Depois de ver a arrecadação despencar 18,8% em abril devido aos efeitos econômicos da pandemia, o governo do Estado se prepara para um tombo ainda maior em maio — e reforça a pressão no Congresso para garantir socorro federal o mais rápido possível. Segundo projeções da Receita Estadual, as perdas em ICMS podem chegar a cerca de R$ 900 milhões, o equivalente a 30,8% do que havia sido previsto para o mês (R$ 2,9 bilhões), antes do coronavírus.
É como se, de uma hora para outra, o Estado ficasse sem o dinheiro que usa para investimentos ao longo de um ano inteiro. Ou, em outra comparação não menos dramática, R$ 900 milhões a menos em caixa significam em torno de 60% de uma folha de pagamento mensal do Executivo, uma das principais despesas do governo.
Se até agora o Tesouro Estadual já enfrentava dificuldades para quitar os salários do funcionalismo, a tendência é de que a situação piore. Sem garantia de que terá recursos suficientes, a Secretaria da Fazenda anunciou nesta quarta-feira calendário parcial de pagamento dos contracheques de abril (veja os detalhes no fim do texto).
As finanças dos Estados irão colapsar, com atrasos em massa de salários e interrupção de serviços, situação ainda mais crítica para o RS.
MARCO AURELIO CARDOSO
Secretário Estadual da Fazenda
Preocupado diante das incertezas, o secretário estadual da Fazenda, Marco Aurelio Cardoso, confirma a possibilidade de colapso, se nada mudar no curto prazo.
— As finanças dos Estados, em especial daqueles de maior arrecadação de ICMS, irão colapsar, com atrasos em massa de salários e interrupção de serviços, uma situação ainda mais crítica para o Rio Grande do Sul. Além da necessidade de recomposição de parte das perdas, há de se pensar em dois elementos fundamentais: urgência e liquidez. Operações de longo prazo ou critérios focados apenas na população dos Estados não atendem à Região Sul. As perdas de arrecadação têm, também, potencial para deteriorar as finanças dos municípios, com efeitos em cadeia em todo o setor público — adverte o economista.
Responsável por chefiar a equipe que monitora diariamente a evolução da arrecadação, Ricardo Neves Pereira, chefe da Receita Estadual, reforça o alerta. Na avaliação dele, a aprovação do projeto de lei complementar 149, que prevê a recomposição das perdas de ICMS de Estados e municípios por parte da União, é fundamental.
— Estamos todos os dias fazendo reuniões e revendo as estimativas. Se os números se confirmarem, o impacto poderá se traduzir em atrasos no fluxo de caixa e na redefinição de calendário de pagamentos dos servidores. A recomposição do ICMS é urgente, sob pena de dificuldades enormes — diz Pereira.
A recomposição do ICMS é urgente, sob pena de dificuldades enormes
RICARDO NEVES PEREIRA
Chefe da Receita Estadual
Os reflexos da crise da covid-19 começaram a ser sentidos com maior intensidade em abril. Concluído nesta quarta-feira, relatório da Receita indica que, só na Semana Santa, o valor das notas fiscais emitidas no Estado caiu 29% na comparação com igual período do ano anterior. Nos últimos 28 dias, o varejo acumulou perdas da ordem de 26%.
É por isso que, em abril, a conta deve fechar com R$ 750 milhões a menos nos cofres estaduais, conforme já confirmado pelo governador Eduardo Leite. Aliada ao que ainda vem pela frente, a perspectiva sombria levou o mandatário a anunciar, na última terça-feira, novo contingenciamento orçamentário, com economia de R$ 40 milhões em gastos com custeio.
O valor é quase nada frente à tempestade que se avizinha, mas Leite argumenta que é o que pode fazer diante de um "orçamento extremamente engessado e com pouca margem de redução de despesas". É por isso que Leite tem trabalhado, junto a outros governadores, para cobrar agilidade do Congresso e solidariedade da equipe econômica.
Nesta quinta-feira, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), deve apresentar o relatório do projeto 149, já aprovado na Câmara. O senador irá propor mudanças no texto, entre elas a limitação do valor e do prazo de compensação de ICMS (dos Estados) e ISS (municípios) e o congelamento salarial de todo o funcionalismo por 18 meses — uma das exigências do ministro da Economia, Paulo Guedes.
A votação do projeto, por hora, está prevista para sábado, mas, no governo do Estado, a expectativa é de que a apreciação possa ocorrer ainda nesta quinta, para voltar o quanto antes para nova análise dos deputados.
— Reforçamos o apelo ao Senado para que aprove o projeto. É um socorro necessário ao povo brasileiro para que os serviços não sejam precarizados. Não se trata de um auxílio aos governadores e aos prefeitos, mas sim à população, que é quem paga o preço por serviços comprometidos — pediu Leite, em videoconferência.
Arrecadação de ICMS prevista para maio, segundo dados da Receita Estadual
Antes de estourar a pandemia: R$ 2,929 bilhões
Depois de estourar a pandemia: R$ 2,028 bilhões
Redução de R$ 901 milhões (30,8%)
R$ 901 milhões equivalem a...
…60% do valor bruto da folha de pagamento do Executivo (R$ 1,5 bilhão)
...praticamente todo valor aplicado em investimentos em 2019 (R$ 928 milhões)
Como fica a folha de abril do Executivo
- O primeiro depósito ocorrerá nesta quinta-feira (30), com a quitação dos salários do grupo de servidores que recebem líquido até R$ 1.100 (12,9% dos vínculos).
- O próximo repasse está previso para 11 de maio, com a quitação dos contracheques do grupo de servidores que recebe líquido até R$ 1.500 (26,6% dos vínculos).
- Quem ganha acima deste valor terá seu salário pago em parcelas.
- O primeiro depósito deve acontecer no dia 12 de maio, no valor de R$ 1.500.
- As demais parcelas serão informadas pela Secretaria da Fazenda até 12 de maio.