“Sempre encaro a seriedade excessiva como algo meio ridículo. No poema tento conseguir o efeito que na pintura se chama chiaroscuro. Gostaria que o poema contivesse o sublime e o trivial, as coisas tristes e cômicas — lado a lado, misturadas”.
Essa afirmação maravilhosa é da poeta polonesa Wislawa Szymborska (1923-2012), a qual recomendo fortemente. Depois de ler a sentença, uma espécie de bula para a vida, percebi estar pensando nessa reflexão sobre o equilíbrio entre os extremos, a partir da menção do chairoscuro.
Um dos museus da lista de favoritos entre os que já visitei é a Galleria degli Uffizi, situado em um palácio imponente em Florença. A cidade italiana, aliás, é o berço do Renascimento e essa talvez seja uma das facetas mais encantadoras do local. Anos atrás, fiz um curso de italiano com a profe Vitalina — attraverso il cinema — que falava sobre esse período maravilhoso das artes e da arquitetura, de como a dinastia Médici tinha sido determinante para fomentar a obra de muitos artistas importantes que podem ser vistas no museu.
A própria galeria abriga um dos acervos mais interessantes de arte do mundo e traz muitas pinturas que utilizam a técnica chiaroscuro, com destaque para as pinturas do italiano Caravaggio — eis a minha relação em hiperlinks mentais. A palavra italiana que significa, literalmente, claro-escuro foi uma das novidades da pintura renascentista no Século 15 e se define pelo contraste entre luz e sombra na criação de uma obra. As sombras servem para definir o volume, para moldar o objeto retratado. Interessante é perceber que a luz também é fundamental no processo: o volume tridimensional é sugerido pela gradação de valores da cor e da modelagem da luz na pintura ou no desenho.
A psicanálise também sugere que todos temos um lado sombra, aquilo que foi reprimido e fica escondido no inconsciente. Podemos até exibir nosso lado mais solar, mas somos mais do que aquilo que mostramos. Redes sociais não conseguirão redimir essa premissa ancestral.
Precisamos aprender sobre equilíbrio. Sabe aquela história de fazer meditação, gostar do silêncio, mas dançar até o chão? De comer salada, mas não recusar uma fritura? De ser supergentil sempre mas saber ser firme em determinadas situações? Para mim, essa é a versão premium: termos consciência e liberdade para entender que podemos irradiar o mundo com nossa luz, mas precisamos trabalhar nossas sombras para que elas nos deixem caminhar.
A luz traz as pessoas para perto. A sombra ajuda a perceber que os outros também têm a mesma dualidade dentro de si e talvez só estejam nos mostrando uma de suas variações. Ficar, portanto, tem que ser uma escolha. Só quem realmente nos quer por perto aprende a lidar com nossas diferentes tonalidades, claras ou escuras.