No último dia da convocação extraordinária da Assembleia, nesta quarta-feira (31), o governo de José Ivo Sartori sucumbiu, mais uma vez, à estratégia da oposição e não conseguiu votar nenhum dos projetos que considera vitais para o futuro do Rio Grande do Sul. Depois do fracasso no plenário, as atenções se voltam, agora, para a próxima terça-feira (6), quando termina o recesso parlamentar.
A primeira proposta a entrar em debate será justamente a que autoriza o Estado a aderir ao regime de recuperação fiscal da União, que Sartori tentou aprovar nos últimos três dias, sem sucesso.
Nesta quarta-feira, a sessão foi marcada por quatro horas de discursos inflamados, a maioria deles dos críticos de Sartori. A tarde se resumiu a discussões sobre a possibilidade de inversão da pauta, manobras regimentais, bate-boca entre deputados e insultos bradados das galerias lotadas.
O líder do governo na Casa, Gabriel Souza (PMDB), voltou a acusar o presidente do Parlamento, Edegar Pretto (PT), de agir "partidariamente" e reclamou da postura dos adversários "por fazerem de tudo para que, pela primeira vez na história, uma convocação extraordinária terminasse sem votar um único projeto".
— Nunca imaginei que a oposição teria tamanha irresponsabilidade. A oposição está forçando uma situação para que o Rio Grande do Sul volte a pagar a dívida, mas a população está vendo isso. Quanto mais o tempo passa, maior é o risco de cair a liminar do STF (que suspendeu o pagamento das parcelas devidas à União de forma provisória). Se isso acontecer, será o caos — ressaltou Souza.
As críticas foram rebatidas pelos adversários, que também elevaram o tom. Pretto disse lamentar a posição do colega e afirmou agir dentro do regimento.
— Não assumo de forma nenhuma a responsabilidade pelo fracasso dessa convocação extraordinária. Aqui é uma casa plural, aqui tem normas. Não há possibilidade de manobra política — argumentou Pretto.
Na avaliação de Pedro Ruas (PSOL), os apoiadores de Sartori "não podem jogar a culpa na oposição":
— Quem não teve presenças suficientes na primeira sessão e perdeu o quórum foi o governo, não fomos nós.
A oposição está forçando uma situação para que o Rio Grande do Sul volte a pagar a dívida.
GABRIEL SOUZA (PMDB)
Líder do governo na Assembleia
Líder da bancada do PT, Stela Farias disse que faltou ao governo "fazer a lição de casa e organizar melhor a base":
— O governo tem de parar com mimimi. Essa convocação lamentável, em que não nada aconteceu em três dias, só teve um ponto positivo: ajudou a abrir um pouco mais a caixa preta do regime de recuperação fiscal — afirmou a deputada.
Por tramitar com urgência, o texto que autoriza a adesão ao programa federal passa a ser prioridade com o fim do recesso. Enquanto não for votado, impede que outras proposições sejam apreciadas.
Para evitar nova derrota, o Piratini reforçará a articulação política nos próximos dias. Gabriel Souza afirma já ter os 28 votos necessários para a chancela.
O principal problema do governo Sartori é a aprovação das propostas de emenda à Constituição (PECs) que permitem a privatização ou federalização de CEEE, Companhia Riograndense de Mineração (CRM) e Sulgás sem a necessidade plebiscito. As dificuldades são grandes porque essas PECs estão paradas na Comissão de Constituição e Justiça desde dezembro, exigem 33 dos 55 votos e enfrentam forte resistência dos deputados.
Se o Piratini não conseguir avançar, mesmo que seja autorizado a assinar o acordo com a União para suspender a dívida por três anos e obter novos empréstimos, Sartori corre o risco de ouvir um "não" da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) – já que uma das contrapartidas exigidas é a oferta de ativos como garantia.
Não assumo de forma nenhuma a responsabilidade pelo fracasso dessa convocação extraordinária.
EDEGAR PRETTO (PT)
Presidente da Assembleia
Nos bastidores, técnicos da Secretaria da Fazenda já trabalham em alternativas – alguns deles inclusive acompanharam as últimas sessões e já esperavam o desfecho desfavorável.
Uma das saídas em avaliação é vender a Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR) ou simplesmente extinguir o órgão e fazer a concessão de estradas à iniciativa privada. Há dúvidas, contudo, se a STN aceitaria a contrapartida, cujo valor seria menor do que o estimado com a privatização das estatais, de cerca de R$ 2,2 bilhões.
— Ainda estamos definindo qual seria o desenho disso. Não temos nada fechado. Estamos dando um passo de cada vez. Por enquanto, mantemos a esperança de aprovar pelo menos uma das PECs — disse um interlocutor do governo.