Com vitrines, espaços e programações repletas de coraçõezinhos graças à proximidade do Dia dos Namorados aproveito para pensar em todas as possibilidades amorosas que permeiam nossa vida. Na música Mundo dos negócios, Zeca Baleiro canta que "canções de amor se parecem, porque não existe outro amor”, mas eu discordo: amor é personalizado e cada um o recebe de uma forma diferente. O primeiro e o último namorado de alguém não ganham o mesmo tipo de amor, mas ambos são bem importantes e intensos.
Como adoro esse tema, dou uma olhada na minha estante de livros e percebo que existe uma pilha destacada das demais que versam sobre o assunto: seja na visão da literatura, no ocidente, na liquidez dos relacionamentos, na luxúria, na poesia... Fiz essa separação de propósito, numa tentativa simbólica de não banalizar o amor. Não faltam impressões e inspirações para falar desse sentimento, que a gente associa com mais facilidade aos nossos pares, mas que permeia boa parte das nossas relações verdadeiras.
Lembro, então, de uma história que ouvi há algum tempo sobre o significado da palavra amor na língua fongbé, falada principalmente na África ocidental: wan (essência) yinyin (aceitação). Amor é, portanto, um processo racional experimentado por quem descobriu a essência de uma pessoa e ainda assim decidiu aceitá-la. Por conta disso, ninguém luta para ser amado pelo outro, já que isso implica um conhecimento profundo de quem se é, e depois disso a escolha de querer aceitar ou não a pessoa. Achei isso tão lindo e fiquei pensando nas formas com que o sentimento se manifesta no nosso dia a dia, nos pequenos gestos, nas leituras que só aprendemos a fazer com o tempo. Transcende, inclusive, a verbalização do esperado “eu te amo”.
Ele pode aparecer na mãe que faz a comida favorita do filha para recebê-la, no pai compartilhando com amigos as pequenas conquistas dos filhos, na namorada deixando uma mesa ao lado da cama cheia de remédios e guloseimas para o namorado acamado não precisar sair dali, nas frutas que o marido corta e coloca em um potinho para a esposa levar ao trabalho, no filho acompanhando o pai no jogo do time do coração, mesmo sem gostar tanto de futebol, no amigo que ajuda a carregar a mudança do outro, na amiga que aprende uma técnica artística para pintar a parede do apartamento novo da amiga, no mimo entregue a um colega depois de um dia complicado no trabalho...
Iniciativas de quem, em meio à tanta correria e tanta gente, decidiu olhar para algumas pessoas especiais e enxergá-las como elas são. E escolhe permanecer, apesar de tudo. Entender que nessas circunstâncias podemos ser exatamente como somos — cansados, chatos, brabos, falantes, animados, esperançosos, doentes, inquietos, ansiosos, faceiros, sociáveis... — e seremos acolhidos é um sinal de termos bem mais do que supomos. Proponho o exercício de começar a prestar atenção nos gestos, abraços, olhares e todo tipo de declaração que só pode ser lida por quem decidiu ficar e perceber quanto amor — bem além dos corações datados das vitrines — existe ao nosso redor.