A disputa por poder no PSL ampliou as dificuldades enfrentadas pelo Palácio do Planalto na articulação com a Congresso. Sem ter conseguido formar uma base aliada, o presidente Jair Bolsonaro vê o preço do apoio a propostas do governo subir a cada rodada de votações na Câmara e no Senado. A crise afeta a rotina de Brasília e impacta o mercado e a evolução de bandeiras de campanha que encantaram o eleitor conservador.
Abaixo, como a confusão na cúpula do partido impacta na atuação do governo.
A briga afeta a articulação do governo com o Congresso?
Sim, embora o Planalto enfrente dificuldades na articulação desde o início do governo. O PSL possui a segunda maior bancada da Câmara, com 53 deputados, mas não traduziu seu tamanho em relevância política. A diversidade de bandeiras defendidas pelo grupo é um dos motivos.
A fissura entre duas alas, que vinha causando atritos na sigla, se acentuou na última semana, quando Jair Bolsonaro disse a um apoiador que o presidente da sigla, Luciano Bivar (PE), estava “queimado pra caramba”.
A tentativa frustrada de emplacar Eduardo Bolsonaro na liderança do PSL expôs a fragilidade na articulação do presidente da República, gravado pedindo apoio ao filho. Além disso, sem consenso, a tendência é de que novos embates entre correligionários ocorram nos próximos dias.
A confusão deve deixar na geladeira a indicação do filho zero um para a embaixada brasileira nos Estados Unidos. A leitura é de que não há votos suficientes no Senado para a aprovação de seu nome.
Como isso interfere na governabilidade de Bolsonaro?
Sem uma base coesa para defender seus projetos, o governo terá que negociar individualmente cada proposta e terá que fazer concessões maiores, em especial, frente a pautas polêmicas.
A situação pode influenciar a análise do Orçamento para o próximo ano e a aprovação de recursos extraordinários pelo Congresso. O Executivo poderá encontrar má vontade frente a medidas provisórias editadas pelo Planalto. Até o momento, das 31 encaminhadas ao Legislativo, nove caducaram.
Quem são os responsáveis pela interlocução?
Pelo governo, o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, é quem faz a articulação junto aos parlamentares. Na prática, tenta adequar demandas recebidas de deputados e senadores, que vão desde emendas e cargos a audiências com ministros, em troca de apoio à pauta governista.
O Planalto tem ainda um líder de governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), e no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE). Na quinta-feira (17), a líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-SP), foi substituída pelo senador Eduardo Gomes (MDB-TO).
As reformas ficam prejudicadas?
As reformas seguirão no horizonte, mas o Planalto perde protagonismo para o Congresso nas discussões e passa a ter mais dificuldade para manter pontos que considera essenciais. Além disso, sem base aliada e dependendo de deputados do centrão, o preço pelo apoio acaba sendo inflacionado.
A reforma da Previdência, por exemplo, foi aprovada na Câmara após a liberação de emendas e cargos a deputados. Senadores atrasam a conclusão da proposta pressionando o governo a liberar recursos. O texto foi desidratado, reduzindo a economia de R$ 1,2 bilhão para R$ 800 milhões em 10 anos.
Esvazia a pauta de debates do país e do Congresso?
Não esvazia, mas altera. A liderança do debate passa para o Congresso, enquanto o governo tenta apresentar projetos com maior potencial de aprovação. A reforma tributária, por exemplo, deverá ser simplificada para quebrar resistências. A unificação de tributos federais iria para a geladeira neste momento.
Já a pauta de costumes e a armamentista, bandeiras de campanha de Jair Bolsonaro, ficarão em segundo plano. O pacote anticrime do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, ainda será debatido, mas perdeu parte dos artigos pelo caminho, como a execução de pena após condenação em segunda instância.
Afeta a vida econômica do país?
O mercado não gosta de incertezas e seu humor reflete o ambiente político. Na quinta-feira (17), após o agravamento da crise no PSL, a Ibovespa caiu 0,39%, após seis pregões no azul. O dólar subiu 0,4%, chegando a R$ 4,17, estando há dois meses acima dos R$ 4.
Apesar de sofrer influências externas, a atração de investimentos e a retomada da economia, com consequente geração de empregos, também dependem de estabilidade no cenário interno.
Qual é o interesse eleitoral e a influência de fundos públicos no embate?
A disputa pelo controle do partido dá poderes sobre dois fundos milionários: o partidário e o eleitoral. Antes nanica, a sigla elegeu a segunda maior bancada na Câmara na última eleição, na esteira do bolsonarismo, e terá direito a mais de R$ 700 milhões até 2022.
O núcleo próximo a Jair Bolsonaro quer gerir essa quantia, visando à eleição municipal do próximo ano. No entanto, o atual presidente da legenda, Luciano Bivar (PE), já afirmou que não entrega o comando da sigla “de jeito nenhum”.
Como as doações de empresas privadas estão proibidas, o financiamento das campanhas eleitorais é feito, principalmente, a partir dos fundos públicos.
Além de coordenar a distribuição dos recursos, o responsável pela sigla também indica os líderes do partido na Câmara e no Congresso e aliados a cargos de confiança, além de controlar os diretórios estaduais, que podem ter as direções destituídas.
Nesta sexta-feira (18), Bivar anunciou trocas nos diretórios de São Paulo, que tem o deputado Eduardo Bolsonaro à frente, e do Rio de Janeiro, presidido pelo senador Flávio Bolsonaro.