Com o recuo na revisão das regras de cobrança do IPVA, as alternativas do governador Eduardo Leite para atenuar a crise neste final de ano são reduzidas. Correndo o risco de fechar 2019 com duas folhas salariais parceladas, incluindo o 13º, Leite e a equipe apostam em alternativas de curto prazo para ampliar a arrecadação, mas as medidas não dependem só do Palácio Piratini.
Para dar fôlego ao caixa, o governo do Estado trabalha com pelo menos três possibilidades (veja os detalhes no fim do texto). Uma delas é o programa de refinanciamento de dívidas de ICMS (Refaz), cujos resultados serão conhecidos até 13 de dezembro. A intenção é perdoar até 90% de juros e multas de empresas dispostas a regularizar débitos com o Fisco.
A segunda aposta no horizonte é o leilão de áreas de exploração de petróleo e gás no litoral fluminense. A operação está marcada para esta quarta-feira (6) e pode significar dinheiro novo nos cofres estaduais até 27 de dezembro.
A terceira alternativa continua sendo a antecipação do IPVA, ainda que Leite tenha voltado atrás nas mudanças anunciadas na última segunda-feira (4). Como o desconto para quem quitar o tributo antes do prazo foi preservado, é praticamente certo que haverá incremento na arrecadação. A diferença é que, com o recuo do governador, o dinheiro do imposto seguirá entrando até abril — e não apenas até janeiro, como queria o governo, embora isso pudesse acabar ampliando a inadimplência.
Por alto, a estimativa de arrecadação líquida com esses três itens — que pode variar conforme o nível de adesão ao Refaz, os resultados do leilão e a disposição dos contribuintes em antecipar o IPVA — é de cerca de R$ 1,2 bilhão, para mais ou para menos. O valor é próximo de uma folha do Executivo.
Hoje, a previsão da Secretaria da Fazenda é de quitar os vencimentos de outubro do funcionalismo em 13 de dezembro. Com a verba extraordinária, seria possível bancar a folha de novembro (sem as consignações). A tendência, no momento, é de que parte dos contracheques de dezembro fique para janeiro e que o 13º seja parcelado mais uma vez, com a opção de empréstimo bancário, como em 2018.
Em entrevista coletiva na manhã desta terça-feira (5), Leite reconheceu as dificuldades e lamentou a reação negativa à tentativa de mexer no imposto veicular. Disse que o quadro fiscal é "dramático" e que o Estado "tem uma demanda por recursos com urgência, especialmente no final do ano e no início do exercício fiscal seguinte".
— É importante dizer que o Estado não se afastará da necessidade de discutir tantas outras medidas que serão amargas. Não há solução positiva para o tamanho do problema. Não tem uma solução que só agrade a população — advertiu Leite.
Secretário estadual da Fazenda, Marco Aurelio Cardoso destacou os esforços na busca por soluções para o Estado e a preocupação em promover alterações estruturais, cujo impacto será sentido em médio e longo prazo.
— Temos ainda dois meses de arrecadação, estamos lançando o Refaz, que a gente entende que pode gerar receita extra, e tem a possibilidade dos recursos da cessão onerosa (do pré-sal). Estamos, há vários meses, dizendo que o desafio se torna cada vez maior, mas não estamos inertes na crise. Pelo contrário. Essa é uma gestão que não está adotando medidas-tampão. A questão é que a reforma estrutural toma tempo. Então é como trocar a peça do avião em voo, e o avião está voando sem o combustível total, porque temos problemas de caixa — ressaltou Cardoso.
Saídas de Leite no curto prazo
1) Refaz
Previsão de arrecadação: no mínimo R$ 450 milhões (sendo que R$ 337,5 milhões ficam com o Estado e o restante com os municípios)
O que é
Lançado na última segunda-feira (4), o programa de refinanciamento de dívidas de ICMS (Refaz) é uma das apostas para engordar a arrecadação. Resta saber qual será o nível de adesão.
O último Refaz, no fim de 2018, resultou em cerca de R$ 500 milhões. Agora, a meta é arrecadar no mínimo R$ 450 milhões (por lei, 75% ficam com o Estado e 25% com os municípios).
Como o programa oferece novas modalidades, com redução de até 90% em juros e multas, há a expectativa de superar a meta, mas isso dependerá da disposição dos empresários. Poderão aderir contribuintes com créditos tributários vencidos até 31 de dezembro de 2018, que somam cerca de R$ 15 bilhões.
2) Leilão do pré-sal
Previsão de arrecadação: R$ 450 milhões (100% para o Estado)
O que é
Nesta quarta-feira (6), o governo federal promove o leilão de quatro áreas de exploração de petróleo e gás natural da Bacia de Santos, no litoral do Rio de Janeiro. Se todas as áreas forem negociadas, a arrecadação inicial será de R$ 106,6 bilhões. Parte do valor ficará com a Petrobras e o restante será partilhado entre União, Estados e municípios. O Rio Grande do Sul pode receber R$ 450 milhões. A expectativa é de que isso ocorra até 27 de dezembro, mas dependerá dos resultados do negócio e da agilidade da União para distribuir a verba.
3) IPVA antecipado
Previsão de arrecadação: pelo menos R$ 800 milhões (sendo que o Estado fica com 50% e os municípios com 50%)
O que é
Em dezembro de 2018, o Estado arrecadou R$ 828 milhões brutos com o IPVA, segundo o site da Secretaria Estadual da Fazenda. Por lei, o valor é repartido com os municípios, portanto, o saldo líquido para o Estado ficou com R$ R$ 414 milhões. Como as regras do IPVA acabaram ficando as mesmas (segue valendo o desconto de até 3% para quem pagar o imposto antes do prazo), é possível que a cifra de 2018 se repita em dezembro de 2019. Caso as mudanças anunciadas pelo governo fossem aplicadas, não haveria mais esse desconto, mas o calendário de pagamento seria reduzido. O ingresso dos recursos ficaria concentrado no mês de janeiro (e não mais até abril).
E o Regime de recuperação fiscal?
O governo Eduardo Leite segue acreditando na possibilidade de aderir ao programa de ajuste fiscal da União em 2019, embora as negociações se arrastem desde 2017 sem solução. Se isso ocorrer, o Estado terá autorização para adiantar 50% do valor da venda de CEEE, CRM e Sulgás, o que pode significar de R$ 1,5 bilhão a R$ 2 bilhões em caixa.
Apesar disso, não há garantia de que a hipótese se concretize antes de 2020, já que seria necessário encontrar uma instituição bancária disposta a emprestar o dinheiro em tempo recorde. Também há dúvidas se a União terá, de fato, interesse em fechar acordo com o Estado, já que acaba de lançar um pacote com uma série de medidas voltadas a Estados e municípios, inclusive com mudanças no pacto federativo.