É possível que você já tenha assistido a algum vídeo do deputado federal André Janones (Avante) nas redes sociais, especialmente se costuma utilizar o Facebook. O cabelo encaracolado, a barba com fios brancos por fazer e a voz sempre empostada, como se estivesse gritando, são características que marcam uma das figuras que mais têm chamado atenção nesta eleição. Goste ou não do parlamentar, uma coisa é certa: ele ganhou destaque na campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para a Presidência da República.
Controverso e forte nas redes sociais, Janones foi reeleito para a Câmara Federal com 238.967 votos por Minas Gerais. Meses antes, em agosto, ele havia desistido da candidatura própria ao Planalto para ajudar na tentativa de retorno do ex-presidente ao Executivo federal.
O apoio não tem sido superficial. Pelo contrário. Janones conseguiu ampliar o engajamento de Lula no ambiente digital. Mais do que isso: o político de 38 anos tem utilizado o que pesquisadores chamam de "tática de guerrilha", algo que era visto nas campanhas bolsonaristas, mas que os apoiadores do candidato petista não costumam utilizar.
— O Janones sabe usar essa tática de guerrilha. O que seria isso? É a cada dia, às vezes mais de uma vez, pegar uma pauta para fustigar o adversário em cima daquilo. A lógica é fazer um ataque e obrigar o outro lado a gastar tempo para se defender. A tática de guerrilha é a de desviar o foco. Janones e até o Felipe Neto (influenciador digital, apoiador de Lula) têm feito isso. Antes o bolsonarismo nadava de braçada e ninguém respondia. Hoje, com a presença do Janones, se tem resposta — explica Eduardo Grin, cientista político e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Por isso, na avaliação do cientista político, a entrada de Janones na campanha de Lula significou uma mudança radical na presença do ex-presidente nas redes sociais. O deputado, inclusive, tem mais seguidores do que o candidato petista no Facebook — 7,9 milhões de Janones contra 5,2 milhões de Lula. O número, porém, ainda é significativamente menor do que o de Bolsonaro, que tem 14 milhões de seguidores nesta rede social. Somando Facebook, Instagram, Twitter e TikTok, o atual presidente tem 50,6 milhões de seguidores, enquanto Lula e Janones têm, juntos, 32,8 milhões.
— É difícil fazer uma avaliação do que o número de seguidores significa. É mais fácil olhar o impacto. E acho que sim, o Janones foi um acréscimo nesse ponto porque ele faz algo similar ao que o Carlos Bolsonaro faz do lado bolsonarista. Ele ativou uma guerrilha informativa maior, que era muito forte do lado adversário, e agora está sendo usada também pelo lado do Lula — afirma Raquel Recuero, professora e pesquisadora da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), coordenadora do Laboratório de Pesquisa em Mídia, Discurso e Análise de Redes Sociais (MIDIARS).
Greve dos caminhoneiros
Mas de onde vem André Janones? Natural de Ituiutaba, no triângulo mineiro, é filho de empregada doméstica, o pai é cadeirante e o primeiro emprego foi como cobrador de ônibus, entre 2003 e 2005. De família humilde, formou-se em Direito pela Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) e, a partir de 2008, passou a trabalhar como advogado.
Chegou a ser filiado ao PT, mas deixou a sigla por "rompimento ideológico" e concorreu à prefeitura de Ituiutaba em 2016 pelo Partido Social Cristão (PSC). Ficou em segundo lugar no pleito, com 13.759 votos (24,4%), e não foi eleito.
A grande virada na trajetória de Janones foi a greve dos caminhoneiros, em 2018. Ele ganhou notoriedade com vídeos em apoio à paralisação e, especialmente, viu o número de seguidores nas redes sociais dar um salto. A partir disso, conseguiu se eleger deputado federal há quatro anos, sendo o terceiro mais votado em Minas Gerais, com 178.660 votos, já pelo Avante. Foi reeleito neste ano, com 60 mil votos a mais do que no último pleito, chegando a 238.967 votos.
Por ter vivenciado diferentes experiência e possuir um know-how que, até então, o PT não tinha, Janones tornou-se peça importante no tabuleiro político do pleito deste ano. O presidente do partido no Rio Grande do Sul, deputado Paulo Pimenta, entende a importância de contar com um estilo de linguagem que "atinge um público diferente".
