Um grupo com cerca de 15 moradores da Rua Prefeito Nelson Dinnebier, em Gramado, se organiza para investigar, por conta própria, os motivos que causaram as aberturas de fendas no solo do bairro Piratini. Eles devem assinar o contrato com a empresa que irá realizar a perícia particular nesta semana. Desde o dia 19, 23 residências do bairro estão interditadas devido a rachaduras e deslizamento de terras que surgiram após a tempestade que atingiu a cidade. Três veículos foram soterrados e tiveram perda total no dia 18.
A suspeita dos moradores é de que os danos no solo não sejam causados apenas pela ação da natureza e estejam também relacionados com a ação do homem. Na rua de cima, distante cerca de 100 metros das casas e após a concentração de vegetação, uma estrada estaria sendo aberta pela prefeitura. A nova rua faz divisa com o Loteamento Alphaville, área residencial que teve o muro danificado pela movimentação de terra.
O advogado Aldairton Carvalho representa o grupo e confirmou que a empresa Russell Bedford, de Porto Alegre, foi consultada e tem condições de realizar a perícia que pode associar a movimentação do solo ao uso de dinamites utilizadas para na obra. Na noite de sexta-feira (24), o grupo de moradores aprovou a contratação. A utilização de dinamites para abertura de solo, que dá viabilidade para construir subsolos e estacionamentos, por exemplo, é citada por Carvalho como um dos motivos que devem ser investigados.
— A falha em si, inicialmente, pode ter sido ocasionada por intervenção humana. Vamos contratar uma perícia para isso. Falamos a título de suposição, não é uma afirmação, mas diante do laudo podemos mover uma ação contra o município — explicou.
Ofício no MP
Na sexta-feira (25), o empresário e morador do bairro Piratini André Wazlawick encaminhou ao Ministério Público de Gramado um ofício onde formaliza a "denúncia/comunicado de danos ambientais, possivelmente 'agravados' em razão de obra pública" realizada pela prefeitura de Gramado. O documento também informa sobre a contratação da empresa que pretende identificar as causas das rachaduras.
Além disso, o documento sugere que o MP solicite ao município as informações do projeto da obra que estaria sendo realizado na vizinhança. O ofício inclui fotos aéreas do bairro e uma imagem de um suposto local onde as dinamites estariam sendo utilizadas.
O promotor Max Guazelli confirmou que recebeu a documentação de um casal de moradores, acompanhados do advogado, mas que a situação específica da Rua Nelson Dinnebier ainda não foi objeto de análise e despacho.
Por meio da assessoria de imprensa, o Ministério Público informou que na sexta-feira foi realizado um "despacho em outra notícia mais ampla, solicitando ao município o encaminhamento dos relatórios preliminares dos geólogos e técnicos, visando à elaboração de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC)". O prazo de 72 horas dado para as respostas encerra nesta segunda.
Depois de ouvir as demandas dos moradores evacuados, repassar situações aos secretários municipais e verificar que as famílias estão bem instaladas nos ginásios, Guazelli disse que irá elaborar um relatório e seguir acompanhando o caso.
Prefeitura rebate
Em coletiva de imprensa na sexta-feira (24), o prefeito Nestor Tissot afirmou entender que as chuvas dos últimos dias foram as responsáveis pelos deslizamentos e aparecimento de rachaduras, e descartou a relação com detonações. Mesmo assim, a prefeitura suspendeu as licenças das obras que usam explosões próximas ao bairro Piratini e Três Pinheiros até ter certeza se elas podem ter relação com os deslizamentos e rachaduras.
— Pelos estudos que fizeram até agora, mesmo que não são definitivos, não apontam (relação) — disse o prefeito.
No final da tarde, a procuradoria geral de Gramado publicou uma nota que diz que as informações divulgadas pelo grupo de moradores são irresponsáveis e não possuem capacidade técnica.
A nota não menciona diretamente o advogado que representa os moradores e é assinada pelo prefeito Nestor Tissot e pela procuradora-geral Mariana Melara Reis. Confira na íntegra:
"O Município de Gramado tomou conhecimento de uma “Nota à imprensa” distribuída por suposto advogado que afirma, embora não comprove, representar os moradores do bairro Piratini. Na referida nota, é contestado de forma irresponsável as informações oficiais e atestado, sem a devida capacidade técnica, e tampouco apresentando os laudos comprobatórios, situações sobre questões geológicas da cidade.
A advocacia é uma profissão nobre e aqueles que possuem inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) têm o dever legal e moral de atuar de forma ética e responsável. No caso em apreço, o suposto advogado não apresenta procuração para falar em nome da comunidade do bairro Piratini e a sua prática assemelha-se à captação de clientela, o que é proibido pelo estatuto da advocacia.
Deste modo, o Município de Gramado repudia tal nota e informa que notificará o suposto advogado para que comprove suas informações. Ainda, a Administração Municipal encaminhará a documentação que possui à OAB para que tome as devidas providências, inclusive sobre eventual infração ética disciplinar praticada pelo suposto advogado."