Principal baliza do governador Eduardo Leite nas ações de enfrentamento à pandemia, o sistema de distanciamento controlado acabou se tornando instrumento político na votação em primeiro turno do fim do plebiscito para venda de estatais. A vitória do governo na votação de terça-feira (27) na Assembleia Legislativa só foi possível após serem alteradas as regras do modelo, permitindo o retorno das aulas presenciais no Estado.
Desde a noite anterior, deputados da base aliada enviavam recados ao Piratini, demonstrando indisposição em votar a proposta de emenda à Constituição (PEC) se Leite não adotasse medidas possibilitando o funcionamento das escolas. Ao final da votação, os 33 votos favoráveis, mínimo exigido para aprovação de uma PEC — número que é contestado pela oposição devido a correções durante a sessão — só foram alcançados após Leite garantir a publicação de um decreto revogando a salvaguarda que mantinha o Estado em bandeira preta.
Pressionados pelas bases eleitorais, os parlamentares esperavam que o Tribunal de Justiça liberasse ainda na segunda-feira a volta dos estudantes aos colégios. Mantida a proibição, eles ensaiaram barrar a votação da PEC enquanto Leite não tomasse alguma atitude para reverter a situação.
A informação de que o Estado entraria em bandeira vermelha veio ainda na manhã de terça-feira, quatro horas antes do início da sessão. Como não se tratava de um anúncio oficial, alguns deputados permaneceram reticentes. Para frear o princípio de rebelião, o chefe da Casa Civil, Artur Lemos, enviou um ofício aos parlamentares, confirmando que o fim da bandeira preta. Também durante a sessão, Leite divulgou um vídeo anunciando oficialmente a medida e marcando para 10 de maio o fim da vigência do atual modelo de bandeiras.
Havia pelo menos quatro deputados dispostos a não votar com o governo: Any Ortiz (Cidadania), Paparico Bacchi (PL), Fran Somensi (Republicanos) e Franciane Bayer (PSB). A cobrança mais explícita, porém, teve origem nos dois integrantes do Novo, Fábio Ostermann e Giuseppe Riesgo.
- Acabamos nos vendo forçados a fazer um movimento pragmático – admitiu Ostermann, pouco antes de votar a favor da PEC.
Ao cabo, os votos do Novo se tornaram fundamentais na derrubada do plebiscito, sobretudo diante das seis defecções registradas na base aliada. A confusão no voto de Neri, O Carteiro (SD), anulado após ter sido colhido de forma irregular pelo presidente da Assembleia, Gabriel Souza, tornou ainda mais eloquente a dependência que o Piratini tem de Ostermann e Riesgo, dois deputados que têm uma relação tumultuada com o governo.
Agora, Leite se prepara para uma nova batalha na votação do segundo turno da PEC, prevista para 11 de maio. A principal preocupação é não perder nenhum apoio. O Piratini tem ao menos uma baixa quase certa. Grávida, Any deve entrar em licença-maternidade nos próximos dias, reduzindo a margem governista o arriscado quórum de 33 votos. Para evitar surpresas, a ideia é tentar reverter a posição de aliados que são signatários da proposta mas votaram contra, como Airton Lima (PL) e Capitão Macedo (PSL), ou que se abstiveram, como Adolfo Brito (PP).
Haverá conversas também com Tiago Simon (MDB), Patrícia Alba (MDB) e Elton Weber (PSB), refratários à privatização da Corsan. Já a oposição pretende se aproximar dos descontentes para ampliar a insurgência na base governista.