As delações mais destrutivas da Operação Lava-Jato vieram dos presidentes de dois dos maiores conglomerados empresariais do Brasil e do mundo. À frente da Odebrecht e da JBS, Marcelo Odebrecht e Joesley Batista corromperam a república e auferiram benefícios. Seus milhões garantiram contratos altamente lucrativos com diferentes governos, de variados matizes ideológicos, e asseguraram a edição de leis para atender aos seus interesses, como a obtenção de isenções fiscais. Todos os envolvidos ganhavam: políticos e partidos levavam dinheiro farto e as companhias cresciam vigorosamente.
Os dois grupos integraram a chamada política das "campeãs nacionais", empresas escolhidas no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para receber ajuda do setor público e se firmar mundialmente como instituições fortes e competitivas, carregando a imagem de um Brasil empreendedor e robusto.
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Se apresentam semelhanças no gigantismo dos negócios, na proximidade com o poder e nos meios empregados para corromper, os executivos guardam diferenças nos seus destinos. Marcelo Odebrecht não acreditava que seria preso e, quando isso aconteceu, a estratégia inicial foi de enfrentamento com a Lava-Jato. Prestigiada junto aos brasileiros, a operação ganhou com sobra a queda de braço, e o executivo teve de negociar. Seu acordo de delação inclui o cumprimento de 10 anos de pena.
Pressentindo o fantasma das investigações em curso, Joesley Batista foi à Procuradoria-Geral da República (PGR) com gravações bombásticas que fizeram o país tremer. Gravou ninguém menos do que o presidente Michel Temer e o senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG). Disposto a contar tudo, fechou o acordo dos sonhos de qualquer criminoso: não será denunciado e, distante do Brasil em chamas, passa uma temporada nos Estados Unidos, com autorização da PGR. Veja no quadro um comparativo entre Marcelo Odebrecht e Joesley Batista.
Como operavam o esquema
Marcelo Odebrecht
Assumiu o comando do grupo em dezembro de 2008 e profissionalizou célula responsável por fazer pagamentos ilícitos a homens públicos. O Setor de Operações Estruturadas era um núcleo sigiloso da Odebrecht, chefiado por Hildeberto Mascarenhas Alves da Silva Filho. As propinas eram registradas e somaram R$ 10,6 bilhões. Marcelo Odebrecht ainda tinha o apoio de alguns executivos de sua confiança que cuidavam das relações e interesses da companhia.
Joesley Batista
Liderou o processo de internacionalização da JBS ao assumir a presidência do grupo, em 2006. Mantinha contatos com líderes políticos dos mais altos escalões e operava contas no Exterior para fazer pagamentos ilícitos. Atuava na linha de frente do esquema criminoso. Também contava com o apoio de alguns executivos da sua confiança. Um deles é Ricardo Saud, diretor do grupo J&F, que também fez delação premiada. Irrigou o meio político com repasses que chegaram a R$ 500 milhões.
Ramos de atuação
Marcelo Odebrecht
A Odebrecht atua em construção pesada, óleo e gás, química e petroquímica, indústria naval e empreendimentos de defesa nacional, voltados à construção de submarinos. É a maior empreiteira do Brasil e uma das maiores do mundo, com atuação em outros 24 países, incluindo Estados Unidos, Europa e África.
Joesley Batista
A JBS é a maior processadora de proteína animal do mundo, tem como carro-chefe as indústria de carne bovina, suína, aves e de cordeiro. Também produz alimentos prontos. A expansão dos negócios levou a J&F, holding da família Batista, a atuar em outros ramos, como laticínios (Vigor), calçados (Alpargatas) e celulose (Eldorado).
Fonte de recursos ilícitos
Marcelo Odebrecht
Superfaturamento de obras e contratos com o setor público. A parte mais visível desses negócios ocorria na Petrobras, mas o esquema foi praticado também em outras frentes, como a reforma do estádio Maracanã.
