Fiquei entusiasmada com a série Cem Anos de Solidão, adaptação do livro homônimo de Gabriel García Márquez, e uma das obras mais incríveis já escritas. Só assisti ao primeiro capítulo e já no começo fui arrebatada por uma obviedade: ele começa do mesmo jeito que o livro — e sou muito fã desse início, pra mim um dos melhores da literatura. Sim, sou tiete do colombiano pela forma com que narra as histórias. Anos atrás, me hospedei no Hotel Santa Clara, em Cartagena, antigo convento que ambientou De Amor e Outros Demônios e quase conseguia sentir a atmosfera literária pelos jardins e corredores. Não por acaso, Gabo tinha uma casa bem pertinho dali.
É interessante o que a imaginação consegue construir a partir de fragmentos de coisas que gostamos, né? Como dá pra se prender nelas e sublimar a realidade. Acho que precisamos disso de vez em quando. Nessa reta final deste acelerado dezembro, que traz junto com a correria insana a possibilidade de reflexão a la Simone — “então é Natal, e o que você fez...?” — fico tentando reconstituir com precisão o que estava fazendo no mesmo período do ano passado, quais eram minhas aspirações e preocupações. Penso na roupa que vesti na noite de Ano-Novo, o que mentalizei e como brindei aquela chegada. Pode ser uma tentativa de não repetir nada daquilo, porque o ano foi difícil, com momentos bem tristes e desafiadores.
Queria comer menos açúcar e ser mais atlética. Falhei em ambas. Prometi ler mais, promover encontros com as pessoas que eu gosto e aproveitar minha própria companhia. Aí mandei bem! Viajei com amigas, me apaixonei, perdi pessoas que gosto, tomei decisões difíceis, passei noites em claro. Chorei um monte: sozinha, na frente dos outros, acompanhada. No carro, no chuveiro. Gargalhei até a barriga doer, cantei em cima do palco e na mesa de um restaurante à beira mar, caminhei até cansar: no calorzão, na chuva. Comprei algumas brigas, desisti de outras. Comprei supérfluos. Descobri que sou menos estoica do que gostaria e que me mantenho otimista por opção, apesar de parecer ingenuidade. Cansei. Segui em frente, resiliente.
Tenho certeza que esse apanhado é um pouco do que acontece com todo mundo. As tais dificuldades que não aparecem nas redes sociais e ninguém se importa. No final das contas, somos nós que acabamos criando o destino, com os recursos que temos para manejá-lo (ou lidar com o que ele nos oferece). Às vezes, como cita García Márquez no comecinho de Cem Anos..., tudo é uma questão de perspectiva: “o mundo era tão recente que muitas coisas careciam de nome e para mencioná-las se precisava apontar com o dedo”. O que gente precisa é essa promessa de esperança, de poder dar nome às coisas, como se fosse possível recriá-las e evocar alguma leveza.
Que em 2025 a gente possa continuar fazendo planos, mesmo que eles não sejam cumpridos, e que a capacidade de sonhar não nos abandone tão cedo. Feliz novo ano!