Faltavam 15 minutos para a meia-noite de domingo e Manuela D'Ávila estava em casa, em Porto Alegre, quando o telefone tocou. Na voz da presidente nacional do PC do B, Luciana Santos, ela ouviu a garantia que tanto esperava do PT: fosse Luiz Inácio Lula da Silva ou Fernando Haddad o candidato do partido à Presidência, a vaga de vice seria reservada à deputada estadual gaúcha. Manuela, então, avalizou o acordo e abriu mão da disputa ao Planalto.
O telefonema consertou uma estratégia errática concebida por Lula de dentro da cadeia em Curitiba e que, na sexta-feira, havia ofendido Manuela. Pelos planos do petista, Manuela ficaria em uma espécie de suplência na chapa encabeçada por ele e com Haddad de vice. Se o registro do ex-presidente fosse indeferido pela Justiça Eleitoral, Haddad seria promovido a titular da candidatura e Manuela assumiria a candidatura a vice. Caso Lula conseguisse concorrer, Haddad continuaria vice, restando à comunista um limbo eleitoral.
— Essa primeira proposta desagradou bastante — admite um interlocutor de Manuela.
Para turvar ainda mais o ambiente entre PT e PC do B, antes de sondar Manuela, os emissários de Lula haviam convidado Ciro Gomes (PDT) para vice. A proposta foi rechaçada de imediato pelo presidente do partido, Carlos Lupi, e deixou na deputada a desagradável sensação de que era a terceira alternativa para completar a chapa petista.
O sábado (4) começou com a convenção estadual do PC do B, em Porto Alegre, na qual Manuela reafirmou a candidatura à Presidência e lançou Abigail Pereira ao governo do Estado. Quase ao mesmo tempo, em São Paulo, o PT oficializava a indicação de Lula, sem nomear um vice. Haddad seguia como o preferido do ex-presidente e vencia resistências dentro do partido, após o ex-governador da Bahia, Jaques Wagner, declinar do posto ao anunciar que disputaria o Senado.
Lideranças petistas chegaram a pensar em não indicar um vice antes da meia-noite de domingo, prazo-limite determinado pela Justiça Eleitoral. A ideia era ganhar tempo e divulgar o nome somente no ato de registro das candidaturas, em 15 de agosto. Ao final, acabou pesando o entendimento de que o PT seria o único partido a descumprir a legislação, o que dificilmente seria tolerado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Ainda na noite de sábado, PT e PC do B voltaram a se reunir. Havia uma tensão no ar. Enquanto a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, falava macio, os dirigentes comunistas relatavam as ações do pretenso aliado nos Estados. Em Amazonas, o PT desmanchava a aliança com o PC do B e se coligava com o PSB, retirando a legenda para a candidatura à reeleição da senadora Vanessa Grazziotin, uma das mais ferozes defensoras de Dilma Rousseff no impeachment. No Acre, rompeu a parceria na eleição para deputado federal.
— Foi uma chantagem desgraçada — conta uma testemunha da reunião.
A reunião acabou sem acerto e o PC do B divulgou nota afirmando que "os debates persistirão até o último momento em torno da unidade". No domingo, a direção do PT acabou com o suspense e divulgou uma carta em que Lula escolhia Haddad como preferido para companheiro de chapa. O documento, porém, deixava em aberto a possibilidade de Manuela vir a ocupar o posto. Era a senha para retomar as negociações com os comunistas.
Dirigentes dos dois partidos voltaram a conversar, mas não houve consenso. De Porto Alegre, Manuela acompanhava as conversas pelo telefone e não aceitava a "suplência". O PT voltou à carga e ameaçou desfazer também a coligação proporcional no Rio, um risco para a candidatura a deputada federal de Jandira Feghali, outra aliada fiel no impeachment. Furiosa com a postura do PT, a direção do PC do B não abria mão da candidatura de Manuela D'Ávila. Para mostrar que não blefava, indicou o também comunista Adilson Araújo como candidato a vice. Mais tarde, como ameaça retórica, cogitou até mesmo se aliar a Ciro Gomes (PDT).
O acerto só ocorreu às 23h45min, quando Gleisi disse que Manuela seria vice de qualquer jeito, independentemente de quem fosse o candidato do PT. Às 23h59min, faltando poucos segundos para o prazo fatal, o Twitter oficial de Lula anunciou Haddad como vice. Em entrevista coletiva, logo em seguida, Gleisi confirmou a aliança com o PC do B. A justificativa é que Haddad precisa "vocalizar" a plataforma de Lula até que haja uma palavra final da Justiça sobre a candidatura do ex-presidente. Até lá, Manuela irá viajar o país defendendo a chapa Lula-Haddad. Nesta terça-feira (7), o vice e a suplente concedem entrevista coletiva em São Paulo.