O ex-governador do Rio Grande do Sul Olívio Dutra (PT) participou, nesta segunda-feira (22), da manifestação dos integrantes da Via Campesina, em Porto Alegre. O ato é parte das atividade em apoio ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que terá recurso julgado no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) na quarta-feira (24).
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Olívio afirma que "as manifestações não são apenas em torno de Lula, mas pelo resgate e qualificação da democracia". Para o ex-governador, o PT "errou ao imitar a política tradicional dos partidos que há anos utilizam os espaços públicos". Ainda assim, ele diz que foram erros "individuais e não coletivos".
Apesar de defender o ex-presidente, Olívio acredita que "o campo democrático já tinha de ter construído alternativas" para o caso de Lula não conseguir ser candidato à Presidência da República neste ano.
Veja, a seguir, trechos da entrevista:
O ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, afirmou que, independente da candidatura de Lula, "a esquerda tem de se repensar". O senhor concorda?
Quem é esquerda no Brasil? Quais são os seus contornos ideológicos e programáticos? Essa é uma pergunta que nunca foi respondida. O PT faz parte da esquerda, mas não é toda a esquerda. A sociedade democrática tem de ser pluralista. O Estado precisa estar sob controle público e não privado. A esquerda não tem de ser repensada agora. Tem de se repensar desde sempre. O PT é parte, não é o todo. E nem pode ter a pretensão de ser o todo. A Frente Brasil Popular é um bom núcleo, que deve ser fortalecido a médio e longo prazo.
E se Lula não for candidato? O PT já precisa trabalhar outro nome?
O campo democrático e popular já tinha de ter vindo construindo alternativas. Mas, neste momento, o foco é essa questão (julgamento de Lula). O Judiciário mostrou tendenciosidade. Isso não faz bem. Isso revela um desfuncionamento de um poder importante. É preciso lutar para que se aperfeiçoem os funcionamentos institucionais, e ir criando uma consciência que o Estado brasileiro precisa funcionar para a maioria do povo de forma constante. Isso precisa ser retomado através de uma Assembleia Nacional Constituinte livre e soberana. Quem é que vai decidir isso? Isso tem de ser provocado de baixo para cima.
O PT não está devendo uma autocrítica, uma explicação para a sociedade?
O projeto do PT não é de uma ou de meia dúzia de pessoas. É um projeto coletivo que está longe de ser esgotado. Ele precisa ser resgatado e aperfeiçoado. Nós precisamos de um Brasil desenvolvido de forma parelha e de uma democracia radical. Não pode ser uma democracia meia sola, segundo a conveniência das forças sociais ou das maiorias relativas que se compõem nos três Poderes, em especial no Congresso. O PT errou ao imitar a política tradicional, convencional, dos partidos que há anos se utilizam do espaço público para benefício de alguns ou de famílias. Isso foi um erro grave do PT, de algumas figuras importantes do PT, que tinham cargos importantes no governo. Pessoas que se desviaram dos princípios do partido. Mas o partido é um sujeito coletivo. Eu luto por um projeto coletivo de partido.
Qual a importância das manifestações que ocorrem agora, às vésperas do julgamento do ex-presidente Lula?
A democracia brasileira é uma aspiração nacional. Não foi fácil reconquistá-la depois do golpe de 1964. A democracia foi golpeada em agosto de 2016. E aqueles que foram derrotados, em novembro de 2014, estão executando um projeto derrotado democraticamente. Então é preciso resgatar a democracia e qualificá-la. Para isso acontecer, o povo tem de ser sujeito e não objeto da política. Então, essa manifestação não é apenas em torno do Lula, que evidentemente é uma figura que merece ser respeitada. Tudo que for julgado ou definido sobre ele tem de ser comprovado, não pode ser arquitetado simplesmente para afastá-lo da eleição desse ano. O fundamental dessa mobilização é resgatar a democracia e qualificá-la, tendo o povo como sujeito.
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Julgamento de Lula
Condenado em primeira instância pelo juiz Sergio Moro a nove anos e seis meses de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva terá sua apelação julgada pelo TRF4, em Porto Alegre, nesta quarta-feira (24). A condenação é referente à denúncia na 13ª Vara Federal de Curitiba por supostamente ter recebido propina da construtora OAS em troca de favorecimentos à empreiteira em contratos na Petrobras. O suborno, no total de R$ 3,7 milhões, teria sido pago com a aquisição e reforma de um triplex no Guarujá (SP) e no custeio do armazenamento de seu acervo presidencial.
Os advogados pedem a absolvição do petista, alegando que a condução do processo por Moro foi "parcial e facciosa". Já o MPF recorreu à decisão de Moro por entender que o ex-presidente deve ser punido por três atos de corrupção em concurso material — instrumento jurídico pelo qual as penas são somadas — e não apenas um crime de corrupção e um de lavagem de dinheiro, como entendeu o juiz na sentença.
O ex-presidente será julgado pela 8ª Turma do TRF4, formada pelos desembargadores João Pedro Gebran Neto, relator do processo, Leandro Paulsen, presidente da Turma e revisor, e Victor Luiz dos Santos Laus. Estão previstas manifestações favoráveis e contrárias ao ex-presidente em Porto Alegre, e foi montado um esquema de segurança especial. Seja qual for o resultado do julgamento — condenação ou absolvição —, o processo não se encerra nesta quarta-feira, já que cabem recursos ao próprio TRF4.