Após consecutivas derrotas, o governo de José Ivo Sartori conseguiu aprovar, na madrugada desta quinta-feira (8), o projeto que autoriza a adesão do Rio Grande do Sul ao regime de recuperação fiscal da União. O texto passou pelo crivo dos deputados com 30 votos favoráveis e 18 contrários, após cerca de 11 horas de debates na Assembleia Legislativa.
Houve abstenções dos deputados Juliana Brizola (PDT), Pedro Ruas (PSOL), Regina Becker (Rede), Stela Farias e Tarcísio Zimmermann, ambos do PT. Segunda Ruas, o grupo vai recorrer na Justiça.
O projeto é o primeiro passo para o Estado assegurar o acordo – que garantirá aval para novos empréstimos e pelo menos três anos de carência na dívida com a União. Contudo, para chancelar a adesão ao regime, a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) exige contrapartidas – entre elas, a oferta de ativos.
Para isso, Sartori precisa aprovar as propostas de emenda à Constituição (PECs) que anulam a exigência de plebiscito para a venda de CEEE, Sulgás e Companhia Riograndense de Mineração (CRM). O problema é que não há data para votação dessas matérias.
O governador Sartori comemorou o resultado. Em entrevista ao Gaúcha Hoje, ele afirmou que o processo foi "um jogo de paciência muito elevado".
– Acredito que o momento é importante e que representa o mínimo de possibilidades de governabilidade. O Estado tem de fazer dessa uma oportunidade para equilibrar as finanças. Essa é a mudança que o Rio Grande do Sul mais precisava. O regime não resolve todos os problemas, mas é um grande passo. Tem muito caminho pela frente, e vamos continuar trabalhando para equilibrar as finanças – disse Sartori, que completou ressaltando que "nunca vendeu ilusões".
O governador também fez declarações no Twitter, afirmando que "hoje a mudança venceu".
A sessão na Assembleia
O governo conseguiu acelerar a votação da matéria após aprovação de requerimento apresentado pelo líder do governo na Casa, deputado Gabriel Souza (PMDB). A peça do peemedebista previa que o texto deveria ser apreciado sem as emendas. O parlamentar disse que o governo se compromete em enviar um novo projeto com as emendas após sanção do governador em relação ao texto que deu aval à adesão ao socorro federal. A oposição defende que emendas poderiam corrigir pontos controversos do projeto enviado pelo governo.
– Após a aprovação e a sanção desse projeto, o governo se compromete a enviar à Assembleia um novo projeto de lei, constando as emendas, que não mudam o foco nem a alma do projeto e garantem algumas questões que os parlamentares estavam reivindicando – disse o líder do governo.
Com essa manobra, a base de Sartori conseguiu acelerar as tratativas com a União. O Piratini temia que a demora em aderir ao programa derrubasse liminar que permite ao governo suspender o pagamento das parcelas mensais da dívida com a União. O governo estadual afirma que, caso essa liminar fosse derrubada, além de voltar a depositar os valores, poderia ser necessário devolver R$ 1,5 bilhão.
O governo usa o discurso de “um passo de cada vez” para falar sobre os próximos encaminhamentos em relação ao tema. Agora, o Piratini trabalha para acertar pontos do regime com o governo federal e estuda como vai garantir as contrapartidas exigidas pela União, como a privatização de empresas públicas.
Oposição
Contrária à adesão ao regime de recuperação fiscal, a oposição afirma que o projeto não foi bem detalhado e que o acordo com a União não é a melhor solução para a crise financeira que afeta o RS.
— Esse regime, que se diz de recuperação fiscal, nada mais é do que algo que vai levar nosso Estado à bancarrota — disse, na tribuna, a deputada Juliana Brizola (PDT).
Já o líder do governo na Assembleia, deputado Gabriel Souza (PMDB), defendeu que a aprovação do projeto é “uma autorização” e que os demais pontos do regime deverão ser costurados a partir de agora.
O deputado Gilberto Capoani (PMDB) disse que revezamento da oposição na tribuna não ia adiantar, pois nenhum voto iria mudar. Segundo o peemedebista, verificação de quórum solicitada por deputados de oposição, mesmo que prevista no regimento da Casa, é "vergonhosa e desrespeitosa". Em meio a vaias de manifestantes anti-Sartori e aplausos de apoiadores do governo, Capoani pediu para a oposição "parar de mentir e ler o projeto".
A deputada Stela Farias, líder da bancada do PT na Assembleia, tentou aprovar requerimento para votar antes do texto uma emenda de sua autoria. A emenda prevê que o plano de recuperação fiscal elaborado pelo governo tem de ser aprovado pela Assembleia. O requerimento de preferência foi rejeitado pelos parlamentares.
A sessão foi marcada pelo revezamento da oposição na tribuna, por seguidos pedidos de verificação de quórum, além de protestos contra e pró-Sartori nas galerias da Casa.
De um lado, servidores e representantes de entidades sindicais gritavam palavras de ordem, como “Fora, Sartori”. Do outro lado, empresários, CCs do governo e apoiadores do Piratini gritavam, principalmente, “vão trabalhar” aos sindicalistas.
— Quero lamentar, senhor presidente, dirigentes sindicais xingando deputados — disse Souza em relação aos manifestantes contra o governo Sartori.
Apoio
As articulações da base de Sartori para garantir a votação desta madrugada ganharam força logo no início da tarde de quarta-feira (7), quando o Tribunal de Justiça (TJ) derrubou a liminar que proibia a análise da matéria. O desembargador Luiz Felipe Brasil Santos acatou pedido da Mesa Diretora da Assembleia e reconsiderou sua decisão de terça-feira, que havia retirado o projeto da pauta após ação impetrada pelos deputados de oposição Pedro Ruas (PSOL), Juliana Brizola (PDT), Stela Farias e Tarcísio Zimmermann (ambos do PT).
Depois de reunião de líderes que durou mais de duas horas, o presidente do Legislativo, Marlon Santos (PDT), cedeu ao apelo do governo do Estado e abriu sessão para analisar o texto, por volta das 18h.
Durante as discussões, o governo contou ainda com o apoio do chefe da Casa Civil do Estado, Fábio Branco, que pelo segundo dia consecutivo marcou presença na sessão na Assembleia. Em diversos momentos, ele circulava entre deputados da base.