Em um documento com três páginas, a Comissão de Diretores de Caxias do Sul, que representa 83 escolas municipais, elenca 15 itens que considera demandas prioritárias e outro rol em que questiona 17 ações da administração pública. A carta foi protocolada na manhã desta segunda-feira (18), na Secretaria Municipal de Educação (Smed) e na Comissão de Saúde e Meio Ambiente da Câmara de Vereadores e encaminhada ao prefeito Adiló Didomenico.
A presidente da comissão de diretores, Ângela Honorato, diz que o documento foi elaborado a partir de uma assembleia presencial realizada no dia 7 deste mês, com a participação de 40 diretores. A comissão pede uma reunião com a Smed para tratar das demandas. A secretaria diz que recebeu a carta, vai conversar com o grupo, mas não tem definição da data do encontro.
— Percebemos uma série de situações que vinham prejudicando o bom andamento do trabalho nas escolas. Temos demandas importantes e que não estão sendo levadas em conta no planejamento. Percebemos medidas atropeladas para gastar o dinheiro da educação nem sempre da melhor forma, no nosso entendimento. A intenção é ajudar na construção de uma educação pública de qualidade em Caxias do Sul — diz Ângela, referindo que o cenário vem de outras administrações.
A secretária de Educação, Sandra Negrini, disse que são feitas reuniões semanais com as direções para fazer os encaminhamentos necessários:
— Se diálogo é dizer o que as pessoas gostariam de ouvir, nem sempre vamos fazer isso, porque temos objetivos.
A secretária lembra que já houve discordância entre um grupo de diretores em períodos anteriores a este, como quando a prefeitura decidiu distribuir marmitas aos alunos. O município fez uma pesquisa, segundo Sandra, e comprovou que a maioria das escolas queria a entrega dos alimentos.
Outra medida que gerou discussão foi a aquisição de uniformes escolares, também mantida pelo município, que serão entregues aos estudantes no que vem. Mais recentemente, a avaliação censitária para a rede de educação, do 2º ao 9º anos, contratada pelo município e que começou a ser executada na última segunda-feira (18) pela Fundação Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação.
— Para que tenhamos exatamente o diagnóstico com aquilo que as escolas já fizeram, para sabermos qual a necessidade de aprendizagem e como desenvolver projetos mais costumizados a partir de cada realidade. Muitas escolas não gostaram — explicou Sandra, referindo que teve duas reuniões com as equipes diretivas sobre o assunto e outra com a empresa.
Para além da necessidade de diálogo e comunicação entre a administração pública e a rede de ensino, algumas ações são questionadas pela comissão de diretores. Entre elas, está o fechamento da Educação de Jovens e Adultos (EJA) em quatro escolas em 2022; a falta de internet e de equipamentos que permitam acesso às plataformas; e a necessidade de obras e adquações nas estruturas físicas das instituições.
O presidente da Comissão de Educação da Câmara de Vereadores, Adriano Bressan (PTB) disse que a comissão vai participar do encontro entre prefeitura e diretores, que é interesse resolver as questões.
— Os questionamentos são relativos ao Executivo. Estamos aguardando a agenda para podermos participar junto. Se as demandas forem boas para a comunidade, a Comissão de Educação e estes vereadores estarão interessados em resolver. Vamos tentar trabalhar junto com o Executivo — declarou Bressan.
EJA vai fechar em quatro escolas municipais e será ofertado no Sesi
O fechamento da Educação de Jovens e Adultos (EJA) em quatro escolas municipais de Caxias, em 2022, foi confirmado pela prefeitura. Não terão mais a modalidade a Guerino Zugno, no bairro Planalto, a Luciano Corsetti, no Kayser, a Rosário de São Francisco, no Charqueadas, e a Angelina Sassi Comandulli, no Santa Fé. A ação é uma das questionadas pela comissão de diretores.
— É uma situação que não foi discutida com a rede para ver a melhor saída. Repensar a EJA é importante, mas de que forma? Será que terceirizar é a melhor alternativa? Nem existe no âmbito municipal regulação para alteração da EJA. Isso ainda está sendo discutido pelo Conselho Municipal — diz Ângela Honorato, presidente da comissão.
A secretária de Educação, Sandra Negrini, diz que tratou o assunto com os diretores no dia 21 de setembro. No dia seguinte foi realizada uma audiência pública, depois foram feitas reuniões com as escolas que prestam o serviço e que a medida será adotada diante da falta de alunos.
— A partir do ano que vem, funciona (a EJA) em duas escolas e não mais em seis, porque temos dados de agosto de 490 matriculados e só 80 frequentando — declarou a secretária.