— Nossa campanha é muito plural, muito ampla. Existem estilos diferentes de fazer política, que se comunicam com diferentes públicos. O Janones trouxe o jeito dele, com uma liberdade criativa. Ele soma a experiência dele, atinge a um público diferente — defende o deputado federal reeleito, que complementa: — A esquerda, tradicionalmente, tem uma linguagem mais polida, cuidadosa, porque é o que utilizamos nos nossos debates internos. Então, alguém que vem com outra trajetória, não tem esse mesmo cuidado. É um espaço importante que precisava ser ocupado. O que nós não aceitamos é fake news. Mas o tom do debate, cada um tem um estilo.
Contraponto a Carlos Bolsonaro
Se de um lado o atual presidente tem em seu filho, o vereador do Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro (Republicanos), como uma espécie de cão de guarda nas redes sociais, a campanha do ex-presidente Lula tem em André Janones essa figura. É ele o principal responsável por atacar Jair Bolsonaro, como no caso da fala em que o presidente diz que "pintou um clima" com adolescentes venezuelanas. Ele também bate na tecla da possibilidade de fim do Auxílio Brasil a partir de janeiro de 2023 — o que é negado por Bolsonaro — e defende Lula de fake news como a de que o candidato petista fecharia igrejas evangélicas.
Janones também tem sido importante na divulgação de participações do ex-presidente em entrevistas, como a realizada na terça-feira (18) pelo Flow Podcast, que bateu recorde como a maior audiência simultânea da live, com mais de 1 milhão de pessoas acompanhando ao vivo a conversa. Muito graças ao trabalho do deputado, Lula superou o pico de audiência de 550 mil pessoas alcançado por Bolsonaro nesse mesmo podcast.
Elogiado por Lula por sua "esperteza", Janones também sofre resistência de aliados do ex-presidente. Ganhou apelidos como "cachorro louco" e "Carluxo da esquerda", em referência direta a Carlos Bolsonaro. Essa maneira como o deputado mineiro tem se posicionado, por vezes de forma agressiva em vídeos e em posts nas redes, o deixam com a fama de "bomba-relógio", que pode explodir a qualquer hora, como quando discutiu com o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles nos bastidores de um debate, ainda no primeiro turno.
— Acho que o Janones compreende que as redes sociais não são o terreno da racionalidade. O PT ainda tem uma forma antiga de fazer política, mas o bolsonarismo atua no ataque, destruindo imagens. Não estou dizendo que é correto, mas o Janones conseguiu contribuiu para mostrar ao PT que precisava fazer outras coisas no ambiente digital. As pessoas na internet se mobilizam por fatores afetivos, e ele (Janones) é muito hábil para atrair as pessoas a assimilarem mensagens que antes não eram acessíveis a determinados públicos — salienta o cientista político Eduardo Grin.
Apoiadores de Bolsonaro dizem que Janones se utiliza de fake news para atacar o atual presidente. Por conta disso, o PP e o PL (partido de Bolsonaro) entraram com pedidos de cassação do mandato de Janones na Câmara. A representação do PP, enviada ao Conselho de Ética da Casa e assinada pelo deputado Cláudio Cajado, alega que Janones quebrou o decoro parlamentar por divulgar "notícias caluniosas". O pedido do PL defende que o deputado teve práticas "incompatíveis com o exercício do mandato parlamentar".
Por conta desses pedidos, a deputada federal Gleisi Hoffmann, presidente nacional do PT, publicou mensagem em que chama de "ditadura bolsonarista" os pedidos de cassação do mandato de Janones. Segundo ela, a "democracia está em risco" ao se tentar privar o deputado de "expressar suas opiniões". Janones respondeu, no Twitter:
"A única liberdade que eles defendem é a liberdade para que possam mentir e enganar. Querem calar quem pensa diferente deles. Precisamos todos denunciar. NÃO VÃO ME CALAR!"
Com mais de 11 milhões de seguidores espalhados por suas redes sociais, o deputado pode ser ponto chave na eleição presidencial deste ano.
Número de seguidores:*
André Janones (Avante)
- Facebook: 7,9 milhões
- Twitter: 481 mil
- Instagram: 2,1 milhões
- TikTok: 591 mil
- Total: 11,07 milhões
Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
- Facebook: 5,2 milhões
- Twitter: 5 milhões
- Instagram: 8,7 milhões
- TikTok: 2,9 milhões
- Total: 21,8 milhões
Jair Bolsonaro (PL)
- Facebook: 14 milhões
- Twitter: 9,3 milhões
- Instagram: 23,5 milhões
- TikTok: 3,8 milhões
- Total: 50,6 milhões
Carlos Bolsonaro (Republicanos)
- Facebook: 917 mil
- Twitter: 2,8 milhões
- Instagram: 2,9 milhões
- TikTok: 73,8 mil
- Total: 6,6 milhões
* Consulta realizada em 20 de outubro