Não surpreende que o principal antagonista do presidente Jair Bolsonaro na atual crise do PSL seja justamente o líder do partido na Câmara, Delegado Waldir (GO). Ao chamar de "vagabundo" a principal autoridade da nação, Waldir emula o comportamento do próprio Bolsonaro, político no qual se inspirou em seus dois mandatos anteriores na Câmara.
Assim como o presidente, o delegado sempre foi um folclórico integrante do baixo clero, sem freios na língua tampouco apego à disciplina partidária. Com passagem por PSDB e PR antes da filiação ao PSL, já mantinha postura conservadora antes de aderir ao bolsonarismo, fazendo parte da bancada da bala e com posições extremas em questões morais, como a legalização do aborto.
Esse comportamento, contudo, até então não tinha sido suficiente para tirá-lo do anonimato nos corredores do Congresso. Os holofotes só viriam a mirar Waldir durante a CPI da Petrobras, em 2015. À época, foi apontado como um dos autores da soltura de cinco ratos na CPI durante o depoimento do ex-tesoureiro do PT, João Vaccari Neto.
Também foi ele que rompeu com o ambiente de bajulação ao então todo poderoso presidente da Câmara, Eduardo Cunha (MDB-RJ), para questioná-lo se tinha contas no Exterior. À época já alvo de suspeitas de comandar um esquema milionário de corrupção, Cunha foi enfático na negativa, mas para o delegado o que menos importava era a resposta.
— Só a minha pergunta a Eduardo Cunha já vale meu mandato. Derrubei o segundo homem mais importante do país — viria a se vangloriar depois.
Waldir Soares de Oliveira, 56 anos, é paranaense de Jacarezinho. Formado em Direito, foi aprovado em concurso público para delegado da Polícia Civil de Goiás em 1999. Logo acabou escalado para atuar no entorno do Distrito Federal, uma das regiões mais violentas do país. Mais tarde viria a passar pelas principais delegacias do Estado e dirigiu instituições problemáticas, como a cadeia de Porangatu e o presídio de Luziânia.
Sua primeira candidatura a deputado foi em 2010. Suplente, assumiu o cargo no ano seguinte, mas por apenas seis meses. Uma nova totalização dos votos na Justiça Eleitoral revelou um equívoco que lhe tirou a cadeira. A desforra veio em 2014. Já muito atuante nas redes sociais, tornou-se o mais votado do Estado, pelo PSDB, com 274.625 votos. Chegou à Câmara com muito apoio, mas pouca cancha. Em seu discurso de estreia na tribuna, usou a terceira pessoa para falar de si mesmo:
— O delegado Waldir possui um perfil no Facebook com mais de 400 mil seguidores. Agora o povo brasileiro seguirá o Delegado Waldir. O gabinete do Delegado Waldir, 45 do calibre, 00 da algema, está à disposição dos senhores — disse o deputado em discursos de estreia na Casa, fazendo referência ao seu número de candidato, 4500.
Para tentar marcar seu mandato, passou a economizar nas despesas custeadas com verba de gabinete e recusou auxílio-moradia, pagando hotel do próprio salário e viajando no próprio carro de Goiânia a Brasília. Os projetos seguiam a temática da segurança, com propostas que obrigavam os presos a pagar as próprias despesas nos presídios e proibiam fiança a reincidentes.
Em 2018, voltou a ser o mais votado no Estado, com 274.406 votos. Embora estivesse surfando a onda bolsonarista, perdeu pouco mais de 200 votos de uma eleição para outra. O retorno à Câmara, contudo, foi triunfal. Em uma bancada numerosa, mas formada por vários debutantes na política, acabou se tornando líder do partido, com o apoio do próprio Bolsonaro.
Apesar do temperamento mercurial, sempre teve ascendência sobre a maioria dos colegas de sigla, fato reforçado com a permanência na liderança após as tentativas de destituição capitaneadas pelo Planalto. Suas atitudes, todavia, seguem intrigando políticos mais experientes. Waldir circula pela Câmara com um coldre vazio preso à cinta — ele diz que deixa a arma no gabinete — por vezes exprime ideias desconexas e tem vocação para o embate, como demonstrado na recente briga com o presidente da República.
Certa vez, em um dos diversos embates na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, a deputada Maria do Rosário (PT-RS) questionou:
— O senhor passou no psicotécnico? Como passou no concurso para delegado?