Segundo a gestora, uma análise apontou a Dolaimes Stédile Angeli, no bairro Centenário, e o Caldas Júnior, no bairro Petrópolis, devem permanecer com a oferta. Os alunos que atualmente frequentam as escolas que terão o serviço encerrado poderão optar por uma dessas duas instituições, com transporte subsidiado pelo município, ou migrar para o Sesi, com o qual a prefeitura mantém um termo de cooperação.
Isso vale para todos os estudantes da EJA e o ensino seguirá gratuito para os alunos, custeado pelo município. Segundo Sandra, o investimento atual em um estudante de EJA é de R$ 12 mil por ano e, no formato com o Sesi, seria de R$ 956. Outro aspecto considerado pela Smed é que são cerca de 70 profissionais para manter a EJA nas seis escolas. Com a mudança, os 14 que têm adicional noturno incorporado devem permanecer nesse turno nas duas escolas que terão a EJA e os outros devem ser remanejados e poderão escolher a instituição de destino.
— Não é pelo investimento. É porque a legislação (federal) abriu essa possibilidade. A evasão é muito grande. Nos últimos anos, antes da pandemia, a média de evasão na Educação de Jovens e Adultos no município era de 55%. Isso significa que tem que haver uma outra forma de organização — declara Sandra.
A prefeitura deve lançar um edital de chamamento em novembro para verificar quem são os estudantes da EJA que não concluíram o Ensino Fundamental e estão fora da escola. Diante do resultado, o município poderá abrir novas turmas nos locais onde houver demanda. Para além dessa ação, a secretária pondera sobre a "produção" de futuros alunos da EJA:
— Não temos que continuar produzindo estudantes para a Educação de Jovens e Adultos. Ninguém está negando o direito ao estudo, mas temos que qualificar o atendimento dos alunos em estudo regular, ampliar a possibilidade de as crianças entrarem cada vez mais cedo na escola e junto com isso fazer um trabalho para que a EJA, em um curto espaço de tempo, não seja mais necessária.
Falta de internet antecede implantação de plataformas
Outra questão pontuada na carta é o acesso à tecnologia. Segundo a comissão de diretores, a categoria poderia ter ajuda na construção das prioridades das escolas e para melhor aplicação dos recursos, que seriam a aquisição de internet e equipamentos antes da implementação de plataformas.
— Os estudantes não têm nem acesso à internet nem a equipamentos. Temos uma plataforma de biblioteca virtual onde se gastou quase R$ 3 milhões e ela está praticamente inoperante porque as crianças não conseguem acessar em casa. Sabemos que alguns equipamentos foram comprados pela gestão para distribuir para professores e estudantes, mas não sabemos quando chegam, como e quais — comenta Ângela.
Para a diretora, o problema deveria ter sido enfrentado pelo município desde o começo da pandemia, mas ainda é pertinente já que para combater a defasagem de aprendizagem das crianças os professores terão de utilizar todos os meios e ferramentas possíveis.
— No momento em que ela (tecnologia) era mais importante, ficamos no limbo. Na nossa escola, ainda estamos com impressões (de materiais) e grupos de WhatsApp, que é o que tem funcionado na prática — relata Ângela Honorato, presidente da comissão de diretores.
Sobre a internet, a secretária Sandra Negrini disse que houve atraso na licitação porque uma empresa entrou com recurso. O processo foi suspenso. O contrato foi assinado há mais de 20 dias. Para ter acesso, é preciso que cada pessoa baixe um aplicativo da Google para internet patrocinada, que ainda não foi disponibilizado pelos fornecedores. A prefeitura notificou as empresas pelo atraso na entrega e acredita que na semana que vem ele já esteja disponível.
Problemas de infraestrutura e sedes
A Comissão dos Diretores elencou como uma das prioridades na rede municipal as obras nas escolas. Segundo a presidente do órgão, Ângela Honorato, a maioria ainda não tem APPCI (Álvará de Prevenção e Proteção Contra Incêndio). Se somam a isso, instituições que necessitam de reformas e algumas que estão fora de suas sedes, em locais adaptados, a exemplo da Afonso Secco, que está em prédio alugado desde 2006.
A reportagem pediu informações à Secretaria de Educação sobre as obras, mas a Smed disse que vai conversar com o grupo de diretores que encaminhou a carta e que vai falar com imprensa após esse encontro.
