Nunca foi um bom exemplo, mas era gente boa. Achei maravilhosa a síntese realista no epitáfio que a própria Rita Lee escreveu, na autobiografia lançada em 2016. Cada um deve ter uma versão imaginária da cantora, mais próxima ou distante, e isso possivelmente seja o mais interessante na forma que tocamos os outros. Não existe controle sobre como seremos referenciadas ou rememoradas.
Lembrei disso depois de ler (e ouvir) o relato do Beto Grazziotin, amigo querido de muitos anos, de uma das conversas que teve com o filho do meio de Rita, João Lee, nas várias vezes ele que veio tocar (é DJ) em Caxias. Como costumava transportá-lo com relativa frequência, Beto perguntou se a mãe de João também recomendava que ele levasse o casaco quando fosse sair. Achei a maior graça na curiosidade permeada por brincadeira feita pelo meu amigo. É justamente o senso de humanidade que nos aproxima, né?
Beto contou que João relatou a dificuldade que teve na infância de entender que a mãe dele não era “só” uma mãe: também era a Rainha do Rock. E expressou a falta que sentia da presença dela, seja aos finais de semana de viagens para fazer shows, seja nas idas ao estúdio, seja pelo estilo de vida que ela levava. Confessou que demorou para entender que Rita não era só dele: era ídolo de muita gente. E certamente deve ter sentido um orgulho imenso ao se dar conta disso.
Isso tudo veio à tona na semana que Rita partiu e que, casualmente, antecipa o Dia das Mães, o que torna a história ainda mais bonita para pensar naquelas que nos geraram ou nos criaram.
Eu, que sou filha de uma mulher determinada a transformar a vida das pessoas, tenho ouvido relatos bem bonitos sobre a influência de minha mãe na vida de crianças e adolescentes que passaram pela Anjos Voluntários, entidade que preside voluntariamente há 12 anos. Não faltam histórias como a da Andressa, que me disse há bem pouco tempo que precisava de alguém que a direcionasse — e essa pessoa foi minha mãe. Claudiney também sempre fala isso, que minha mãe sempre acreditou nele e disse que ele podia ocupar o espaço que quisesse: hoje ele vive com a esposa na Irlanda, administrando a empresa de pintura aberta por ele.
Volto ao que o João falou e entendo bem: minha mãe também não é só minha, mas isso enche meu coração. Ver as maravilhas que ela fez por mim e minha irmã serem replicadas a outras tantas crianças é bem emocionante. E sei que esse é o legado generoso dela para ajudar a construir um mundo melhor. Na prática.
Talvez seja isso que aproxime todas as mães: elas são múltiplas e acabam influenciando um monte de gente com quem convivem, mesmo que não haja a pretensão de fazê-lo. Somos forjadas, também, pelo olhar das mães das nossas amigas e amigos, das nossas tias, de nossas dindas, de nossas sogras, das nossas profes, que acabam deixando em nós um pouco delas. Um amor compartilhado de maneiras diferentes, mas que alegra quem tem na mãe um espelho amoroso para enxergar a melhor versão de si.