Com aval do presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), senadores deram início nesta quinta-feira (21) a uma manobra para adiar a votação de medidas para autorizar a prisão após condenação em segunda instância.
O assunto voltou a ser discutido no Legislativo depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, no início do mês, que é necessário aguardar o trânsito em julgado (quando se esgotam as possibilidades de recurso) do processo para que um réu comece a cumprir a pena a que foi sentenciado. Antes, o tribunal autorizava a prisão de condenados em segunda instância. A medida libertou presos como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), no último dia 8.
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado votaria nesta semana uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que pretende reverter a decisão do Supremo.
No entanto, diante da falta de consenso sobre se a PEC alteraria cláusulas pétreas — itens da Constituição que não podem ser modificados, salvo com a elaboração de uma nova Carta por uma Assembleia Nacional Constituinte — senadores costuraram com o ministro da Justiça, Sergio Moro, um projeto de lei para mudar o Código Penal.
A mudança infraconstitucional é mais rápida e fácil que a de uma PEC, que tem tramitação mais demorada e precisa de apoio de três quintos de cada Casa, ou seja, 49 senadores e 308 deputados.
Como alterar a legislação?
Não há consenso no meio jurídico sobre de que forma seria possível alterar a legislação para prever a prisão de condenados em segunda instância. É provável que o tema volte para a análise do Supremo a depender do que seja eventualmente aprovado no Congresso.
Pelo calendário definido na CCJ, a comissão faria uma audiência pública na tarde de terça-feira (26), votaria o projeto de lei na manhã de quarta-feira (27) e ele seria levado imediatamente no plenário, para que seguisse para a Câmara.
A Câmara, por sua vez, aprovou em sua CCJ, na quarta-feira (20), uma outra PEC para estabelecer prisão após segunda instância. O presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), criou uma comissão especial para analisar a matéria antes que ela siga para o plenário da Câmara, onde precisa ser votada em dois turnos antes de passar para o Senado.
A comissão será composta por 34 titulares e 34 suplentes. Instalado, o colegiado terá prazo de 40 sessões para analisar o mérito da proposta. A PEC será relatada pelo deputado Marcelo Ramos (PL-AM).
Na manhã desta quinta, senadores saíram de uma reunião com deputados na residência oficial do presidente do Senado sugerindo que a Casa abriria mão do projeto de lei, de tramitação mais rápida, e criaria uma comissão especial para acompanhar os trabalhos da Câmara na análise da PEC, de tramitação mais lenta.
Alcolumbre, que não deu entrevistas ao longo do dia e se manifestou apenas por meio de uma nota, convocou duas sessões do Congresso Nacional para a próxima semana, uma para 14h de terça e outra para 10h de quarta, mesmo horário em que a CCJ prevê votar o projeto que altera o CPP.
Comissões, entretanto, não podem votar projetos se a ordem do dia no plenário já tiver começado. Ou seja, se Alcolumbre abrir os trabalhos no Congresso, a CCJ fica impedida de deliberar sobre o projeto de lei. A CCJ do Senado informou que o calendário anunciado está mantido, mas a presidente do colegiado, senadora Simone Tebet (MDB-MS), não quis falar com a imprensa.
Aprovação da PEC na Câmara é "fato novo", dizem senadores
Senadores que participaram de reuniões ao longo do dia disseram que a aprovação da PEC na CCJ da Câmara é um "fato novo" e que, por isso, podem haver mudanças de plano no Senado, o que só vai ser definido no início da semana que vem.
A previsão de a CCJ da Câmara votar a PEC na quarta-feira passada, no entanto, estava dada desde a semana anterior.
— O sistema é bicameral. Precisamos tentar combinar um procedimento. Não está escrito em lugar nenhum do mundo que produzir boas leis é produzir na pressa — argumentou o senador Weverton Rocha (PDT-MA).
— A Câmara gerou um outro fato e nós estamos nos adaptando a ele. A quê? Dialogar com a Câmara para poder produzir de forma conjunta uma solução — afirmou.
Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder da minoria, disse que o calendário da CCJ só será modificado se houver "deliberação do conjunto dos líderes ou um entendimento que pacifique o trâmite".
O líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO), afirmou que as definições sobre que caminho será seguido ficará para o início da semana que vem.
Em nota, Alcolumbre disse que "está em busca do entendimento e do consenso entre os parlamentares em relação às propostas sobre a prisão de condenados em segunda instância em curso no Congresso Nacional".
Congressistas que são a favor das pautas da Operação Lava-Jato, como a prisão após segunda instância, se mostraram indignados com a manobra iniciada no Congresso.
— Está visível uma estratégia de procrastinação, que empurra para o próximo ano (a votação) para reduzir o impacto da pressão popular — disse o líder do Podemos no Senado, Alvaro Dias (PR) —Ficou claro que o melhor caminho era por meio do projeto, além da menor celeridade. Por isso abrimos mão da PEC em favor do projeto de lei — afirmou.
Para o senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), autor da PEC que tramitava no Senado e que foi retirada de pauta para dar lugar ao projeto de lei costurado com Moro, o Congresso poderia levar adiante agora a tramitação tanto do PL do Senado como da PEC da Câmara.
— As duas medidas são complementares e contribuem uma com a outra. Os senadores que vão apoiar a mudança no Código de Processo Penal vão apoiar a PEC, e o mesmo vai ocorrer na Câmara — disse Oriovisto.