
Passada a votação da denúncia contra Michel Temer, o Palácio do Planalto quer fazer um pacto com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para conseguir emplacar uma agenda de reformas consideradas necessárias na retomada do crescimento econômico. Com menos apoio político, o presidente da República sabe que agora depende de Maia para aprovar projetos polêmicos, "tourear" o Centrão e concluir sem sobressaltos o seu mandato, em 1º de janeiro de 2019.
O objetivo do Centrão — grupo formado por partidos médios, como PP, PR e PSD — é transformar Maia em uma espécie de "primeiro-ministro" para conduzir a articulação da Câmara com o Planalto. Conhecido por fazer ameaças e se rebelar, o grupo que já foi liderado pelo ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) — atualmente preso da Lava-Jato — também pressiona o governo por uma reforma ministerial. Quer a todo custo tirar o PSDB da Esplanada, sob o argumento de que a bancada tucana aumentou o grau de infidelidade ao presidente.
Temer planeja prestigiar Maia, que também tem boa interlocução com o empresariado e o mercado financeiro. Nos últimos dias, por exemplo, pediu para o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, acertar com o deputado um modelo que permita enxugar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) sobre a reforma da Previdência. Nesta quinta-feira (26), Maia também se reuniu com o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira.
Certo de que não terá os votos necessários para aprovar mudanças na aposentadoria às vésperas do ano eleitoral de 2018, o governo pretende se fixar na redução da idade mínima para a concessão do benefício e na quebra de privilégios dos servidores.
Questionado sobre a possibilidade de ser "primeiro-ministro" de um governo sem força, Maia abriu um sorriso.
— Eu já sou articulador político, mas não dá para fazer um modelo híbrido num sistema presidencialista como o nosso. Michel sempre manteve uma boa relação com o Parlamento, o Brasil vive uma crise profunda e acredito que a Câmara terá um papel relevante para sairmos da crise. Não se pode misturar embate político com a agenda do país — afirmou Maia.
Articulações e futuro
Além de mudanças na Previdência, o Planalto quer concentrar esforços na simplificação tributária. Maia concorda, mas não abre mão de também investir em projetos sociais que dizem respeito à segurança pública e à geração de empregos. Até agora, o deputado jura ser candidato à reeleição pelo Rio, Estado que vive a maior crise de segurança do país.
— Não existe e nem existirá essa competição entre o Executivo e o Legislativo — argumentou o ministro da Secretaria de Governo, Antônio Imbassahy, que chegou a reassumir o mandato de deputado do PSDB para ajudar Temer a derrubar a denúncia na Câmara:
— As boas iniciativas devem ser recebidas com aplauso — complementou.
Imbassahy foi escalado por Temer várias vezes, nas últimas semanas, para acalmar Maia, que disse ser vítima de "intrigas" do Planalto. O tucano conseguiu reaproximar o presidente da Câmara do governo, mas não se livrar das críticas do Centrão, que pede a sua cabeça.
— Eu rezo para Rodrigo Maia ser iluminado, porque só assim vamos aprovar a reforma da Previdência, a tributária e mexer com a segurança. Com o protagonismo do Rodrigo, se ele for contra algum projeto aqui, a coisa não anda, mesmo que o Executivo queira que ande — afirmou o deputado Beto Mansur (PRB-SP), vice-líder do governo na Câmara.
Na prática, tanto a pauta do Planalto como a do Congresso será muito atrelada às eleições de 2018.
— A agenda eleitoral é a que vai dominar nesse pós-denúncia e o governo precisará ter uma base aliada que garanta a estabilidade. Não poderá nem exigir, nem retaliar — disse o deputado Sílvio Torres (SP), secretário-geral do PSDB, que é aliado do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e foi a favor do prosseguimento da denúncia contra Temer.
Apesar de comandar quatro ministérios, o PSDB continua rachado e, na quarta-feira (25), deu mais votos contra do que a favor do presidente — 23 a 21. Além disso, exibiu maior índice de infiéis agora do que na votação da primeira denúncia, em 2 de agosto.
Desta vez, Temer foi acusado pelo ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot de chefiar uma organização criminosa para desviar recursos públicos e também de obstruir a Justiça nas investigações da Lava-Jato. No mesmo processo, os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência) foram denunciados por organização criminosa.
— Temer está tendo uma nova oportunidade de reiniciar o governo. Necessita urgentemente fazer uma rearrumação e tirar os tucanos da equipe porque do jeito que está não funciona. Maia terá um papel importante nesse processo porque dialoga bem com a base e com a oposição — afirmou o deputado Arthur Lira (AL), líder da bancada do PP na Câmara.
Ao ser perguntado se o Executivo aceitaria dar ainda mais protagonismo ao presidente da Câmara, Lira não pestanejou.
— Aceitar ou não independe da vontade do governo. É uma questão de sobrevivência — argumentou ele.
Para o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), o Planalto se converteu em um "comitê" para salvar Temer, "sangrando" as contas públicas.
— O presidente ganhou, mas não levou. Na prática, já vivemos um semiparlamentarismo e Rodrigo Maia virou primeiro-ministro — disse Silva.