Marcadas para o próximo domingo (6), as eleições municipais podem soar como um quebra-cabeça para os eleitores. Além de eleger um representante para a prefeitura, os cidadãos precisam decidir em quem votar para vereador. Uma escolha que pode não ser tão fácil assim, dado o elevado número de candidatos no pleito e o complexo sistema responsável por elegê-los.
Em Porto Alegre, por exemplo, 518 candidatos disputam 35 vagas disponíveis na Câmara Municipal — uma a menos que na legislatura atual, conforme redução aprovada pelo parlamento.
Com uma oferta tão grande, como escolher um candidato a vereador? Para ajudar na decisão dos eleitores, Zero Hora consultou especialistas da área política, que orientam sobre o que considerar no momento da escolha.
Como escolher um vereador?
Valorize o voto
Coordenador do Núcleo de Estudos Sociopolíticos (Nesp) da PUC-MG, o cientista social Robson Sávio Reis Souza aponta que, em meio ao cenário de descrença nas instituições políticas, é comum que os cidadãos não percebam o valor que há na participação de cada um dos eleitores. No caso das eleições municipais, não raro são os casos em que o voto para vereador é negligenciado — o famoso "vou votar em qualquer um, porque ninguém faz nada", conforme o pesquisador.
Para ele, o caminho para uma escolha consciente passa, primeiro, por entender a importância deste processo.
— Para que tenhamos uma cidade, um Estado e um país melhores, há um custo de participação política. As melhorias dependem dos cidadãos. Se o cidadão lava as mãos e negligencia o seu voto, ele também é responsável pelo que não está indo bem — enfatiza.
Conheça a função dos vereadores
Outro ponto fundamental, segundo Souza, é buscar compreender qual é o papel dos vereadores nos municípios. Isso porque, a partir do momento que os eleitores entendem a grande influência que os parlamentares têm nos assuntos da cidade, é mais provável que votem de forma responsável, conforme ele.
— A Câmara Municipal tem três funções principais: produzir leis de base local, aprovar o orçamento da cidade e fiscalizar a prefeitura — explica Souza.
— O papel desempenhado pelos vereadores é fundamental para o município, mas a maioria dos cidadãos não compreende o grande poder que esses parlamentares têm. Eles podem acompanhar a execução das políticas públicas da prefeitura, convocar o prefeito a dar explicações e até mesmo votar um processo de impeachment — detalha.
Pondere propostas
Compreender o trabalho dos vereadores também protege o cidadão de cair em "falsas promessas". Para Souza, é importante que os eleitores ponderem a exequibilidade das propostas apresentadas pelos candidatos, afinal, há limites para o que o legislativo municipal pode fazer.
— Um vereador não pode legislar sobre aborto ou pena de morte, por exemplo, porque essas questões são da esfera federal — diz o coordenador do Nesp. — Sempre devemos desconfiar desse tipo de discurso, pois ele vem para iludir o eleitor. Há muitos candidatos que se apoiam em pautas ideológicas durante a campanha, no intuito de mobilizar as paixões do eleitorado, mas jamais terão nenhum tipo de interferência nelas — explica Souza.
Ainda assim, o pesquisador entende que os eleitores podem escolher um candidato com base na ideologia defendida por ele. Entretanto, é preciso entender as limitações que o parlamentar terá.
— Cada um é livre para votar de acordo com o critério que quiser, mas quando o eleitor ancora o seu voto em questões como a religião, a moral e os costumes, isso tende a direcionar escolhas equivocadas. O ideal seria analisar as propostas que cada candidato tem para resolver os problemas da cidade, pois isso é o que ele terá condições de fazer — orienta Souza.
Entenda o sistema e considere o partido
Professor do Programa de Pós-graduação em Sociologia e Ciência Política da PUC-RS, Augusto Neftali Corte de Oliveira afirma que é importante que os eleitores conheçam e compreendam o sistema que elege os vereadores.
O cálculo que determina quem ocupará as cadeiras disponíveis na Câmara Municipal é complexo e não leva em consideração somente o número de votos recebidos por um determinado candidato, mas, também, o desempenho do partido. São os chamados quociente eleitoral e quociente partidário, resumidos pelo cientista político:
— Primeiro, o que se define são quantas cadeiras cada partido terá. Esse número depende do percentual de votos que a legenda fez em relação ao total de votos válidos. É somente depois que os partidos recebem suas vagas que são eleitos os vereadores para preenchê-las, e ganham os que tiveram o maior número de votos dentro de cada partido com vaga.
