Cerca de oito meses após apresentar à imprensa as novas e modernas instalações de sua cantina, em abril de 1909 - tema da coluna de ontem -, o industrialista José Bisol foi vítima de um incidente dentro do próprio estabelecimento.
Ocorrido em 16 de dezembro de 1909, o falecimento de Bisol, com apenas 38 anos, provocou uma “romaria” às terras da família - na região da atual Rua Angelina Michielon, esquina com a Luiz Michielon -, enlutando boa parte da antiga Vila de Caxias. Confira trechos da repercussão da morte, publicados no jornal “O Brazil” de 18 de dezembro de 1909.
“A população caxiense foi, anteontem, profundamente abalada com a desoladora notícia de um pungente desastre. No estabelecimento do sr. José Bisol trabalhavam ativamente vários empregados, sob a direção imediata daquele laborioso industrialista. Às 4 horas da tarde, os empregados Fortunato Campagnaro, Luiz Bisol e Francisco Zorzi aproximaram-se de um dos grandes tonéis da cantina - cujo esgotamento estavam procedendo por meio de bombas colocadas na parte superior. No intuito de verificar a quantidade de vinho que ainda restava, Campagnaro, imprudente ou ignorando o perigo, resolveu descer ao fundo do tonel.
Averiguada a altura do líquido, avisaria aos companheiros para que abrissem o depósito na parte inferior. Munido de uma escada, o inexperiente rapaz empreendeu a descida. Súbito, os trabalhadores da cantina perceberam que seu companheiro debatia-se no interior do tonel. Luiz Bisol, de um salto, precipita-se em socorro da vítima. Compreendendo a extensão do perigo que ameaçava os seus dois empregados, José Bisol tenta salvá-los. O sr. Oswaldo Zimmermann, caixeiro da casa, coloca-se, então, na abertura da pipa, para deitar a mão às duas vítimas, que o sr. Bisol ia tentar erguer. Sem perda de tempo, disposto ao sacrifício, impulsionado pelo seu coração altruísta, José Bisol sumiu-se no tonel, do onde não mais devia emergir.
Ainda conseguiu levantar Campagnaro, a quem Oswaldo segurou pela camisa. Mas, infelizmente, esta rasgou-se, e o inditoso trabalhador tornou a cair. Nesse ínterim, Bisol tombava exânime, vitimado pela asfixia. Aos gritos do alarme, proferidos por Zimmermann, correram os empregados José Moretto e Francisco Zorzi, que, munidos de machadinhas, penetraram até certa altura, no interior do tonel, cujas paredes arrombaram de um lado”.
AS VÍTIMAS
“Luiz Bisol foi o primeiro que conseguiram arrancar ao mortífero ambiente, saturado de gás carbônico. As outras duas vítimas, porém, dificilmente foram retiradas, devido a ser estreita a abertura, conseguida a rápidos golpes. Chamado com urgência, o dr. Luiz Cardelli prontamente pôs em prática os imediatos recursos aconselhados em tais casos. Eficazes foram os socorros prestados a Luiz, que logo após começou a dar sinais de vida, sendo considerado salvo. Para os outros dois, desgraçadamente, foram baldados todos os esforços. Como dissemos acima, a asfixia deu-se pela absorção do gás carbônico, do que se acha impregnado o interior da cuba”.
A saber: Luiz Bisol, o único que conseguiu se salvar, era primo-irmão de José. Já Fortunato Campagnaro, natural de Antônio Prado, tinha apenas 20 anos e servia na cantina, como peão, havia quatro anos.
Origens
José Bisol nasceu em 27 de maio do 1871, na comuna italiana de Valdobbiadene, em Treviso. Em dezembro de 1871, migrou para o Brasil na companhia dos pais, chegando a Caxias em 15 de fevereiro de 1880. Conforme informações destacadas no obituário publicado no jornal “O Brazil” de 25 de dezembro de 1909, dos nove aos 17 anos, Bisol trabalhou na colônia, como agricultor.
A FAMÍLIA
Produzidos pela Adega Bisol, os vinhos Excellente e Guarany, juntamente com o “Lágrima de Caxias”, aparecem em diversos anúncios veiculados no ano de 1910, logo após a morte de José Bisol.
A casa de negócios, comandada pela senhora Maria Bisol e pelos descendentes, passou a ser denominada “Viúva José Bisol & Companhia.,”, conforme a reprodução acima. Na foto que abre a matéria, a família de José Bisol em 1914. A viúva Maria aparece junto das filhas Rosina (à direita) e Marina (ao centro). Atrás estão os irmãos David, Firmino, Mário, Pedro, Fortunato e Giácomo.
Cuba queimada
Na edição de 25 de dezembro de 1909 do jornal “O Brazil”, a família Bisol prestou um esclarecimento sobre o incidente:
“A pedido da família Bisol, foi tirada da cantina e queimada na presença das testemunhas abaixo, a cuba criminosa na qual sucumbiram asfixiados pelo ácido carbônico os srs. José Bisol e Fortunato Campagnaro, cuja declaração peço publicar para provar que não morreram afogados no vinho como consta. Caxias, 21 de dezembro de 1909. Oswaldo Zimmermann, procurador da firma José Bisol & Cia. Testemunhas: Vicente Rovea (Intendente), Oscar Hötll, Benvenuto Ronca, Francisco Leitão, Antônio Pieruccini, Adelino Sassi e João Cesa.”