Uma audiência pública na manhã desta sexta-feira (22) debateu possíveis parcerias público-privadas (PPPs) na área da educação em Caxias do Sul. O encontro, sediado na Câmara de Vereadores, expôs que a prefeitura traça o plano de trabalhar junto à iniciativa privada na construção e manutenção das escolas de Ensino Fundamental e de Educação Infantil. Essa ainda é uma possibilidade, que passará por estudos de viabilidade, mas o município parece convicto de que é a forma mais ágil para garantir melhorias nos prédios e ampliar o número de vagas, principalmente, para crianças de zero a três anos.
A secretária da Educação, Sandra Negrini, destacou que há uma grande demanda nas escolas por Planos de Prevenção e Proteção Contra Incêndios (PPCI) e de adequação às normas da Vigilância Sanitária. Apontou ainda que existem prédios antigos que passaram por ampliações que perderam a qualidade com o passar do tempo. Outro aspecto, diz ela, é que a arquitetura das escolas hoje é vista como um elemento que pode facilitar a aprendizagem, mas o padrão atual está defasado.
Para argumentar a favor das parcerias com a inciativa privada, disse que existe muita dificuldade de tramitação das licitações por causa da burocracia no setor público — mencionou como exemplo a Escola Laurindo Formolo, que tem recursos empenhados para a construção de um novo prédio, mas a Secretaria da Educação enfrenta dificuldades no processo de contratação de emprenteira para a obra.
Sandra pontuou também que atualmente a pasta administra quase mil contratos e 107 prédios, o que poderia diminuir, se o projeto de parcerias público privadas prosperar, facilitando a fiscalização. Além disso, esclareceu que a prefeitura já compra serviços em escolas particulares para suprir a demanda na Educação Infantil, mas que um novo modelo é necessário. Tudo isso para que sejam cumpridas as metas acertadas em um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público (MP), firmado em 2012. O acordo prevê que metade das crianças, de zero a três anos, estejam matriculadas e, 100% das de quatro e cinco anos.
A Secretaria da Educação diz que já atende totalmente essa última fixa etária, mas Sandra ponderou que, com a pandemia, é possível que uma parte não tenha sido inscrita nas escolas.
— O que nós não abrimos mão é da questão pedagógica. Aonde que estão as questões mais fortes para a gente realmente dar o tom e garantir aquilo que a legislação prevê, tanto dos planos nacionais, LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação) e todas outras legislações, diretrizes curriculares, é por meio de uma proposta pedagógica que seja emancipatória e realmente atenda as crianças da melhor forma possível.
Justificativa é oferecer serviços mais eficientes
O secretário de Gestão e Finanças, Maurício Batista, salientou que a prefeitura ainda irá analisar se a parceria com a iniciativa privada é, de fato, a mais adequada às escolas. Porém, entende que esse modelo traz mais eficiência de uma maneira geral.
— É uma forma de anteciparmos investimento, sem endividar o município.
Os secretários municipais evidenciaram ainda que, por meio de convênios com entidades que administram escolas de Educação Infantil do município e da compra de vagas na rede privada, o município já gasta R$ 70 milhões anuais e, mesmo assim, não dá conta de atender a toda a demanda existente, com uma fila de mais de três mil crianças à espera de vagas.
A audiência teve ainda a participação virtual de Adalberto Vascuncellos, especialista em Regulação de Serviços Públicos de Infraestrutura e Parcerias público-privadas, que foi secretário do Programa de Parceiras de Investimentos do governo do ex-presidente Michel Temer. Vasconcellos defendeu que o poder público se beneficia com a redução de contratos e afirmou que o custo para a manutenção dos serviços tende a ser menor.
— O (setor) privado vai tanto fazer a obra, como a manutenção, a limpeza e todas as prestações de serviço correlatas para você ofertar aos usuários, que são os estudantes, um serviço adequado. Então, essa é a grande vantagem, você vai ter só um contrato como uma pessoa, esse contrato vai ficar em um custo menor — disse, ao justificar que esse contrato único gera incentivos para a redução de despesas para o município.
Proposta encontra apoio e resistências
A audiência pública foi realizada pela Comissão Temporária Especial de Acompanhamento de Projetos de Concessões e Parcerias público-privadas. A maioria dos vereadores que se manifestaram foi favorável à ideia. Reiteradamente, o vereador Adriano Bressan (PTB), que preside a comissão, fez questão de dizer que não se trata da privatização das educação, já que o poder público continuaria envolvido no processo.
— A gente sabe que o assunto é polêmico quando se fala em PPPs, porque parece que seriam privatizações. Não é nada disso e tenho certeza que essas reuniões e esclarecimentos dentro de plenário vêm para que a população entenda que as Parcerias público-privadas são gerenciadas pelo poder público. A parceria vem através da doação de um terreno para que possa ser construída uma escola e o poder público poder fazer esse gerenciamento da educação.
A proposta, no entanto, também deve enfrentar alguma resistência. O vereador Lucas Caregnato (PT), por exemplo, levantou questionamentos sobre o tema. Entre eles, o motivo da preferência por este modelo em vez da ampliação dos convênios com entidades, ao que a secretária da Educação respondeu que existe uma limitação de organizações interessadas no serviço.
O parlamentar questionou ainda se os modelos arquitetônicos mais modernos só poderiam ser feitos com investimentos da iniciativa privada. O petista pontuou que existem exemplos de parcerias no país que não deram certo.
— Sabemos da dificuldade que a Secretaria tem, por questão de recursos humanos, em fiscalizar os R$ 70 milhões que nós dispendemos anualmente para a iniciativa privada, seja para as filantrópicas conveniadas ou para as vagas compradas. A minha pergunta é: como nós vamos fiscalizar as PPPs da Educação Infantil propostas e as que se apresentaram aqui do Ensino Fundamental, que foi uma surpresa?
Quem também se posicionou contrária foi a professora Karina do Santos, diretora do Sindicato dos Servidores Municipais (Sindiserv). Para ela, o modelo cria deficiências que podem favorecer a corrupção e dificultar a melhoria do serviço nos casos em que ele não atender a alguns termos contratuais. Além disso, falou em falta de incentivo à formação continuada e desinteresse na maior especialização dos profissionais, porque o custo para mantê-los empregados aumenta.
— Eu acho que quando o Estado terceiriza a suas tarefas, ele perde o poder de controle e de gestão.
A diretora do Sindiserv questionou ainda a priorização que tem sido dada aos investimentos na Educação. Lembrou que um recurso de R$ 18 milhões que seriam para a Educação foram alocados no orçamento de compra de maquinários e indagou o investimento de R$ 9 milhões em compra de uniformes, mesmo que a infraestrutura tenha sido apontada como uma necessidade nas justificativas para as Parcerias público privadas.