O modelo adotado faz com que um concorrente menos votado possa entrar na Câmara no lugar de outro que obteve melhor desempenho individual, dependendo do número de votos recebidos pelo partido de cada um deles. Do mesmo modo, o voto dado em um candidato de determinada sigla pode ajudar a eleger outro representante da mesma legenda que tenha recebido número maior de votos.
Assim, Oliveira observa que os eleitores têm liberdade para balizar a escolha apenas na figura do candidato, mas que é interessante analisar também o partido em que ele está inserido.
— O eleitor precisa entender que, ao votar no candidato, está também votando no partido. Se o candidato que ele escolheu não for eleito, o voto dele estará contribuindo para a eleição de outros candidatos do partido. Vale, então, avaliar se a postura dessa legenda combina com aquilo em que o eleitor acredita — afirma o cientista político.
Pesquise o histórico dos candidatos
Também é indispensável investigar a trajetória pessoal e política dos candidatos. Oliveira recomenda que os eleitores realmente se dediquem a essa pesquisa.
— O ideal é destacar um tempo para pensar nessa escolha, pesquisar o histórico dos candidatos que chamaram atenção, observar qual o engajamento deles com a comunidade e buscar informações de qualidade, em fontes que sejam confiáveis — diz.
No caso de candidatos que buscam reeleição, a pesquisa ganha ainda mais relevância:
— É muito importante conferir o que o candidato propôs, como ele votou em determinadas pautas e quais foram as prioridades do mandato dele, para entender se elas combinam com o que o eleitor deseja para a cidade.
A dica do cientista político é que os eleitores não se baseiem somente na propaganda eleitoral e busquem se informar por meio de órgãos oficiais, como o Tribunal Superior Eleitoral, e veículos de comunicação reconhecidamente confiáveis. Também é preciso ter cuidado redobrado com informações que chegam pelas redes sociais disfarçadas de notícia, mas que podem não ser verdadeiras. Oliveira alerta que, antes de compartilhar qualquer informação, é preciso checar.
— O voto tem um custo alto, porque, durante quatro anos, os eleitos terão uma grande influência na gestão da cidade. Por isso, é muito importante que a decisão seja tomada de forma consciente — afirma.
Considere o apoio à prefeitura
Outro dado que pode ajudar a escolher um vereador é analisar quem os candidatos apoiam para a prefeitura. A informação nem sempre é levada em consideração pelos eleitores, mas tem uma importância lógica, explica Oliveira:
— Quando votamos para prefeito, em tese, nós estamos escolhendo um projeto de cidade em detrimento de outros que foram apresentados. É interessante observar, então, se o nosso candidato a vereador apoia o mesmo projeto de cidade que nós escolhemos eleger. É um "voto casado" que não é obrigatório, mas que faz bastante sentido.
Olhe para a sua comunidade
É vasta a gama de questões que podem mobilizar a escolha de um candidato, mas, para o professor da PUCRS, uma boa opção é considerar a relação dos candidatos com a comunidade em que o eleitor vive.
— Não existe obrigatoriedade, mas faz sentido que um eleitor que vive em determinada região procure valorizar candidatos que estão relacionados a esse local. É um critério bastante válido, porque o vereador poderá, realmente, trabalhar em prol de melhorias para o bairro — diz Oliveira.
Assim, a questão local pode consolidar uma espécie de "filtro" para a escolha. O eleitor tem a opção de pré-selecionar candidatos que vêm da mesma comunidade que ele e, a partir desta lista, analisar individualmente as propostas e o histórico de cada um, por exemplo.
Reflita sobre representatividade
Tópico que vem crescendo nas últimas eleições, a preocupação com a representatividade também é uma opção de "filtro", conforme Oliveira. O eleitor pode decidir que votará em alguém de determinada raça ou gênero, por exemplo, e escolher a melhor opção de candidato a partir desse espectro.
O mecanismo tende a refletir em uma ocupação mais diversa da Câmara Municipal, o que traz benefícios para a gestão da cidade.
— Há determinados problemas que só quem conhece aquela realidade poderá pensar em soluções completas. Então, é muito positivo que haja diversidade entre os parlamentares em fatores como classe social, raça e gênero. Várias pesquisas demonstram que os eleitores têm se preocupado cada vez mais com esse tipo de questão, e isso pode enriquecer muito o debate político — finaliza Oliveira.