Dez pessoas, físicas e jurídicas, entre técnicos, empresários, empresas e servidores públicos municipais, foram indiciadas pela Polícia Civil como suspeitas de crime ambiental na instalação da estrutura do Mega Domo, em Canela, na Serra. A área fica próxima à rotatória entre as rodovias RS-466 e RS-235. O domo tinha 30 metros de altura e foi inflado em outubro de 2022, quando sediou o espetáculo Uma Viagem de Natal na temporada 2022 e 2023 e foi desinflado em outubro deste ano.
O nome dos indiciados não foi revelado. De acordo com a Polícia Civil, o inquérito foi instaurado após o recebimento de documentos encaminhados pela Polícia Ambiental (Patram), que identificou prática de crime ambiental após a instalação do domo em uma área de preservação permanente e onde existe um córrego. Durante a investigação, foram constatadas outras falhas, segundo o delegado Vladimir Medeiros, responsável pela apuração. No entendimento da polícia, laudos ambientais foram apresentados sem conformidade e foram aprovados pelo órgão municipal, que deveria ter fiscalizado o empreendimento.
— Existe uma quantidade bastante expressiva de crimes ambientais observados nesse caso. Entendemos que profissionais da área de licenciamento ambiental contratados teriam colocado informações inconsistentes em laudos, que gera a prática de crime. Tem também, por parte de servidor público, a omissão pela fiscalização. Por isso, a construção e abertura do empreendimento sem as devidas licenças não estava de acordo, além dos fatos relacionados às águas naturais daquele terreno — explica.
Ainda conforme Medeiros, devido ao teor técnico do inquérito, a investigação contou com o apoio de uma policial civil de Porto Alegre especializada em matéria ambiental para acompanhar as investigações por 30 dias. Ela ouviu também dezenas de investigados e testemunhas, inclusive empresários responsáveis pelo empreendimento, técnicos da área de licenciamento e servidores públicos.
— Foi uma sucessão de erros que levou a esse indiciamento — resume Medeiros.
O inquérito foi remetido ao Ministério Público e não foi solicitada a prisão dos investigados, uma vez que os crimes previstos, por lei, não autorizam prisão preventiva.
O Mega Domo, uma atração de Natal inédita na América Latina, se tornou um imbróglio judicial. Em março deste ano, a Justiça de Canela acatou um pedido do Ministério Público (MP) e determinou que o Mega Domo fosse desmontado em um prazo de 30 dias - período que foi retirado pela Judiciário em abril.
De acordo com a ação civil pública, a estrutura estaria sobre área de preservação permanente sem licenciamento ambiental e sem apresentar soluções de mobilidade, uma vez que o toldo estava entre as rodovias RS-466 e RS-235. A determinação também pedia que a atração do Mega Domo deveria parar de lançar qualquer tipo de efluente não tratado por sistema de água.
Em outubro deste ano, por decisão dos responsáveis, o domo foi desinflado. Na época, a justificativa foi que a estrutura passaria por limpeza e seria novamente inflada.
O que dizem os envolvidos:
O diretor artístico Edson Erdmann, sócio-proprietário da produtora Histórias Incríveis (HI), responsável pela estrutura do Mega Domo, informou que não teve acesso às informações do inquérito e que emitirá um posicionamento oficial após conhecer o teor das investigações. Por mensagem de texto, ele disse que está tranquilo e consciente que não fez nada de errado.
Os advogados do Hotel Sky, proprietário do terreno, informaram que não conhecem o teor do inquérito e não irão se manifestar.
A prefeitura de Canela se manifestou por meio de nota. Informou que teve acesso ao teor do inquérito e entende que há controvérsia de entendimento entre os laudos técnicos elaborados pela Polícia Ambiental e os laudos da licença prévia existente.
Destacou que a emissão de licenças ambientais é uma atividade rotineira do secretário de Meio Ambiente, mas que essas são sempre embasadas em pareceres técnicos e que não houve qualquer prática de favorecimento ao empreendimento.
Leia o posicionamento da prefeitura na íntegra:
"A Administração Municipal de Canela vem por meio desta nota se manifestar em relação à notícia de indiciamento de servidores públicos no âmbito do Inquérito do Mega Domo. A Administração teve acesso ao inteiro teor do inquérito, o qual revelou uma controvérsia de entendimento entre os laudos técnicos elaborados pela Patram/Fepam e os laudos técnicos da licença prévia existente. Observamos que o inquérito policial não emitiu juízo de mérito, dedicando-se a coletar todas as informações necessárias para encaminhar ao judiciário com o indiciamento de todos os envolvidos.
É importante ressaltar que apenas um indiciamento envolve a Prefeitura Municipal, que supostamente teria emitido licença em desconformidade com as normas ambientais. No entanto, o relatório final não esclareceu qual norma ambiental teria sido violada nessa situação. Esclarecemos que a emissão de licenças ambientais é uma atividade rotineira do Secretário de Meio Ambiente, mas que essas são sempre embasadas em pareceres técnicos. É natural que, eventualmente, uma licença seja contestada, como foi o caso presente. No entanto, estamos confiantes no trabalho realizado e que todas as decisões foram tomadas estritamente baseadas nos laudos e pareceres técnicos, de forma impessoal e dentro da legalidade.
Salienta-se que não houve, em nenhum momento, qualquer menção ou suspeita de favorecimento a qualquer empresa envolvida, pelo que, oportunamente, reforçamos nosso compromisso com a transparência e a legalidade em todas as nossas ações. Por último, declaramos que respeitamos profundamente a autoridade policial e a decisão de indiciar, reconhecendo o papel fundamental desempenhado pelas instituições responsáveis pela aplicação da lei. Acreditamos firmemente, no entanto, que compete ao judiciário a prerrogativa de realizar o juízo de mérito sobre a controvérsia apresentada no curso desta investigação, o que será demonstrado caso sejamos chamados para tal”.
O que era o Mega Domo
O Mega Domo foi lançado no final de 2022, com a apresentação do espetáculo Viagem de Natal. A temporada durou entre 28 de outubro a 8 de janeiro.
O espaço instalado tinha 5 mil metros quadrados, altura de praticamente um prédio de 10 andares e trouxe 2 mil lugares para que visitantes acompanhassem o espetáculo, que tinha duração de cerca de 75 minutos.
O espetáculo contava a história de um fotógrafo que, ao passar o Natal longe da família, seguia o conselho da mãe e tentava realizar o sonho de fotografar o Papai Noel.