Os meses de abril e maio nos presenteiam com belíssimos tons de azul no céu. Escrever essas palavras já é uma espécie de gentileza com a vida. Em dias recheados de expressões remetendo à doença, medo, isolamento, entre tantas, precisamos levar a alma para passear. Convite feito também através da fala comovente e poética do escritor e líder indígena Ailton Krenak: “Quando você sentir que o céu está ficando muito baixo, é só empurrá-lo e respirar.” Não são poucas as vezes em que percebemos o ambiente reduzir-se ao redor de nós. Sensação apartada de qualquer fenômeno físico: é algo brotando no peito, oprimindo, a despeito dos esforços em manter a sanidade emocional. O estado de vigília foi redobrado desde o início dessa revolução comportamental em curso que culminou em distanciamento para tantos. Nós, os felizardos que continuam sendo abastecidos com oxigênio e afeto, devemos celebrar constantemente: estamos vivos. Embora alguns arrisquem prescrever fórmulas destinadas a minimizar esse impacto, é imprescindível buscar em si itinerários de salvação. Mudou o imaginário coletivo e individual. Cada um se agarrando às reduzidas possibilidades de arejar a existência com ações atreladas ao bem-estar e ao conforto. Tentando instaurar nova noção de sentido onde já não parece haver.
É aqui, creio, ser factível dissipar as nuvens que roubam a claridade. Pessoas que estiveram em hospitais e viram realidades antes restritas às notícias vigentes, estão ensinando a beleza de aprender a ver o que até então se escondia sob pesadas camadas de repetição e inércia. Afastar, simbolicamente, a notória opressão é declarar amor ao milagre chamado de autoconsciência. O cérebro é o portal para o infinito. Pensando no significado da memória, sou inundado por sentimentos beirando o assombro. Lembrar e esquecer – processos de complexidade inalcansáveis pela linguagem. Estudando leigamente o intrincado tecido neuronal, reafirmo meu espanto diante do quanto ignoro. Sei de sua importância, mas falta-me a capacidade e o conhecimento para reverenciar ainda mais essa fabulosa “engrenagem”. Inauguro em mim a certeza de sermos potentes e capazes de resistir com bravura. Endossar a nossa aparente fragilidade ilumina inúmeras situações. Converse com alguém que espiou a morte bem de perto e será presenteado com discursos de afirmação do essencial, perdido em meio a tanto fazer. Eu me agarro a tudo que posso quando sinto laivos de melancolia se aproximando. Fugir do estado de inércia e prostração é exercício complexo, no entanto. É como se uma massa gravitacional nos puxasse para baixo.
A tarefa agora é olhar para cima. Expor as pupilas contra a luz. Forçar as paredes, até se expandirem. A amplidão não é só espacial: ela pertence à ordem da diligência e da vontade.