Por distração da base aliada, depois de uma hora e meia de discursos sem trégua dos adversários, o governador José Ivo Sartori perdeu, nesta segunda-feira (29), o primeiro embate travado na Assembleia para aprovar projetos vitais para o governo. Na tentativa de encerrar a sessão antes de votar as propostas, a oposição pediu verificação de quórum – artimanha comum nesses casos – e conseguiu o que queria.
Três deputados aliados que estavam no plenário no início da tarde não registraram frequência no momento da checagem: Sérgio Peres (PRB), Pedro Pereira (PSDB) e Ibsen Pinheiro (PMDB). O número de presenças ficou abaixo das 28 necessárias.
— Eu saí para ir ao banheiro. Infelizmente, aconteceu — lamentou Ibsen, que é do mesmo partido de Sartori, pouco depois.
Sem esconder a frustração, o chefe da Casa civil, Fábio Branco, passou pela imprensa visivelmente irritado, entrou em uma sala reservada junto a parlamentares da base e saiu sem dar entrevista. Mais tarde, pelo Twitter, afirmou que a "manobra da oposição deu certo para eles e errado para o Rio Grande". Segundo Branco, "o que estamos vendo é o quanto pior, melhor". Ele acusou o PT e os demais partidos da esquerda por "falta de coragem para deliberar" e fez um apelo para que, nos próximos dias, ocorram votações.
A tarefa de conversar com os jornalistas coube ao líder do governo na Assembleia, deputado Gabriel Souza (PMDB), que reconheceu a desatenção, mas procurou amenizar o problema.
— O governo perdeu duas horas de debates, que vão continuar amanhã (terça-feira). Isso pode acontecer. Infelizmente, aconteceu. Agora temos de ter foco total, porque é natural que a oposição faça uso desse instrumento (verificação de quórum) de novo — afirmou Souza.
Líder da bancada do PT na Casa, Stela Farias comemorou o desfecho e disse acreditar que os governistas saíram "fragilizados".
— Eles perderam uma sessão importante. Para quem estava dando a vitória como certa, foi uma perda brutal. Muito provavelmente o governo não vai conseguir votar tudo o que pretende — declarou Stela.
Até ali, a sessão havia se limitado à discussão do requerimento de convocação extraordinária feito por Sartori, que precisava ser aprovado para, só então, ter início o debate em torno das propostas em si – entre elas a autorização para a adesão do Estado ao regime de recuperação fiscal da União.
Um após outro, os deputados contrários a Sartori se revezavam na tribuna, usando todo o tempo de que dispunham para criticar o Piratini e seus projetos, na tentativa de postergar as votações e, assim, garantir a conclusão da sessão sem nenhum resultado.
— O que é do Estado, é de todos. Mas o governo pensa que o que é do Estado não é de ninguém — disse Pedro Ruas (PSOL), ao criticar a intenção do Piratini de vender estatais sem fazer plebiscito.
A todo momento, os discursos eram interrompidos por aplausos de sindicalistas e de servidores públicos nas galerias, que repetiam "fora Sartori" aos gritos. A cada interrupção, o tempo das falas se prolongava.
— A oposição faz isso sempre. Não nos deixa votar os projetos, porque sabe que temos os votos de que precisamos — reclamou Souza.
Nos bastidores, técnicos da Secretaria Estadual da Fazenda acompanhavam tudo. Já havia a expectativa de que nada seria votado na segunda-feira, mas o encerramento precoce causou desconforto. Sem o cochilo da base, o prazo expiraria às 18h, conforme prevê o regimento interno, e ainda haveria chance de aprovar, pelo menos, o requerimento de convocação para tentar "limpar" a pauta e seguir em frente.
Antes de deixar o local, o presidente da Assembleia, deputado Edegar Pretto (PT), afirmou que a sessão será retomada a partir das 14h desta terça-feira (30), do ponto onde parou. Dessa vez, o governo espera contar com pelo menos mais dois deputados, que estavam viajando – Elton Weber (PSB) e João Reinelli (PV) –para reforçar a margem de ação e escapar de novos deslizes.
Para evitar que os debates se estendam por toda a tarde sem conclusão, a estratégia definida pelo governo é "ter paciência" e "não debater na tribuna".
— Se aceitarmos provocações, vamos acabar jogando o jogo da oposição. Por isso não vamos entrar em discussão para não perder tempo — disse Any Ortiz (PPS).
Convocação extraordinária
Com parcelamentos salariais consecutivos desde fevereiro de 2016, o governo Sartori prevê o "colapso" das finanças públicas se não conseguir aderir ao regime de recuperação fiscal proposto pelo Palácio do Planalto. A autorização para a adesão está prevista para ser votada nesta semana pela Assembleia – junto com as propostas sobre o fim da exigência de plebiscito para vender as estatais CEEE, Sulgás e CRM.
Caso se concretize, a adesão ao regime fiscal garantirá aval para novos empréstimos e pelo menos três anos de carência na dívida com a União, um fôlego de mais de R$ 10 bilhões ao caixa – equivalente a seis folhas de pagamento do Executivo.