A proposta de reforma no sistema previdenciário dos militares nem sequer chegou ao Congresso e já enfrenta resistências entre aliados do governo Jair Bolsonaro e integrantes do centrão. A cautela refere-se ao alcance e ao peso das medidas. Enquanto o texto que altera as aposentadorias civis sugere mudanças profundas, sob o manto do combate a privilégios, o projeto voltado a integrantes das Forças Armadas terá alterações mais brandas, além de incremento em benefícios.
Como prometido pelo Palácio do Planalto, o projeto será encaminhado aos deputados na quarta-feira (20), depois do crivo dos ministérios da Defesa e da Economia, mas está longe de consenso. Até lá, a tramitação do texto que altera aposentadorias de trabalhadores civis ficará em banho-maria.
Após desgaste por ter fatiado a reforma, o governo entendeu o duro recado da Câmara e agilizou a discussão do projeto voltado à caserna. O texto-base da proposta ficou sob a responsabilidade dos próprios militares, que incluíram contrapartidas favoráveis à categoria, como aumento de gratificações para compensar o que definem como defasagens salariais.
É esse ponto que pode representar a maior dificuldade durante as discussões. Para o Planalto, a reforma servirá para coibir distorções entre o serviço público e privado. Caso se confirmem as regras diferenciadas para as Forças Armadas, parlamentares avaliam que o discurso de “reforma para todos” poderá ficar prejudicado.
— Para o governo é muito ruim tentar preservar benefícios. Mas também pode ser estratégia. Qualquer mudança ficaria na conta dos parlamentares — avalia o deputado Jerônimo Goergen (PP-RS).
A previsão inicial de economia é de R$ 92,3 bilhões em 10 anos. Para isso, a contribuição sobre os soldos, hoje em 7,5%, passaria para 10,5%, e seria cobrada também de pensionistas, recrutas e alunos em cursos de formação. Como oficialmente os militares não têm Previdência, o desconto alimenta o Sistema de Proteção Social, utilizado para pagar pensões.
Outra medida prioritária para o governo é a elevação do tempo na ativa, de 30 anos para 35 anos, para novos integrantes, mas sem definição de idade mínima. Os atuais teriam de pagar pedágio de cerca de 20% do tempo restante antes de saírem. Isso deverá ampliar o tempo na ativa. De acordo com estudo do Tribunal de Contas da União (TCU), 55% dos integrantes das Forças Armadas se aposentam com idades entre 45 e 50 anos.
— A categoria é diferente, são verdadeiros os argumentos. Mas a valorização deveria ser na ativa e não em privilégio na aposentadoria — pontua Jorge Boucinhas, professor de Direito do Trabalho da Fundação Getulio Vargas.
Em contrapartida, há pressão da caserna para que o bônus pago a quem deixa a ativa, hoje equivalente ao valor de quatro soldos, passe para oito. Integram ainda a lista de desejos o aumento das gratificações por tempo de serviço e por cursos de especialização. Juntas, as contrapartidas ampliariam o custo dos militares à União em R$ 10 bilhões por uma década. Após o período, a economia seria maior que o gasto extra.
— É claro que os deputados vão querer que a reforma militar traga as mesmas coisas previstas para os demais trabalhadores — adverte Alceu Moreira (MDB-RS).
Como as regras para as Forças Armadas servirão de base para policiais e bombeiros militares – o que representaria desafogo para Estados –, as categorias não poupam críticas a pontos da proposta.
— Não aceitamos o tempo mínimo de 35 anos de trabalho antes da aposentadoria. O policial militar anda fardado, enfrenta condições adversas — diz Capitão Augusto (PR-SP), líder da bancada da bala.
Nos bastidores, já estão sendo discutidas formas de acalmar o grupo que apoia policiais militares e bombeiros, com a flexibilização desse ponto. Uma das exigências do grupo já foi encampada: votar a reforma dos militares somente depois do texto dos civis.