A 39ª Feira do Livro de Caxias do Sul abre oficialmente sexta-feira (29), às 18h. Entre as atrações do primeiro final de semana, uma das mais aguardadas é a escritora e criminóloga Ilana Casoy. Ela participa no sábado (30) do bate-papo Atração pelo True Crime, às 17h30min, no Palco da Feira, na Praça Dante Alighieri.
Ilana é autora de Bom Dia, Verônica, lançado originalmente em 2016 em parceria com Raphael Montes, sob o pseudônimo de Andrea Killmore, foi adaptado para o audiovisual e virou série da Netflix. Publicou ainda a série literária Made in Brazil, Arquivos Serial Killers: Louco ou Cruel?, Casos de Família (que reúne A Prova é a Testemunha, relato inédito do Caso Nardoni, e O Quinto Mandamento, sobre o assassinato do casal Richthofen).
Os enigmas são sucesso desde sempre. Por exemplo, desde que Caim matou Abel a gente tem ali o primeiro crime de família.
ILLANA CASOY
criminóloga e escritora
Por telefone, a autora atendeu o Pioneiro e falou de alguns pontos que promete mergulhar ainda mais no encontro deste sábado, em Caxias. Em meio a discussões pertinentes sobre a banalização da violência, Ilana chama a atenção para o papel da mídia nesse processo e na decisão editorial não apenas pela publicação de uma reportagem, mas pelo enfoque escolhido.
— Por exemplo, um jornal que coloca um vídeo que apresenta uma cena de violência em seu site. Fica a minha pergunta: qual era o objetivo da reportagem? Ou isso entra porque todo mundo postou e você tem de postar também, pois é uma questão de audiência? Acho que essa é uma preocupação que deve estar presente — avalia Ilana.
Leia a seguir, esse e outros pontos de vista a respeito de um assunto que tem sido chancelado pelo selo true crime, reconhecido como um gênero literário bastante popular nos Estados Unidos, por exemplo, mas que, no final das contas, é a vida como ela é, não importa em que cidade ou país, e de como podemos lidar com as mais variadas formas de violência.
A partir da sua experiência como criminóloga e pesquisadora, como a senhora observa o interesse das pessoas pelos crimes que ocorrem? Há quem defenda que há um quê de perversidade nisso.
As pessoas não aceitam a sua perversidade. Sinto muito. Por isso que a palavra psicopata ficou tão largamente usada, porque se ele é, eu não sou. Mas acontece que a psicopatia é em graus diferentes. Então, se você não aceita nada fica difícil, né? Aí você joga tudo no outro. Eu acho que tem muitos fatores e também tem o enigma. Os enigmas são sucesso desde sempre. Por exemplo, desde que Caim matou Abel a gente tem ali o primeiro crime de família. Assim como os sete pecados capitais são os sete motivos de crime de qualquer investigação.
O que muda é o jeito de contar?
Muda o jeito de contar. Agora, quando você vê no streaming ou no livro, são ambientes controlados. Se você se horrorizou com a cena, você pula a página, você corre o filme, ou muda de série. Então, você de maneira segura, no seu sofá, pode participar dessa história de alguma maneira, ok? Isso fascina, mas você controla. Eu tenho 63 anos e a minha mãe está preocupada até hoje porque eu gosto de crime. Quando saiu o livro Bom dia, Verônica (que virou série da Netflix), ela leu e me ligou, muito abalada. Porque ela falava assim: “Filha, é tudo isso que você pensa? Isso tá dentro da sua cabeça? Como você consegue pensar essas coisas?”. Então, eu acho que isso está na vida de todo mundo. Quem disse que não tem nada a ver com isso, mente. Mente melhor ou mente pior, né? E é uma maneira mais isenta e de não causar muito comentário, porque todo mundo está gostando, enfim. Até hoje tem gente que nega ao falar que não vê isso e não vê aquilo.
Em suas obras as pessoas acusam a senhora de “humanizar” os criminosos?
O recorte do crime eu não preciso perguntar para o criminoso, porque eu já li o processo e sei o que ele fez. Mas e o resto? E aí você fica sabendo que aquele homem não era só assassino, é um cara que tinha sonhos que tem mãe, que tem filho, que tem mulher, que ama. E aí as pessoas já acusam que você está humanizando... Então, gente, sinto informar que ainda não tem essa categoria de “intraterrestre”, né? Quem cometeu o crime é a pior espécie humana. Ok, é a pior espécie humana, ainda assim, ainda assim, não é só o crime que ele comete, como nenhuma pessoa só pratica boas ações.
De modo geral, nos conteúdos produzidos pelos veículos de comunicação, quando a notícia é a respeito de um crime ou de um acidente, quanto mais trágico, maior é a audiência. A violência está virando entretenimento?
Essa é a minha preocupação de hoje. Quando a violência vira entretenimento isso pode ser muito preocupante. Por isso que a gente toma muito cuidado, a gente que escreve. Usamos a violência na narrativa, porque é sobre a violência, mas ela não pode ser o fator preponderante de entretenimento. Ou se utilizar da violência só porque ela dá audiência. Por exemplo, um jornal que coloca um vídeo que apresenta uma cena de violência em seu site. Fica a minha pergunta: qual era o objetivo da reportagem? Ou isso entra porque todo mundo postou e você tem de postar também, pois é uma questão de audiência? Acho que essa é uma preocupação que deve estar presente. Não deve ser perdida de vista. É uma decisão editorial seja para livro, seja para podcast... É só contar?
E então, é só contar?
Hoje eu vejo um monte de podcasts reproduzindo, por exemplo, o true crime e a fonte é a mídia. Eu acho complicado. Eu acho que a melhor fonte é o processo. Como é que você pode pegar só informação da mídia? Porque a mídia tem um tempo diferente da Justiça, a mídia é imediata e a Justiça é lenta. E toda a vez que a Justiça tenta acompanhar o tempo da mídia dá errado. Não dá certo. Porque as respostas do sistema de Justiça andam no seu compasso e não são para hoje. Por exemplo, cada laudo demora no mínimo 30 dias. Então, quando você quer ter essa rapidez, essa junção não funciona.
Programe-se
O quê: Bate-papo "Atração pelo True Crime", com a criminóloga e escritora Ilana Casoy. Mediação do jornalista Marcelo Mugnol.
Quando: sábado (30), às 17h30min.
Onde: Palco da Feira do Livro de Caxias do Sul, na Praça Dante Alighieri.
Quanto: Entrada franca.