Com apoio da maioria dos líderes partidários, os presidentes da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), firmaram nesta terça-feira (26) um acordo para levar adiante a proposta de tramitação mais demorada para retomar a prisão logo após condenação em segunda instância. Uma eventual decisão, assim, fica para 2020.
Em uma uma reunião com a presença do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, ficou acordado que o projeto de lei, proposta que tramita mais rapidamente, será engavetado no Senado, que criará uma comissão especial para acompanhar a proposta de emenda à Constituição (PEC) que tramita na Câmara.
A discussão no Congresso ganhou força após a soltura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), no dia 8 de novembro. A libertação ocorreu depois de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que entendeu que condenados em segunda instância não podem começar a cumprir suas penas antes que se esgotem todos os recursos em tribunais superiores, mudando a jurisprudência aplicada desde 2016 na corte.
Enquanto um projeto de lei é aprovado por maioria simples, uma PEC precisa de três quintos das duas Casas — 308 deputados e 49 senadores — e é votada em dois turnos, tanto na Câmara como no Senado.
Deputados e senadores dos partidos Podemos, Novo e PSL protestaram durante a reunião. No entanto, estas legendas não têm força suficiente para obstruir votações. Na Câmara, o Novo está coletando assinaturas para aprovar a urgência na apreciação de um projeto semelhante àquele de que o Senado está abrindo mão.
A ala do Congresso que apoia a Lava-Jato defendeu que o projeto de lei do Senado e a PEC da Câmara poderiam tramitar simultaneamente e acusaram uma manobra protelatória. Irritados, deixaram a reunião na residência oficial da presidência do Senado antes do fim.
—Não vamos nos calar se a tendência for uma maneira protelatória em relação a dar uma resposta para a sociedade — disse o líder do PSL no Senado, Major Olimpio (SP).
— O que há é um acordão. A maioria (dos líderes) está propondo um trâmite mais demorado, a lentidão como caminho para empurrar para o ano que vem — afirmou o líder do Podemos no Senado, Alvaro Dias (PR).
O deputado Alex Manente (Cidadania-SP), autor da PEC alvo do acordo, disse que a Câmara deve aprovar seu texto até o primeiro semestre do ano que vem. No Senado, segundo ele, a expectativa é até o final do primeiro semestre, mesmo com o Carnaval em fevereiro e o calendário eleitoral, que costuma desmobilizar o Congresso logo após o fim do prazo de filiações, em abril.
— Não podemos dar uma resposta que possa ser questionada e modificada rapidamente. Não precisamos resolver em um mês, temos que resolver definitivamente — disse Manente, para quem um projeto de lei seria alvo de questionamentos no STF.
Todos os parlamentares que se manifestaram após a reunião disseram que Moro não se declarou a favor do projeto ou da PEC, mas da aprovação da reversão da decisão do STF.
Inicialmente, o Senado votaria a PEC apresentada pelo senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), que alterava o artigo 93 da Constituição. A proposta defendia a validade da prisão em segunda instância, mas, no caso de haver recurso para os tribunais superiores, o juiz poderia atribuir ao recurso o chamado efeito suspensivo, para que o réu não fosse obrigatoriamente preso depois de condenado em segundo grau.
No entanto, com o aval de Alcolumbre, senadores costuraram com Moro um projeto de lei alterando dois artigos (283 e 637) e criando um novo (617-A) no Código de Processo Penal, sem necessidade de mudança constitucional. O texto foi apresentado à Comissão de Constituição e Justiça como um substitutivo da senadora Juíza Selma (Podemos-MT) ao projeto que havia sido apresentado pelo senador Lasier Martins (Podemos-RS). O texto estava previsto para ser votado na CCJ do Senado nesta quarta-feira (27).
Enquanto isso, a Câmara está trabalhando em uma outra PEC. O texto do deputado Alex Manente foi aprovado na CCJ e ainda passará por uma comissão especial antes de seguir para o plenário e, então, ainda tramitar no Senado.
A PEC inicialmente mudava o inciso 57 do artigo 5º da Constituição, que diz que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória — no entendimento atual, até que acabem todas as possibilidades de recurso e que a sentença se torne definitiva. Pelo texto da PEC original de Manente, ninguém seria considerado culpado até a confirmação de sentença penal condenatória em grau de recurso — ou seja, a prisão já valeria após condenação em segunda instância.
Há divergências, no entanto, sobre se esse inciso do artigo 5º seria uma cláusula pétrea da Constituição, o que impediria qualquer modificação, mesmo por emenda. Diante de eventual guerra jurídica envolvendo esse ponto, a solução encontrada por Manente na semana passada foi sugerir uma nova PEC, com alterações nos artigos 102 e 105 da Constituição, itens que dispõem, respectivamente, sobre o STF e o Superior Tribunal de Justiça (STJ).