Agradar gregos e troianos na reta final de um processo de impeachment, de alta complexidade e de ferrenhos interesses políticos, foi a tarefa imposta pela lei ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski. Alçado ao comando das sessões derradeiras no Senado, o ministro foi sóbrio para controlar os ânimos dos parlamentares.
Requisitado a decidir sobre oito questões de ordem apresentadas por aliados da presidente afastada Dilma Rousseff, o magistrado posicionou-se sem qualquer decisão surpreendente, para um lado ou outro, o que poderia desencadear um processo de radicalização. Assim, Lewandowski andou o tempo inteiro na linha da moderação.
– O comportamento e condução foram sem reparos. Infelizmente, as questões de ordem tinham o intuito de retardar no início de sessão. O presidente Lewandowski, com parcimônia, equilíbrio e firmeza, conseguiu superar essa etapa – elogiou o senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB).
Leia mais
PLACAR DO IMPEACHMENT: como votou cada um dos senadores
"Tudo conforme o esperado", diz Temer sobre a votação do impeachment
Dilma deve ficar oito meses fora do país, diz jornal
Ao responder as questões de ordem, a maioria delas combinando leis, Constituição e regimento do Senado, Lewandowski transitou em temas complexos, mas se desvencilhou sem gerar apupos dos aliados de Dilma. Todos os pedidos relevantes, que incluíam suspensão do processo de impeachment, foram rejeitados. Atrás do ministro estava Fabiane Duarte, secretária-geral da Presidência do STF, sua assessora de confiança que lhe prestava auxílio em momentos de dúvidas.
– Com muito conhecimento de causa, o senhor preside a sessão – disse o senador Ronaldo Caiado (DEM-GO).
Para aliados do ministro, a postura ponderada e as negativas diante das questões de ordem contrapuseram comentários rotineiros de que Lewandowski, indicado por Luiz Inácio Lula da Silva ao STF, seria petista, já que ele e o ex-presidente viveram em São Bernardo do Campo (SP).
Disposto a cumprir os horários acordados para a sessão, o magistrado deixou o apartamento funcional onde mora antes das 8h. Às 9h, estava no plenário do Senado. Ao longo do dia, foi econômico nas palavras e procurou ser objetivo nas análises. No início da sessão, pediu que os parlamentares atuassem com “coragem e independência”. E manteve posição de encerrar a votação ainda até a madrugada, diante da possibilidade de deixar o arremate para a manhã ou tarde de quarta-feira, o que era defendido por petistas.
Na primeira pausa dos trabalhos, por volta das 13h, o ministro seguiu de carro até o STF e almoçou em seu gabinete, com vista para a Praça dos Três Poderes. Por volta das 14h10min, reabriu a sessão do impeachment. Com a cadeira voltada para a tribuna, acompanhou a maratona de discursos. Um dos primeiros a falar foi o gaúcho Paulo Paim (PT), que elogiou o ministro.
– Por ter uma postura séria e respeitosa, ele garante uma condução tranquila – disse Paim.
Para senadores e auxiliares do magistrado, o comando da sessão pelo presidente do STF, chefe de um dos três poderes, ajudou a amenizar o clima no plenário, que não teve episódios de falas rudes endereçadas à Mesa, comuns quando Renan Calheiros (PMDB-AL) está à frente dos trabalhos.
– Está tranquilo. Tem muito julgamento no Supremo que dá mais trabalho para garantir a ordem do que aqui – disse um auxiliar do ministro.
Na sessão comandada pelo presidente do STF até a madrugada desta quarta-feira, Dilma Rousseff se tornou ré. O Senado decidiu, por 59 votos a favor e 21 contra, pela aceitação do parecer que leva a petista ao julgamento derradeiro por crime de responsabilidade, que pode cassar o seu mandato, previsto para começar no fim de agosto. A votação foi dividida em quatro partes, uma para cada crime imputado a Dilma – três decretos de suplementação orçamentária sem autorização do Congresso e a suposta operação de crédito com o Banco do Brasil no Plano Safra.
Os senadores decidiram que Dilma será ré pelos quatro crimes. Além da votação do texto principal, os senadores aprovaram os destaques referentes às pedaladas fiscais e ao crédito suplementar de R$ 29 bilhões, ambos por 58 votos a 22. O último destaque, sobre a edição do decreto de R$ 600 bilhões, foi mantido por 59 votos a 21. A acusação foi intimada a oferecer em um prazo de até 48 horas o libelo acusatório e o rol de testemunhas.