Disposto a reverter o imobilismo do governo e a demonstrar ao mercado capacidade de retomar a agenda de reformas estruturais, o presidente Michel Temer trabalha para colocar em votação as mudanças na Previdência e no sistema tributário. Para tanto, os articuladores do Planalto tentam apaziguar o ambiente na base aliada, que teme prejuízos eleitorais e cobra cargos e verbas em troca da manutenção do apoio a Temer. A inflação — que incide em patamares mínimos sobre a cesta básica — é cada vez mais alta sobre o preço da fidelidade parlamentar.
O objetivo do governo é retomar a discussão sobre a Previdência já nas próximas semanas. O texto original será desidratado, resumindo-se a mudanças pontuais, como o aumento da idade mínima para a aposentadoria e alterações de benefícios no setor público (clique aqui para ver mais detalhes das mudanças previstas). Ainda assim, o Planalto prevê dificuldades para a aprovação. Por se tratar de uma emenda constitucional, o texto precisa de, ao menos, 308 votos na Câmara.
— Hoje, temos entre 260 e 270 votos. Estamos garimpando os demais — relata interlocutor do Planalto.
O foco do governo está no centrão, bloco formado por ao menos 12 partidos pequenos e médios, liderado por PP, PSD, PTB e PR. Juntos, contam com mais de 210 deputados. A posição de cerca de 170 integrantes do grupo é considerada mais fisiológica. Esses parlamentares são acompanhados de perto pelo Planalto. Grande parte foi agraciada com cargos de segundo e terceiro escalões e emendas parlamentares.
— Todos no centrão têm cargos. Eles têm de entender que, sem a reforma da Previdência, não terá dinheiro para pagar as emendas — condiciona o deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), vice-líder do governo na Câmara.
Entre os partidos de sustentação do governo, há o discurso de que não há clima para a votação de reformas impopulares. O principal empecilho é o tempo, já que falta menos de um ano para as eleições de 2018. Porém, escolhas bancadas pelo Executivo, como a manutenção de Antonio Imbassahy (PSDB-MG) na Secretaria de Governo, responsável pela articulação com o Legislativo, são citadas como um dos motivos para a pulverização da base.
— Imbassahy não tem condição. Não dialoga há quatro, cinco meses. Quanto mais o tempo passa (sem mudanças no primeiro escalão), mais dificuldade o governo vai ter — sentencia o líder do PP na Câmara, Arthur Lira (AL), afirmando que as negociações estão sendo conduzidas pelo ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha.
A discordância com o espaço do PSDB no governo — o partido ocupa quatro ministérios — foi ampliada depois que a sigla se dividiu no congelamento da segunda denúncia. O líder do PTB na Câmara, Jovair Arantes (GO), diz que a situação causa desconforto entre outros apoiadores. Para ele, é possível votar parte da reforma previdenciária, apesar de concordar que a proximidade com o ano eleitoral pode fazer naufragar a intenção do Executivo.
Já o líder do PSD, Marcos Montes (MG), diz que vê potencial de aprovação em pontos da reforma tributária, mas é pessimista quanto à principal aposta da equipe econômica de Temer:
— Temos muitas matérias para votar. Acho que a da Previdência não avança.
Todos os deputados ouvidos concordam em um ponto. Houve falhas do Planalto na apresentação da reforma que mexe com a aposentadoria dos trabalhadores. Eles avaliam que a retomada do assunto necessita obrigatoriamente de nova estratégia de comunicação.
Para aumentar a articulação pelas alterações previdenciárias, o Planalto concordou em dividir o protagonismo do tema com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Apesar das relações atribuladas com Temer, o parlamentar representa peça importante na manutenção do diálogo com seu partido. No entanto, o líder do DEM na Casa, Efraim Filho (PB), afirma que as reformas mais profundas deverão ficar para o futuro.
Para a votação de uma emenda constitucional, são necessários 308 votos (a Câmara tem 513 deputados), em duas votações. Em seguida, o tema segue para o Senado, onde o apoio necessário é de 49 parlamentares (entre 81 senadores), também em dois turnos.
Aceno ao mercado
A posição firme do Executivo em manter vivo o tema das reformas é um aceno ao mercado. O entendimento é de que a popularidade do Planalto junto à população poderá melhorar até o próximo ano caso os sinais de recuperação da economia sigam aparecendo.
Para o economista e ex-secretário da Fazenda Aod Cunha, o maior mérito do governo Temer, do ponto de vista do setor empresarial e financeiro, foi conseguir aprovar algumas das mudanças propostas, como a adoção do teto dos gastos públicos e a reforma trabalhista. Quanto à previdenciária e à tributária, vê como pequenas as possibilidades de que saiam do papel. Ainda assim, não há pessimismo.
— Há a expectativa do mercado de que, mesmo que não ocorram neste governo, o próximo terá de, forçosamente, fazer as reformas — avalia.
Aod diz que o país precisa de "maturidade política" para discutir as alterações necessárias:
— A mais importante das reformas é a política.
Para a oposição, o Planalto deveria recuar da intenção de aprovar mudanças profundas em um período tão próximo às eleições. O deputado Henrique Fontana (PT-RS) avalia que o tema deve ser discutido durante a campanha para que o eleitor possa escolher o candidato e a proposta que preferir:
— O Brasil precisa de mudanças na Previdência. Mas, para fazer a reforma, precisamos de debate franco e de um presidente com legitimidade.