Colchões espalhados, cozinha improvisada e móveis fora dos seus lugares habituais: até esta terça-feira (28), essa é a realidade de 47 pessoas que estão abrigadas em dois ginásios de Gramado, desde que áreas da cidade foram interditadas pelo surgimento de rachaduras no solo, provocando risco de desabamento. Entre elas, no bairro Altos da Viação Férrea, está uma família de 30 pessoas, que antes vivia em uma única residência próxima ao abrigo. A angústia é para saber para onde vão.
Com os pais e irmãos, a camareira Maria Cristina de Melo Pires, 36 anos, chegou ao bairro com apenas sete anos. Eles são naturais de Cazuza Ferreira, no interior de São Francisco de Paula. Desde então, viviam na mesma residência, mesmo após o crescimento da família com filhos, sobrinhos e depois os namorados ou namoradas deles. Quando a reportagem esteve no ginásio, alguns dos membros estavam fora, trabalhando, enquanto outros, como Maria Cristina, cuidavam do espaço e das crianças.
Após a chuva do dia 18, a família precisou mudar-se ao ginásio, uma vez que a residência ficou em perigo por pedras que caíram da encosta no bairro Altos da Viação Férrea. Maria Cristina conta que a família não poderá mais voltar para a antiga casa. Desde então, a prefeitura de Gramado auxilia o grupo com o fornecimento de alimentação e outros itens.
— A resposta (da prefeitura) é que vamos ficar mais seis meses no ginásio — diz a camareira.
De acordo com prefeitura e Ministério Público (MP), uma solução definitiva, como a construção de uma nova moradia em outro ponto da cidade, é analisada. Conforme os órgãos, o imóvel da família está em uma área de alto risco de deslizamento. A prefeitura informa que as pessoas devem permanecer de forma temporária no ginásio até que um local definitivo seja disponibilizado.
A família quer manter-se unida, como sempre foi. Antes, a residência era dividida entre a peça de Maria Cristina, da mãe e de um irmão. Com a espera pela definição, Maria Cristina relata que os familiares tentam adaptar-se ao abrigo. Além dos adultos, há também crianças e os bichos de estimação.
— É complicado. Aqui tu não tem privacidade, né? Mas, fazer o quê? — conta Maria Cristina.
Antes da situação com a chuva, a família tentou até procurar um novo espaço, uma vez que o imóvel tinha sido interditado em 2020 pela prefeitura. A administração pública tentou, inicialmente, disponibilizar quatro aluguéis sociais para acomodar a todos. Mas, Maria Cristina lamenta que proprietários não quiseram fechar negócio pelo número de crianças e pets que a família tem.
— Não somos obrigados a abandonar nossos pets e nossas crianças, se algum proprietário não quer alugar — afirma.
Entre a espera e um novo imóvel
No ginásio da Escola Senador Salgado Filho, cinco famílias usavam o espaço como abrigo. Como relata Elidiana Correia Duarte de Campos, 35, muitos que estavam ali conseguiram alugar residências em Canela ou no bairro Várzea Grande, o que reduziu o número de abrigados.
Elidiana e o marido Jefferson de Campos, 34, tomaram a mesma decisão. Nos próximos dias, deixam o ginásio e passam a morar em uma nova residência em Gramado, junto com os dois filhos e o pet da família, um cão da raça dachshund (o popular salsicha). Mesmo que seja por aluguel, a pintora relata que tem medo de voltar a morar na antiga casa no bairro Piratini, que pertencia à mãe de Jefferson.
— Eu acho que não voltamos pelo temor das rachaduras — lamenta Elidiana.
A ideia é diferente do carioca Marcos Aurélio, 38, que mora há 12 anos em Gramado. Se o relatório de geólogos contratados pela prefeitura garantir segurança, o autônomo quer retornar para a casa alugada dele no bairro Três Pinheiros. Ele já morava lá há um ano e sete meses. A previsão é de que o estudo seja entregue nesta quarta-feira (29).
— Voltaria, sim. Nada contra estar no alojamento, é seguro, estão cuidando bem, a prefeitura e a Defesa Civil são atenciosos com a gente. Mas nós queremos estar na nossa casa, até porque ali se constrói as nossas coisas — observa.