Uma das sentenças que tenho escutado com mais frequência ultimamente é de que as pessoas não estão bem. E a frase é sempre proferida desse jeito meio genérico, meio impessoal, como se as pessoas fossem um grupo distante, que não têm relação com as nossas vidas. E isso está longe de ser real.
Também tenho observado uma crescente dificuldade nas relações interpessoais, em diferentes instâncias — seja atenção plena, seja viver o momento presente, seja poder confiar. Mas não com aqueles que estão longe: com gente muito próxima, com aqueles que convivemos, que moram no nosso condomínio, que sentam em mesas ao lado das nossas no restaurante ou no escritório, que levantam peso quase em sincronia conosco na academia... É óbvio que todos enfrentam batalhas pessoais e justamente esse motivo ajudaria a tornar a humanidade mais empática, mas parece acontecer o oposto. Talvez estejamos todos um pouco perdidos.
Escutei uma história ótima dia desses, que ajudou a reforçar essa percepção. Gosto muito dos preceitos budistas que, pra mim, são bastante fáceis de admirar e complexos para se colocar em prática, mas sempre aparecem muito carregados de sentido. O mais recente que ouvi, veio a partir da narrativa de terapeuta que tinha se encontrado com um grande mestre budista. O sábio disse a ele que, se quisesse ser feliz (e quem não quer?), deveria ser capaz de responder a apenas três perguntas.
Fácil, né?
Só que as perguntas precisam, necessariamente, ser respondidas na ordem que foram formuladas.
A primeira delas: quem tu és?
A segunda: aonde queres ir?
E a terceira: com quem queres fazer esse caminho?
Tenho certeza que, simplesmente ao lê-las, todo mundo já começa a pensar um pouco em si, mesmo que apareça de forma desconexa. A resposta ordenada, no entanto, tem uma razão de ser.
Segundo o mestre budista, se a ordem das perguntas for invertida, a possibilidade de causar uma imensa confusão na vida da pessoa é enorme. Na explicação dele, se alguém começa a planejar a vida em torno de alguém, sem ter a clareza de quem é, tende a acabar perdendo-se, deixando de ser quem era ou estava destinado a ser. Ou, se a pessoa toma uma direção para seguir, sem igualmente se conhecer nem elaborar profundamente quem é, acaba fazendo coisas que têm potencial de causar danos e eleger, pela estrada, companhias que não eram as mais indicadas para si.
A essa altura da vida, todo mundo já deve ter feito boas e más escolhas e nem sempre dá para ter clareza em que momento exato desse curso estamos. A recomendação dele, outra vez, é bastante simples: "volta, olha para ti na profundidade de quem és e logo começa a fazer o caminho". Faz isso sem importar-se com o resultado, sem preocupar-se com o ponto de chegada, já que, para ele, todas as vidas terminam exatamente no mesmo lugar. A diferença, simples, é a plenitude (ou a falta dela) com que chegamos até o ponto final.