Amigo de Michel Temer (MDB) e um dos alvos de prisão pela Polícia Federal nesta quinta (21), o coronel João Baptista Lima Filho é figura-chave na carreira política do ex-presidente desde os anos 1980, tendo atuado na coordenação de todas as campanhas dele.
Os investigadores da Polícia Federal e o Ministério Público Federal afirmam que Lima atua como intermediário de propina a Temer, também preso na operação — assim como a mulher do coronel Lima, Maria Rita Fratezi.
Em maio de 2016, Lima relatou um episódio da campanha de 1994, quando Temer era candidato a deputado federal por São Paulo.
— Se você continuar com esse discurso, não vamos ter cem votos — disse o coronel a Temer, conforme reportagem publicada na Folha de São Paulo em maio de 2017.
Aposentado da Polícia Militar paulista, Lima deu a bronca após o então candidato declarar a uma plateia de peões na fazenda Esmeralda, em Duartina (SP), que, se eleito, iria "propugnar pela figura do parlamento alemão do ombudsman e pelo recall legislativo". O público, que foi lá para comer churrasco, não entendeu nada.
Coordenador de campanhas para deputado federal
Já naquela época, "doutor Temer" era apenas "Michel" para o oficial da PM. Antes da campanha de 1994, Lima havia sido assessor de Temer na Secretaria da Segurança Pública nos governos Franco Montoro (1983-1987) e Luiz Antônio Fleury Filho (1991-1995).
Segundo informou o Planalto em 2017, o coronel coordenou todas as campanhas de Temer, desde a primeira, em 1986. "Era sua função auxiliar na parte administrativa, gerenciando a campanha e supervisionando a prestação de contas", afirmou na ocasião.
Lima se tornou nome importante nas investigações da Polícia Federal sobre o ex-presidente. Dois executivos da JBS afirmaram, em acordo de delação, que a empresa deu R$ 1 milhão nas mãos de Lima, em 2014, como parte de um suposto acordo feito entre Temer e Joesley Batista.
A fazenda Esmeralda, onde Temer fez o evento de campanha em 1994, foi comprada por Lima em 1989, dois anos depois de ele obter o registro de arquiteto em São Paulo. Ele e a empresa Argeplan Engenharia, também dona da fazenda, ajudaram a financiar a campanha de Temer em 1994 com R$ 100 mil — cerca de R$ 500 mil em valores corrigidos. Em 2011, o coronel passou a ser oficialmente sócio da Argeplan.
Assessor de Montoro que "vivia para os estudos"
Nascido em Bauru (SP), em dezembro de 1942, Lima se mudou para São Paulo ainda na juventude e entrou na PM. Ao concluir a academia, conforme contou, passou num vestibular para odontologia, mas ouviu de um capitão que não ia aguentar "ficar numa sala mexendo na boca de ninguém" e desistiu da carreira.
Na PM, tornou-se comandante do serviço de engenharia. Era bem-visto por outros oficiais que o conheceram à época. Eles o descreveram como um sujeito bem-humorado. No período, atuou em campanhas políticas. Acabou como assessor da Secretaria da Segurança no governo Franco Montoro, onde trabalhou com outros dois secretários antes de virar funcionário de Temer.
Lima disse que, nesse período, além de exercer suas funções na corporação, vivia para os estudos.
— O 'Limão' estava solteiro, o que é que ia fazer? Eu não sou um homem da noite, de fumo, de bebida, dessa coisa toda. Eu aproveitava meu tempo para ir à escola — contou.
Casou-se com a também arquiteta Maria Rita Fratezi, que disse ter conhecido em um curso de pós-graduação em arquitetura da USP. No entanto, a FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo) afirma que nenhum dos dois estudou na instituição, seja na graduação ou na pós.
Na internet, Fratezi compartilhava fotos de animais e, à época do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, mensagens contra a petista e seu antecessor, Lula — cujas gestões chama de "suplício".
O casal não tem filhos.
— Na hora que o 'Limão' baixar na sepultura, não vai ter ninguém pedindo teste de DNA — brincou o coronel.
Lima disse que, em 1993, "quando bateu 30 anos de serviço", foi ao governador e pediu para sair da corporação. Há dois anos, recebia R$ 24 mil por mês.
Em 2000, comprou um dúplex de 446 metros quadrados com seis vagas na garagem na região do Morumbi. O valor venal é de R$ 3,3 milhões, mas estima-se que no mercado custe mais de R$ 5 milhões. Ao falar com a Folha de S.Paulo, em 2016, o coronel disse que precisaria organizar seus impostos de renda para saber como adquiriu a propriedade.
Coronelismo
Um jornal de 1996, da cidade de Garça, vizinha a Duartina, destacava como manchete: "Coronelismo ainda existe na região de Garça".
O texto dizia que Lima fechou estradas municipais com porteiras e afirmava que ele "manda e desmanda" na região porque é "tido como poderoso e amigo de políticos poderosos".
Além da campanha de 1994, a fazenda Esmeralda serviu de refúgio para Temer em outras ocasiões. Em maio de 2016, o MST invadiu o local e afirmou que Lima era "laranja" de Temer. O ex-presidente afirmou que não tinha propriedades rurais.
O coronel também falou que as acusações de ser "laranja" eram boatos de um "sujeito de língua comprida igual língua de dragão".
— Ele frequentava boteco, quermesse, e aí começou: 'Essa fazenda é do Michel'.
Depois da ação do MST, Lima entrou com queixa-crime contra a entidade por calúnia e difamação e a denunciou como "organização criminosa".
Não foi o único transtorno a que Lima reagiu com processos. Em 1999, processou a United Airlines depois de ter as malas extraviadas ao voltar de Miami. Seis anos depois, processou uma agência de viagens pelo mesmo motivo e outros "inúmeros dissabores", segundo decisão do juiz — daquela vez, viajou com a família do dono da empreiteira Construbase, Vanderlei de Natale, também amigo de Temer. Natale emprestou um helicóptero para o então vice-presidente viajar a Tietê (SP), sua cidade natal, em 2014.