Joesley Batista
Empréstimos generosos e de aprovação célere obtidos no BNDES. Fundos de pensão como o Funcef, da Caixa Econômica Federal, e o Petros, da Petrobras, também foram utilizados para investir na JBS.
Meio de pagar propina
Marcelo Odebrecht
Quantias mais vultosas eram transferidas para contas secretas no Exterior, as offshores, muitas em nomes de empresas fictícias que ocultavam os verdadeiros beneficiados. Os fundos eram abertos em paraísos fiscais, como o Panamá. Também mascaravam a propina com repasses de dinheiro a empresas de prestação de serviço e consultoria. Parte dos pagamentos era feito por meio de doações legais a partidos políticos, além do caixa 2.
Joesley Batista
Os meios eram variados. Para o PT, teria operado duas contas no Exterior e feito entregas de dinheiro quando recebia demandas. Teria usado notas fiscais frias e superfaturado a aquisição de imóveis, meio empregado para repassar R$ 17 milhões a Aécio Neves (PSDB). Também teria chegado a comprar 3% do estádio Mineirão. Também atuava com entrega de malas e doações a partidos, seja caixa legal ou 2.
Quem compraram
Marcelo Odebrecht
Nas delações de executivos da Odebrecht, são citados como beneficiários ou participantes das engrenagens do esquema de corrupção pelo menos 415 políticos e 26 partidos.
Joesley Batista
O delator Ricardo Saud disse que a JBS entregou dinheiro a 1.829 candidatos de 28 partidos. Saud definiu o esquema como um "reservatório de boa vontade", o que significa ter margem para cobrar favores de poderosos.
Percentual nos negócios
Marcelo Odebrecht
Na Petrobras, o combinado era que as propinas deveriam ficar entre 1% e 2% dos contratos, dependendo da diretoria envolvida. Isso valia também para as outras empreiteiras que atuavam no esquema.
Joesley Batista
Em depoimento, Joesley disse que a propina era de 4% do total do empréstimo obtido no BNDES. O primeiro financiamento, em 2006, foi de R$ 80 milhões, utilizado para comprar uma indústria na Argentina. Nesse caso, a remessa ilícita teria sido de R$ 3,2 milhões.
Melhores amigos no governo
Marcelo Odebrecht
A empresa transitou fortemente no poder desde a época da ditadura. No foco da apuração da Lava-Jato, um dos contatos mais próximos era o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, registrado com o codinome "Amigo" nos documentos da empresa que tratam de corrupção e favores.
Joesley Batista
Ao contar detalhes dos esquemas aos procuradores, Joesley foi explícito ao apontar o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega como o seu contato mais próximo. Mantega não se beneficiaria de valores, mas teria organizado o fluxo dos recursos que chegavam ao PT.
Acordo de delação
Marcelo Odebrecht
Foi preso em junho de 2015 pela Polícia Federal e, inicialmente, adotou estratégia de enfrentamento. O grupo Odebrecht atacou publicamente a Operação Lava-Jato e procurou resistir. A prisão e a descoberta do setor de propina, contudo, mudaram os rumos do comportamento. O executivo fez a delação premiada e terá de cumprir 10 anos de prisão entre os regimes fechado e domiciliar, a mais dura das penas entre os delatores. No final de 2017, ele terá cumprido dois anos e meio de cárcere e poderá deixar a Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba.
Joesley Batista
Ao saber que estava sendo investigado, tomou a iniciativa de propor à Procuradoria-Geral da República (PGR) acordo de delação premiada. Levou gravações bombásticas aos procuradores, comprometendo o presidente da República, o que lhe deu margem para negociar acordo favorável em tempo recorde. Ele sequer será acusado pela PGR. Ou seja, não sofrerá nenhuma sanção, exceto pagamento de multa. Ainda teria feito uso de informação privilegiada para comprar dólares na véspera do estouro dos fatos, o que lhe rendeu milhões. Está nos Estados Unidos.