Destacado na coluna da última segunda-feira, o Atelier Calegari eternizou um modo de fotografar e um estilo de imagem situada “em algum lugar entre o real e o imaginário”, conforme definido pelo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami, instituição que guarda boa parte do acervo do fotógrafo Julio Calegari (1886-1938).
Parte de sua trajetória foi destacada no livro O Instante e o Tempo - A Fotografia em Caxias do Sul, 1885-1960, lançado na Festa da Uva de 2016. Consta no texto:
“Diferentemente da maioria dos imigrantes italianos estabelecidos no RS, o destino da família Calegari não foi a agricultura: filhos de Oscar e Rosa Masserini Calegari, Battista, Gualtiero e Guilherme trabalharam como cenógrafos, atores e pintores; Virgílio encontrou na fotografia a sua vocação. Julio também se envolveu em atividades ligadas à arte, quando atuou na companhia de teatro dos irmãos, em Porto Alegre. Fascinado pela fotografia, aprendeu com Virgílio o segredo do olhar fotográfico: observando e estudando, aprendeu a compor ambientes, harmonizar efeitos de luz e sombra, as nuances do retoque e da fotopintura”.
Julio trabalhou no atelier de Virgílio até os 24 anos, quando o acaso lhe abriu novos caminhos. Em 1910, os irmãos Calegari apresentaram um espetáculo teatral em Bento Gonçalves. Foi quando Julio cogitou a possibilidade de montar o próprio negócio e assinar suas fotografias. Voltou a Porto Alegre e, com a decisão tomada, abriu o primeiro estúdio em Bento, nas proximidades do Hotel Zanoni, onde estava hospedado.
A família
Enquanto se firmava profissionalmente, Julio casou-se, em 1912, com Anita Zanoni – que foi sua primeira auxiliar. Como a esposa tinha habilidade para a pintura, Julio iniciou-a no retoque de negativos e na fotopintura. Caxias entraria na rota da família na sequência.
“Com perspectiva de ampliar a clientela, a então família Calegari (Julio, Anita e o primogênito Gualtiero) mudou-se para Caxias em 1916. No novo endereço, Julio fez sociedade com Adauto Cruz, e o estúdio “Calegari & Cruz” foi inaugurado em janeiro de 1917. Em 1920, o fotógrafo mudou-se para outro estúdio, quando adotou a denominação “Atelier Calegari” e, em 1925, transferiu-se para um sobrado localizado na então Rua Júlio de Castilhos, 1.604, de onde não mais sairia”.
Julio Calegari faleceu em 30 de outubro de 1938. A esposa Anita e a filha Ligia, ao lado do funcionário Ernesto Troian, deram continuidade ao Atelier Calegari, que funcionou até meados da década de 1950.
Nobreza
A vitrine do Atelier Calegari difundia-o como o espaço dos retratos “artísticos e modernos.” Conforme destacado pela servidora municipal Sonia Storchi Fries no livro “O Instante e o Tempo”, o período de atuação de Calegari em Caxias se insere num contexto de prosperidade econômica, de remodelação urbana com obras viárias, edificações modernas e criação de praças e parques:
“Calegari soube aproveitar essa lacuna, tornando-se o fotógrafo favorito de uma elite ansiosa para ver-se nobremente retratada”.
Luz de Rembrandt
O estúdio de Julio Calegari também foi abordado pelo historiador Anthony Beux Tessari em sua dissertação de mestrado “Retratos Burgueses: Atelier Calegari, Atelier Geremia”, de 2003. Diretor do Instituto Memória Histórica e Cultural (IMHC) da UCS, Tessari destacou a iluminação de inspiração pictórica (“luz de Rembrandt”) de Calegari, além da publicidade em torno do estúdio à época:
"Em 1927, o jornal O Popular noticiava a exposição de uma “belíssima coleção de quadros com retratos da senhorita Zaíra Eberle”, vencedora de um “concurso de formosura”, na “vitrine da alfaiataria Rufino Henriques”. Em 1935, o jornal O Momento noticiava a exposição, no próprio atelier do fotógrafo, de “uma linda fotografia, em quadro emoldurado, do sr. Abramo Eberle”. O quadro media “quase um metro de altura” e já havia sido “admirado por diversas pessoas”."
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