O presidente Jair Bolsonaro afirmou neste domingo (4) que o ministro Paulo Guedes (Economia) tem liberdade para trocar o comando do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).
— Dei carta branca a todos os ministros para indicar as pessoas e eu tenho poder de veto. O Coaf, na medida provisória da reestruturação, estava com a Justiça. A partir do momento que vai para a Economia, o Paulo Guedes que define. Ou alguém está desconfiando do Paulo Guedes agora? Não né.
O presidente ainda reafirmou sua confiança em seus ministros:
— Se ele quiser mudar (Coaf), assim como qualquer um quiser mudar qualquer coisa, mude sem problema nenhum, eu quero que o seu ministério dê certo.
Conforme a Folha de S.Paulo revelou neste sábado (3), Guedes vem sendo pressionado pelo Palácio do Planalto, com anuência de Bolsonaro, a demitir o presidente do Coaf, Roberto Leonel, aliado de Sergio Moro, responsável pela pasta da Justiça.
Segundo auxiliares, Bolsonaro está incomodado com o comportamento do comando do Coaf em relação à decisão do presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Dias Toffoli, de suspender investigações criminais pelo país que usem dados detalhados de órgãos de controle — como Coaf, Receita Federal e Banco Central — sem autorização judicial.
Toffoli atendeu a um pedido da defesa do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho mais velho do presidente, alvo de investigação realizada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro.
Roberto Leonel chegou ao comando do Coaf pelas mãos de Moro, quando o órgão ainda estava sob o seu guarda-chuva no Ministério da Justiça. Considerado um dos principais aliados do ex-juiz, Leonel foi chefe da inteligência da Receita Federal em Curitiba por 22 anos e integrou a força-tarefa da Lava-Jato.
Em maio, o Congresso derrotou o governo Bolsonaro e tirou a estrutura da Justiça e a transferiu para a pasta da Economia, comandada por Guedes. Leonel continuou no cargo.
Criticas da Coaf
Em manifestação enviada à Folha na semana passada, e publicada na quarta-feira (31), o Coaf criticou a decisão de Toffoli sobre o uso de seu material em investigações. O órgão afirma que a medida prejudica o combate à lavagem de dinheiro.
"O encaminhamento apenas de dados globais não proveria as autoridades destinatárias com elementos suficientes para seguir a 'rota do dinheiro' e atuar com efetividade no combate à lavagem de dinheiro", diz o conselho.
"Ao Coaf interessa conhecer aspectos qualitativos de operações consideradas suspeitas, como as partes envolvidas, o valor negociado, a forma de sua realização, os instrumentos utilizados — elementos essenciais para definir se há, efetivamente, fundados indícios da prática de ilícitos a serem comunicados às autoridades competentes", afirmou o órgão.
Revés para Moro
A demissão de Roberto Leonel é vista no governo como um revés para Sergio Moro, que já está envolvido em uma crise por causa das mensagens atribuídas a ele, publicadas pelo site The Intercept Brasil, que mostram o atual ministro, na condição de juiz, atuando em colaboração com procuradores da Lava-Jato, em Curitiba.
Leonel também aparece nas mensagens atribuídas aos procuradores da Lava-Jato nos últimos anos obtidas pelo Intercept e analisadas pela Folha.
Na última segunda-feira (29), o ministro da Justiça reuniu-se com Toffoli, no Supremo, para tratar da medida judicial sobre o Coaf. Moro relatou sua insatisfação e disse que a decisão do ministro do STF pode colocar em risco o combate à lavagem de dinheiro.
Polícia econômica
A avaliação de aliados de Guedes é a de que o questionamento sobre a atuação dos órgãos de controle, principalmente do Coaf e da Receita Federal, tem prejudicado o andamento da agenda econômica do governo.
Auxiliares do ministro da Economia afirmaram à Folha, na condição de anonimato, que a função da pasta é cuidar da política econômica, e não da polícia econômica.
Eles dizem que, às vésperas da retomada dos trabalhos no Congresso, o foco tem de ser o avanço das reformas tributária e da Previdência, mas o ministério de Guedes tem sido obrigado a se dedicar a respostas sobre a atuação dos órgãos de controle subordinados a ele.
Investigação suspensa
Na quinta-feira (1º), o ministro do STF Alexandre de Moraes determinou a suspensão imediata de procedimentos investigatórios instaurados na Receita que atingiram ministros da corte e outras autoridades.
Para Moraes, há "graves indícios de ilegalidade no direcionamento das apurações em andamento". Além da suspensão, o ministro decidiu afastar temporariamente dois servidores da Receita por indevida quebra de sigilo apurada em procedimento administrativo disciplinar.
A decisão de Moraes foi uma reação à reportagem publicada pela Folha, em parceria com o Intercept, com mensagens que revelariam que o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba, incentivou colegas a investigar Toffoli, em 2016.