AS DEMANDAS DA CARTA DOS DIRETORES:
:: Oferta de vagas na Educação Infantil (déficit de mais de 2 mil vagas); e oferta em apenas um turno;
:: Obras que aguardam liberação de recursos para ampliar a oferta de vagas e para qualificar o atendimento aos estudantes; e escolas sem sede e em prédios locados adaptados;
:: Inexistência de um sistema informatizado que integre Smed e escolas, que favoreça o cruzamento de dados e informações e dê suporte à gestão pedagógica, administrativa e financeira;
:: A maioria das escolas não possui o Alvará de Prevenção e Proteção Contra Incêndio (APPCI) e funciona sem estar regularizada;
:: Escolas em funcionamento sem quadra de esportes, sem ginásio ou em situação precária; com necessidades de manutenção/adequação dos espaços;
:: Estudantes e professores sem acesso à internet; sem equipamento adequado;
:: Sobrecarga de professores com as demandas oriundas do trabalho escalonado e em Estudos Monitorados em virtude da pandemia;
:: Demanda reprimida na EJA, com necessidade de uma busca ativa efetiva e que garanta o acesso, a permanência e conclusão dos adultos e jovens;
:: Inclusão efetiva dos estudantes em Atendimento Educacional Especializado, imigrantes entre outros;
:: Defasagem de aprendizagem em virtude da pandemia;
:: Falta de política efetiva de testagem dos professores.
CONTRAPONTO:
:: A Secretaria Municipal de Educação disse, por meio da assessoria de imprensa, que vai conversar com o grupo que demandou a carta. Que ainda não agendou. E que vai falar com imprensa após esse encontro.
ALGUNS EXEMPLOS DESSA FALTA DE PLANEJAMENTO E ARTICULAÇÃO SÃO:
:: Terceirização da EJA nos anos finais, fechamento da modalidade em quatro escolas;
:: As contratações de plataformas para os alunos da rede municipal (biblioteca digital), com investimento de R$ 2.605.920 por um ano, sem consultar as necessidades e demandas da rede e sem a compra de equipamento para o uso das plataformas e sem a internet patrocinada, que poderia garantir o acesso;
:: Adesão de plataformas que não conversam entre si, ocasionando mais trabalho às equipes diretivas para registrar duas vezes todos os estudantes, sendo que poderia se pensar em aproveitar os dados do censo escolar para utilizar todos os serviços;
:: Falta de informações seguras acerca da adesão ao PDDE-Alfabetização no âmbito do Programa Tempo de Aprender, o que pode fazer com que a escola perca esse recurso oriundo do governo federal;
:: Compra de uniformes escolares, demanda real e necessária, mas que estaria no final da lista de prioridades;
:: Falta de garantia de profissionais de apoio pedagógico no quadro de pessoal da escola, para o ano de 2022, para sanar as defasagens de aprendizagem no pós-pandemia;
:: A proposição de uma avaliação externa, Avalia Caxias, em momento de excesso de trabalho para as equipes, com informações pouco objetivas, prazos exíguos e sem flexibilidade (quando solicitada pelas direções), regras pouco claras e que mudam na execução do processo e sem permitir segurança para aplicação das provas aos estudantes que estão em Estudos Monitorados em casa.
:: Atendimento Educacional Especializado não pode oferecer atendimento individual no contra turno, para quem não frequenta a aula presencial. Já para o Avalia Caxias o aluno deve ser chamado a comparecer na escola.
:: Cancelamento das atividades do Vinculação, principalmente as intervenções fonoaudiológicas diretamente com o público alvo;
:: Insegurança nas orientações quanto ao distanciamento dos estudantes na sala de aula omitindo-se de encaminhar uma orientação concreta como o croqui com a leitura precisa dos documentos legais;
:: Respeito e adequação à normativa do Conselho Municipal (Resolução 31/2015 art. 44 § 3ºI ) que especifica 25 alunos para as turmas de anos iniciais e 30 alunos para turmas de anos finais e 20 crianças para as turmas de Pré I e 22 crianças para as turmas de Pré II (Resolução CME 37.2017, art. 45).
:: Demora na inclusão de estudantes na plataforma digital ocasionando angústia, insegurança, aumento de trabalho para contornar esta demanda além da exposição das equipes diretivas que precisam retomar essa questão com sua comunidade escolar;
:: A proposição de um calendário de estudos com eventos importantes que se sobrepõe como o curso para gestores, dia de formação da SMED, atividades de integração das escolas planejadas no início do ano denunciando a falta de planejamento de ações importantes que deveriam constar no calendário geral antes da validação dos calendários escolares. A flexibilização deve ser dos dois lados, não só quando favorece à mantenedora.
:: Insegurança no processo de escolha de turmas para 2022 geradas com as falas de "vamos ver, estamos estudando, vamos ver caso a caso".
:: Normativa para testagem dos professores e estudantes, mais clara com informações dúbias inclusive da vigilância sanitária;
:: Publicações nos Ofícios Circulares expõe as escolas e suas equipes diretivas: falta de profissionalismo e desrespeito.
:: As obras de reformas nas escolas precisam de qualificação no acompanhamento, fiscalização e verificação da qualidade do serviço e do material, tendo em vista a falta de qualidade encontrada em ambos nas obras atualmente desenvolvidas ao passo que quando há uma obra pequena na escola há toda uma burocracia, algumas vezes impedindo ou atrasando a sua execução.