O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ostenta o título informal de maior liderança da direita brasileira, mas a sua imagem e nome estão ausentes, até o momento, da campanha de reeleição de Sebastião Melo (MDB) à prefeitura de Porto Alegre. Melo tem uma candidata a vice, Betina Worm, indicada pelo PL, o partido de Bolsonaro, e reúne na coligação as demais lideranças locais e siglas agregadas do bolsonarismo, principalmente o PP e o Republicanos.
O cenário não é obra do acaso: repete a eleição de 2020, quando Melo já tinha o apoio em peso deste espectro político, mas também evitou se posicionar como um bolsonarista engajado. Aliados próximos argumentam que é preciso espelhar a larga coligação do prefeito, de oito partidos, alguns deles de centro, como o PSD e o Solidariedade. O próprio MDB, justificam, é uma legenda diversa: reúne Brasil afora desde velhos caciques do centrão até lulistas, bolsonaristas e entusiastas da terceira via.
— Nenhuma liderança partidária deu depoimento até agora, nem os nomes históricos do MDB gaúcho. Nossa campanha, neste momento, é propositiva. Estamos mostrando o que Melo fez e o que ainda vai fazer — acrescenta André Coronel, um dos coordenadores da chapa.
Bolsonaro esteve ao lado de Melo na convenção do PL que confirmou a aliança à reeleição em 26 de julho, em ato na Casa do Gaúcho, na Capital. Depois disso, Melo não usou depoimento ou fez alusão ao ex-presidente na propaganda eleitoral na TV e no rádio. Ele tampouco costuma mencionar alinhamento em debates e entrevistas. Entre os dias 12 e 14 de setembro, Bolsonaro esteve no Rio Grande do Sul para apoiar candidatos, mas o roteiro incluiu somente Pelotas, Santa Maria, Santo Ângelo e Passo Fundo. Na Capital, prevalece um certo distanciamento, apesar da coligação partidária e do engajamento bolsonarista na campanha de Melo.
Embora isso não seja admitido publicamente, o fato é que a postura equidistante é a mais conveniente para Melo. Ele já conta com o voto da direita bolsonarista. Esse eleitor não está em disputa porque, em Porto Alegre, a direita conservadora não vislumbra outro representante possível.
— São Paulo tem dois candidatos se digladiando pelo espaço do centro e da direita. Aqui é diferente — avalia o experiente político Cezar Schirmer, também da coordenação da campanha de Melo.
Em São Paulo, o prefeito Ricardo Nunes (MDB), apoiado por Bolsonaro, começou a campanha com estratégia semelhante à de Melo, mantendo distância. Ele teve de adequar a rota a partir do crescimento de Pablo Marçal (PRTB) entre o eleitorado da direita conservadora. Um dos primeiros gestos da modulação foi uma chamada de vídeo feita por Bolsonaro para Nunes, com declaração de apoio, durante jantar de empresários com o prefeito paulista, no último dia 12.
Como Melo domina no estrato, não tem a necessidade de grudar a imagem para segurar o eleitor guiado pelas lideranças nacionais. Isso evita que ele tenha de lidar com a rejeição de Bolsonaro. Pesquisa Quaest publicada no dia 27 de agosto mostrou que, entre o eleitorado porto-alegrense, o governo Bolsonaro foi considerado negativo por 43% dos entrevistados. O percentual de reprovação superou as avaliações positivas, de 31%, e as regulares, de 24%. Esse cenário é reforçado pela derrota de Bolsonaro, nas urnas de Porto Alegre, para Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na eleição presidencial de 2022: no segundo turno, o petista ficou à frente com 53,5% dos votos contra 46,5%.
Aliados do prefeito também justificam que a eleição está demarcada pelo caráter municipalista, sobretudo após a enchente. O que importa, avaliam, são os problemas da cidade e as soluções.
— Há um eleitorado de centro disponível e as pessoas querem saber quem é mais apto para ser prefeito. É aí que o Melo se destaca. Ele conhece a cidade e tem experiência — comenta Schirmer.
Melo tem trajetória consolidada em Porto Alegre, seja como vereador, vice-prefeito, deputado estadual e prefeito. É conhecido nos bairros e a conclusão é de que tem faixa própria: não precisa ser apresentado ao eleitor médio da Capital por expoentes nacionais.
Lideranças do PL conversaram recentemente com o MDB sobre o uso de depoimento de Bolsonaro nos horários de propaganda na TV dos candidatos à Câmara. Existe movimento para viabilizar a veiculação, mas, neste momento, limitada ao espaço dos postulantes à vereança do PL.
Qualquer reprodução na propaganda de Melo será objeto de discussão interna. A avaliação é de que a campanha vai bem, com foco em pessoas e tom alegre.
Entre emedebistas, a resposta é de que não há pressão da ala mais bolsonarista do PL pela vinculação com Bolsonaro.
— Não vi nenhuma cobrança, mas o Melo só tem a ganhar colando a imagem com a direita. Da esquerda, ele vai ganhar muito pouco ou nada — comenta o deputado federal Bibo Nunes (PL).
Presidente do PL de Porto Alegre, o deputado federal Luciano Zucco diz que a campanha não reproduz, até agora, a polarização nacional entre o lulismo e o bolsonarismo.
— Não tem pressão do PL. A campanha anda conforme o quadro. Está muito na enchente. Se for necessário, no momento certo, ele (Melo) vai se posicionar — afirma Zucco.