Em uma tentativa de demonstrar força em torno do nome do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a comissão executiva nacional do PT reafirmou, nesta quinta-feira (25), em São Paulo, a pré-candidatura do líder petista à Presidência da República. O anúncio foi feito um dia depois da manutenção da condenação de Lula pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), em Porto Alegre, e voltou a elevar o tom do debate — o ato foi marcado por expressões como "rebelião", "desobediência civil" e "playboyzada fascista".
Embora as possibilidades de recurso tenham se reduzido com o placar do julgamento (três a zero contra o ex-chefe de Estado), a cúpula do PT voltou a afirmar que não tem "plano B" e que lutará pelo direto de Lula concorrer.
— Estamos aqui para reafirmar a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva. Ele será o nosso candidato — disse a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann.
Sorridente, mas com o semblante cansado e a voz mais rouca do que o habitual, Lula foi recebido aos gritos de "guerreiro do povo brasileiro". Foi o último a falar.
— Hoje é um dia especial dentre tantos dias especiais que eu já vivi. Hoje é um dia especial e que me dá orgulho, não orgulho porque ontem (quarta-feira) teve uma sentença de condenação de três a zero. Mas orgulho porque durante tantos anos de perseguição os três juízes se pronunciaram durante tantas e tantas horas e meu advogado só teve 15 minutos de defesa e a imprensa hoje não pode falar de corrupção, porque eu não cometi nenhum crime, e eles sabem que condenaram um inocente — lamentou.
Na sequência, o petista disse ter compreendido, na quarta-feira (24), "o que é um cartel":
— Construíram um cartel para dar uma sentença unânime para evitar o tal embargo infringente. Só pode ter sido isso. Formaram um cartel para tomar uma decisão para tentar apressar a possibilidade de evitar que o PT tenha o Lula como candidato a presidente da República. Não consigo encontrar outra explicação.
Mais de uma vez, Lula defendeu sua inocência e atribuiu o resultado ao desejo das elites de tirar o PT do poder. Ele disse acreditar ter conseguido "passar para a sociedade a questão política que está em jogo":
— Eles sabem que perderam na consciência do povo brasileiro. É por isso que estou alegre... alegre não é a palavra correta. Estou tranquilo, com a consciência tranquila. É por isso que tenho a coragem de olhar na cara dos meus filhos, dos meus netos, de vocês. A única coisa que posso oferecer é minha inocência, e lutar para que ela venha à tona.
Em mais um desabafo, o ex-presidente afirmou ser de "uma geração em que a honra vale muito". Contou que já esperava o placar de três a zero e que, por isso, não sofreu "tanto".
— Obviamente que não estou feliz, mas duvido que algum deles esteja com a consciência tranquila como estou. Eu acredito na Justiça. Vamos recorrer no que for possível e vamos batalhar até o final — garantiu.
Eles sabem que perderam na consciência do povo brasileiro. É por isso que estou alegre... alegre não é a palavra correta. Estou tranquilo, com a consciência tranquila.
Quase perdendo a voz, o petista reconheceu que "não é uma coisa simples andar na rua e alguém gritar que você é ladrão".
— Isso é que mais coloca minha honra à flor da pele. Aceito até que me chamem de corintiano, mas não posso aceitar que um canalha qualquer me chame de ladrão — falou, arrancando aplausos.
Quanto à decisão do TRF4, o petista afirmou que não respeitará o resultado:
— Esse ser humano simpático que está falando para vocês não tem nenhuma razão para respeitar a decisão de ontem (quarta-feira). Quando as pessoas se comportam como juízes, sempre respeitei. Mas quando se comportam como dirigentes de partido político dizendo inverdades, realmente não posso respeitar.
Com viagem prevista para Etiópia na madrugada desta sexta-feira (26), Lula ainda alfinetou os opositores:
— Se eu fosse para a França, meus adversários diriam: Lula está indo para a França para ficar exilado. Mas o preconceito é tão grande que estou indo para a Etiópia e eles nem cogitam isso. O preconceito é uma desgraça, uma doença, e eu resolvi enfrentá-lo.
