no artigo 1º.
Em tese, é a situação de Nagelstein. A inelegibilidade vale desde a condenação até o transcurso do prazo de oito anos após o cumprimento da pena.
Caso Nagelstein se inscreva como candidato em eleições futuras, será necessário que o Ministério Público Eleitoral ou alguma candidatura adversária ingresse com pedido de impugnação. A confirmação da inelegebilidade, a partir de eventual solicitação, caberá à Justiça Eleitoral.
Ouça o áudio que motivou o processo e leia a transcrição da mensagem:
“Gente, bom dia a todos. Primeiro lugar, muito obrigado. É o Valter que está falando, pelo apoio que tive. Rapidamente, queria fazer duas ou três reflexões com vocês. Primeira delas: fica cada vez mais evidente que a ocupação que a esquerda promoveu nos últimos 40 anos, da universidade, das escolas, do jornalismo e da cultura produzem os seus resultados. Basta a gente ver a composição da Câmara. Cinco vereadores do PSOL (na verdade são quatro) muitos deles jovens, negros, quer dizer, o eco àquele discurso que o PSOL foi incutindo na cabeça das pessoas. Pessoas, vereadores esses, sem nenhuma tradição política, sem nenhuma experiência, sem nenhum trabalho e com pouquíssima qualificação formal. Então, essa é a primeira reflexão que eu queria fazer.
A segunda, não se impressionem aí com o número de votos que eu acabei fazendo, que o Paim (Gustavo Paim, candidato do PP) acabou fazendo. A primeira questão: eu estava num partido com pouca estrutura. Eu fiz a campanha mais modesta de todos os candidatos. A gente teve pouco recurso. Tive pouco tempo de TV, também: 43 segundos, embora com muitas ideias, como vocês sabem. E com muita qualificação, como vocês sabem também. Mas isso, por si só, infelizmente, não é suficiente para uma eleição atípica, com pouco tempo de TV e com as pessoas muito desligadas do processo eleitoral. E o fenômeno da pesquisa, que eu sempre disse que estava errado e eu reafirmo isso no seguinte sentido: quando a pesquisa mostrou, essa semana, que a Manuela tinha 40%, muita gente que ia votar em mim, que ia votar no Gustavo Paim, por exemplo, mas em mim, principalmente, eu acho, acabou migrando para votar no Sebastião Melo, pelo tal do voto útil. Por quê? Porque não queria, evidentemente, que a Manuela ganhasse, que a esquerda ganhasse. Então, acabou indo pra lá.
Isso não desfaz da nossa campanha, isso não desfaz do legado que a gente deixou e isso, mais do que qualquer outra coisa, não desfaz a gratidão que eu tenho a cada um de vocês por essa luta e por essa ajuda.
Duas questões agora: eu vou propor a criação de um instituto de ideias conservadoras, se chama Conservar. É uma ideia que eu tive há dois anos atrás e que está na hora de implementar para o futuro. Porque nós precisamos, primeiro, trabalhar a questão ideológica, o que são as ideias conservadoras, e espalhar essas ideias. Segundo, nós precisamos planejar estratégias de ação e, terceiro, nós precisamos programar e também planejar políticas de comunicação para melhor nos comunicar com a sociedade. Então esse é o primeiro desafio, que já fica aqui lançado um convite pra gente se organizar.
E, dois, que é mais importante. Nos próximos dias, ajudar a esquerda a não ganhar em Porto Alegre. A esquerda já ganhou na Câmara de Vereadores, mas a esquerda não pode ganhar a prefeitura e nesse sentido eu convoco a todos vocês, que nós temos que nos somar, nós temos que nos unir, para evitar que isso aconteça. No mais, muito obrigado a todos. Obrigado mesmo.”