No crescente cenário de pressão por voto útil na eleição presidencial, lideranças do PDT gaúcho se movimentam para demonstrar unidade do diretório estadual da sigla em torno da candidatura de Ciro Gomes (PDT).
Nos últimos dias, houve manifestações de pedetistas do Rio de Janeiro, do Paraná e do cirista Tico Santa Cruz, vocalista da banda Detonautas, em favor do voto útil em Lula (PT), cuja campanha busca novas adesões na esperança de vencer a eleição logo no primeiro turno. Parte desses posicionamentos foi acompanhado por críticas ao tom virulento adotado por Ciro em relação a Lula.
"Sou Ciro, mas vou de Lula no primeiro turno", escreveu, no Twitter, Tico Santa Cruz. No sábado (17), ele justificou a decisão dizendo que "o voto útil no Lula é o caminho para encerrar esse ciclo de tragédia", em referência ao presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL).
As manifestações ocorrem na reta final da campanha e, caso obtenham sucesso, podem acabar desidratando a candidatura de Ciro, que tem aparecido em terceiro lugar nas pesquisas, abaixo do patamar de 10% das intenções de voto.
A deputada estadual Juliana Brizola (PDT), neta de Leonel Brizola, fundador e maior nome da história do partido, elaborou um manifesto em defesa da coesão em torno de Ciro. Na última sexta-feira (16), em comício em Porto Alegre, a ex-presidente Dilma Rousseff (PT), que foi uma longeva militante do PDT até 2001, afirmou ter "certeza que se o Leonel Brizola estivesse vivo, ele estaria naquele palanque sentado ao lado de Lula".
"Os trabalhistas autênticos, os brizolistas coerentes, não hesitam em afirmar, com muita honra e orgulho, que o nosso candidato é o Ciro Gomes", diz trecho da carta de Juliana. Ela ainda registra que não basta derrotar Bolsonaro, mas "varrer daqui o neoliberalismo", modelo econômico que ela diz ter sido praticado nos últimos 30 anos, inclusive nos governos petistas.
"Àqueles que sequer possuem um plano de governo concreto (...), lhes resta usar em vão o nome de Leonel Brizola, que, sem sombra de dúvidas, se estivesse vivo, estaria ao lado dos que insistem em enfrentar o entreguismo e o modelo neoliberal (...). O último voto e apoio incondicional em vida de Brizola foi em Ciro Gomes nas eleições presidenciais de 2002", encerra Juliana.
Mesmo em conversas reservadas, pedetistas asseguram que, até o momento, o diretório gaúcho está fechado com Ciro. O deputado federal Pompeo de Mattos (PDT) entende que, além das questões programáticas, a unidade é importante para os resultados eleitorais do partido. Ele estima que Ciro tem 10% dos votos na eleição presidencial e diz que, se o PDT tivesse essa mesma fatia de apoio para o Congresso, teria cerca de 50 deputados federais. Hoje, a bancada da legenda conta com 19 parlamentares na Câmara.
— O Ciro nos levanta. Ele tem mais votos do que o PDT hoje. Essa questão (voto útil em Lula) é a eterna falta de respeito e de ética do PT com o PDT. Eles sempre querem hegemonia. Vamos seguir nossa caminhada. Não vejo ninguém com eles aqui (no RS) — afirma Pompeo.
Para o deputado federal Afonso Motta (PDT), as manifestações de pedetistas e ciristas que ocorreram até agora em favor do voto em Lula não são espontâneas, mas resultado de jogos de forças. Motta é outro a assegurar a unidade no Estado.
— De nossa parte, o apoio é total e irrestrito ao Ciro e ao Vieira (da Cunha, candidato do PDT ao Palácio Piratini). Não há vacilação. Vamos resistir com nossas candidaturas, que estão no debate com dignidade e firmeza. Aqui no Rio Grande do Sul, na minha visão, estamos coesos — avalia Motta.
Já o deputado estadual Gerson Burmann (PDT) disse estar participando de muitos encontros partidários em que percebe "unidade em relação à candidatura do Ciro".
Nos últimos dias, outras manifestações, além da de Tico Santa Cruz, movimentaram os bastidores pedetistas. No dia 15 de setembro, Haroldo Ferreira, membro da direção da sigla no Paraná e integrante do diretório nacional, enviou uma carta ao presidente do PDT, Carlos Lupi, solicitando afastamento das funções diretivas para não incorrer em "infidelidade partidária".
"É lamentável que Ciro Gomes, homem nacionalista, preparado e provado na luta política, tenha adotado uma estratégia errática de tentativa de descontrução da imagem de Lula (...). Informo ao presidente que passo a defender a bandeira da liberdade e do Estado de Direito democrático, engajado na campanha eleitoral de Lula", diz trecho do manifesto de Ferreira, cuja veracidade foi confirmada pela reportagem em contato com o pedetista.
Outro que já veio a público, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, manifestar incômodo com a postura de Ciro e o voto em Lula foi o advogado Carlos Roberto Siqueira Castro, chefe da Casa Civil no segundo governo de Leonel Brizola no Rio de Janeiro, entre 1991 e 1994. Siqueira Castro é um dos fundadores do PDT.
Apesar da garantia de unidade no Rio Grande do Sul, nos bastidores do PDT não é descartado que surjam eventuais apoios para Lula e, no interior do Estado, até mesmo para Bolsonaro. Seria reflexo do ambiente de polarização e pressão por tomar um lado entre o lulismo e o bolsonarismo.
Uma fonte do alto escalão do PT gaúcho, ouvida sob anonimato, disse desconhecer articulações com pedetistas locais para que venham a público apoiar Lula.