Seis anos depois da deflagração da Operação Concutare pela Polícia Federal, a Justiça Federal aceitou denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra parte do núcleo político do suposto esquema criminoso. A decisão foi do juiz Guilherme Beltrami, da 7ª Vara Federal de Porto Alegre.
A denúncia foi apresentada pelo procurador da República Felipe Muller contra os ex-secretários estaduais do Meio Ambiente Berfran Rosado (réu no processo por corrupção ativa) e Carlos Fernando Niedesberg (réu por corrupção passiva) e o ex-servidor da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) Mattos Alem Roxo (réu por corrupção passiva). Os réus têm dez dias para responderem à acusação.
O gesto do MPF ocorreu no dia 29 de novembro, 23 dias após a Justiça Federal ter arquivado o inquérito do caso por "inércia" da promotoria. A apuração havia sido concluída pela Polícia Federal em agosto de 2013, e o prosseguimento do caso dependia do MPF, que recorre contra o arquivamento.
Deflagrada em abril de 2013, a Operação Concutare investigou crimes para liberação de licenças ambientais. Esses três e outras 46 pessoas foram indiciados pela PF em 30 de agosto de 2013. Duas ações penais estão prontas para serem sentenciadas.
O advogado de Berfran Rosado, Luciano Feldens, afirma que o MPF "fabricou" a denúncia "depois de seis anos de inatividade".
— Depois de seis anos de inatividade do MPF, o inquérito foi arquivado por falta de base para a acusação. Uma semana depois desse arquivamento, o MPF fabrica uma denúncia no inquérito arquivado, desobedecendo decisão do TRF da 4ª Região. Está clara a inconsistência da acusação.
GaúchaZH busca a posição de Mattos Alem Roxo. O ex-secretário Carlos Niedersberg disse que recebeu a denúncia 'com muita surpresa'.
— A denúncia é uma peça de ficção que já tinha sido arquivada. Apesar disso, é uma oportunidade de esclarecer os absurdos de que fui vítima há seis anos atrás — declarou à reportagem.
A denúncia
Os fatos que motivaram a denúncia seriam referentes a processos de licenciamento ambiental em dois condomínios residenciais do Litoral Norte em 2012. O procurador da República Felipe Muller alega que Berfran seria associado do Instituto Biosenso de Sustentabilidade Ambiental, que, segundo o MPF, era uma empresa "destinada à intermediação ilícita entre empreendedores com problemas em processos de licenciamentos ambientais e servidores públicos atuantes em órgãos ambientais".
"Através do Instituto Biosenso, Giancarlo (Tusi Pinto, presidente da instituição, que morreu em 2017 e não é objeto da denúncia) e Berfran atuavam como despachantes/consultores ambientais, ou qualquer outra denominação que corresponda à prática de intermediação de interesses de empresários junto a órgãos públicos para a liberação de licenças ambientais. Contudo, no desenrolar das investigações, observou-se que, a despeito de algum assessoramento técnico que possa ter sido prestado aos seus contratantes, a atividade principal do Instituto Biosenso correspondia à prática de advocacia administrativa (em coautoria com servidores públicos) e de corrupção junto ao órgão ambiental", afirma o MPF.
Caso tramitava desde 2013
A denúncia do MPF criou uma situação incomum. Em 6 de novembro deste ano, a juíza Karine da Silva Cordeiro, da 7ª Vara Federal de Porto Alegre, já havia ordenado o arquivamento do inquérito em relação a Berfran. Naquela decisão, ela registrou que a última diligência do MPF no caso havia sido em 2014 e que, ao ser questionado sobre o pedido da defesa (de arquivamento), o MPF não apresentou “qualquer justificativa para a inércia no oferecimento da denúncia”.
Após a decisão que beneficiou Berfran, outros dois investigados, Luiz Fernando Zachia e Elvio Alberto dos Santos, também pediram arquivamento do inquérito em relação a eles, em razão da demora do MPF em fazer a denúncia. A juíza entendeu que era situação “idêntica” à de Berfran e atendeu à solicitação no último dia 25. Além disso, estendeu a decisão para outros 18 indiciados na investigação. No dia 28 de novembro, Zero Hora publicou reportagem sobre a decisão da Justiça, e o MPF informou que apresentaria no dia seguinte (29) uma primeira denúncia em relação a esse caso, o que efetivamente aconteceu.