Ciente das resistências que ainda enfrenta na base aliada, o governador Eduardo Leite fez questão de entregar pessoalmente à Assembleia Legislativa, a convocação extraordinária dos deputados para votação da reforma do funcionalismo. Os nove projetos protocolados nesta quarta-feira (22) serão apreciados de terça (28) a sexta-feira (31) da próxima semana, em sessões que devem invadir as madrugadas.
Após três semanas de negociações e a despeito das pressões de deputados e das corporações, Leite decidiu insistir em cobrar alíquotas de 7,5% a 22% dos servidores da Brigada Militar e do Corpo de Bombeiros. A postura do governador contraria normativa federal publicada nesta semana e tem no MDB o principal obstáculo à aprovação.
Com oito cadeiras, o partido fechou questão contra a medida e diz que só vota a favor caso o governo aceite reproduzir no Estado a regra nacional que limita a 9,5% em 2020 e a 10,5% em 2021 o desconto sobre militares. Leite salientou a apresentação de uma nova tabela salarial para a BM (veja quadro) e lembrou que a carreira é uma das únicas com direito ao salário integral na aposentadoria e reajustes idênticos aos servidores da ativa. Ele reconheceu as objeções dos emedebistas, mas não descartou novas negociações até o início das votações.
— Estamos absolutamente seguros. A Constituição diz que é responsabilidade dos Estados legislar sobre temas previdenciários. Mas a discussão se mantém até terça-feira — projetou o tucano.
Para aprovar a medida, o governo precisa de 28 votos favoráveis entre os 40 deputados da base. A conta é apertada, sobretudo porque além dos oito votos contrários do MDB há ainda os três do PSL, outra legenda que fechou posição contra as alíquotas progressivas. Sem os dois partidos, restam 29 parlamentares na base, cuja fidelidade terá de ser integral para que não haja riscos de derrota.
Em contabilidades paralelas que circulam pela Assembleia, há estimativa de um empate em 27 a 27. Se isso ocorrer, o presidente da Casa, Luis Augusto Lara (PTB), terá de dar o voto de minerva. Nos bastidores, havia nesta quarta quem atribuísse a presença do governador e de seis dos seus principais auxiliares na entrega da convocação, e inclusive viagem dele e do vice Ranolfo Viera Junior no final de semana, permitindo a Lara ocupar interinamente o governo do Estado, como uma deferência ao petebista diante de uma eventual necessidade do voto de desempate.
A preocupação mais urgente, todavia, continua sendo o MDB. O Piratini teme que a resistência de uma legenda com largos espaços no governo incentive defecções em outras bancadas. Para evitar que descontentamentos alheios contaminem a votação, a determinação é negociar cada item até os últimos instantes em plenário. Em função do tamanho e da influência, a transigência com o MDB é maior.
Ao final da solenidade de entrega da convocação, Leite foi até o canto onde estava o líder do partido, Fábio Branco, para dizer que ainda estava esperando o cálculo do impacto fiscal de uma sugestão da bancada sobre o congelamento da parcela autônoma do magistério, evitando assim sua extinção gradual.
— Só para dizer que aquelas demandas estão sendo analisadas — avisou Leite.
Branco agradeceu, mas permanecia irredutível.
— Seria muito arriscado para o Estado votar algo diferente da lei federal, abre margem para um passivo gigantesco — disse o deputado.
Apesar da margem para novas concessões, Leite disse que a flexibilização de algumas medidas para atender aos pedidos dos deputados consumiram ao menos R$ 4 bilhões da economia prevista para os próximos 10 anos, reduzindo o R$ 25,4 bilhões para R$ 21 bilhões o impacto do pacote.
Na tentativa de evitar cortes ainda maiores nos resultados financeiros, o Piratini não fez mudanças no texto da PEC da Previdência, o primeiro a ser apreciado na convocação extraordinária e o único que precisa de 33 votos para aprovação. Alguns itens foram retirados do texto original e incluídos no projeto de lei complementar que altera o estatuto dos servidores, mas de novo abriu margem para negociações de última hora em plenário.
— Alea jacta est — sentenciou Leite ao deixar a Assembleia, recorrendo à expressão em latim "a sorte foi lançada".