Sobre a candidatura ao Planalto, cuja confirmação oficial ainda dependerá de longa batalha jurídica, Lula foi taxativo:
— Não estou querendo ser candidato para me proteger. A minha proteção é a minha inocência. Espero que essa candidatura não dependa do Lula. Só tem sentido se vocês forem capazes de fazê-la mesmo que aconteça uma coisa indesejável. É colocar o povo brasileiro em movimento.
Ainda sobre a disputa à sucessão de Michel Temer (PMDB), Lula concluiu:
— Sem nenhuma arrogância: eu quero ser candidato para ganhar as eleições e para governar esse país. Por isso, companheiros, nada de baixar a cabeça.
"Playboyzada fascista"
Realizado na sede da Central Única dos Trabalhadores (CUT), o encontro teve a participação de correligionários de todo o país, inclusive do Rio Grande do Sul.Entre os gaúchos presentes estavam os deputados federais Maria do Rosário, Henrique Fontana e Paulo Pimenta, a deputada estadual Stela Farias, o presidente estadual da sigla, Pepe Vargas, e o ex-ministro e pré-candidato ao governo do Estado, Miguel Rossetto, além da sucessora de Lula no Planalto, Dilma Rousseff.
— O presidente Lula tem de utilizar todos os instrumentos que a democracia lhe dá. Não temos plano B, porque sabemos que ele é inocente. Isso não significa que não saibamos que a luta decisiva, mobilizadora, é a que se trava nas ruas — declarou Dilma.
Ao falar, o ex-ministro da Justiça, Eugênio Aragão, cujo escritório faz assessoria jurídica para o PT. O jurista reconheceu que "as próximas semanas serão cruciais" e falou sobre a estratégia daqui para frente.
— Julgados os embargos, que muito provavelmente serão rejeitados, então é a hora do recurso especial. O problema todo, nesse momento, é em relação à súmula do Tribunal Regional Federal que determina a prisão tão logo se encerre a segunda instância, portanto, depois do julgamento dos embargos. Há vários mecanismos agora para agir em relação a isso — afirmou Aragão.
Na avaliação do advogado, o TRF4 "não se portou como um órgão equidistante e imparcial". Os desembargadores da 8ª Turma, segundo Aragão, assumiram "as dores do juiz Sergio Moro".
— É uma forma tão violenta de ilegalidade que acredito que tenhamos boas chances de discutir isso — concluiu o jurista.
Em discurso duro, o deputado Pimenta falou em nome dos parlamentares presentes e classificou o julgamento como "uma farsa". Depois dele, o senador Lindberg Farias voltou a ressaltar que o partido está preparado "para lutar nas ruas desse país" e afirmou que vê "um novo momento" surgindo:
— O que está havendo é o renascimento do PT e da esquerda brasileira, porque na verdade o golpe deles fracassou.
Eles jogaram fogo no país. Não cabe a nós o comportamento de bombeiros. Fascismo se enfrenta nas ruas.
WADIH DAMOUS
deputado federal (PT-RJ)
Ao se pronunciar, o coordenador da Central de Movimentos Populares (CMP) em São Paulo, Raimundo Bonfim, também elevou o tom, repetindo a postura assumida por líderes petistas nos últimos dias.
— Não há outro caminho a não ser a rebelião e a desobediência civil — declarou.
Na mesma linha, João Pedro Stédile, do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), avisou que a entidade impedirá "de todo jeito que Lula seja preso".
Aplaudido pelos companheiros departido, o deputado federal Wadih Damous (PT-RJ), ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio de Janeiro (OAB-RJ), chamou a força-tarefa da Operação Lava-Jato de "playboyzada fascista".
— Eles jogaram fogo no país. Não cabe a nós o comportamento de bombeiros. Fascismo se enfrenta nas ruas — destacou Damous.
O presidente da CUT, Vagner Freitas, ampliou as ameaças:
— Estão achando que vamos ficar de braços cruzados? Evidentemente que não. Trouxeram ainda mais a insegurança jurídica e institucional para o Brasil. Vamos enfrentar nas ruas e desautorizar o TRF4.
Freitas disse que o presidente Michel Temer "é uma minhoca" e acusou a "burguesia brasileira" de chancelar o "golpe". Prometeu fazer "a maior greve da história" no próximo dia 19.
— É mentira que estamos fazendo rebelião contra o Estado de Direito. Pelo contrário. Estamos fazendo uma rebelião para salvar o Estado de Direito — concluiu Freitas.