O Campeonato Gaúcho é uma competição que começa todos os anos com a mesma perspectiva: se tudo correr conforme a normalidade, a tendência é que Grêmio e Internacional acabem indo para a decisão. Nada espantoso, pela diferença de investimento e poder de mobilização que os grandes da Capital acabam tendo perante os demais clubes. Mas os últimos anos têm apresentado um quadro diferente, e por isso é importante ressaltar o papel cumprido pelas equipes do Interior.
O fato de geralmente a dupla de gigantes ficar com o título tem deixado em segundo plano um dado importante: das últimas 10 finais do torneio, apenas três foram decididas em clássicos Gre-nais. Juventude (duas vezes), Caxias (duas vezes), Ypiranga, Brasil e Novo Hamburgo (o único que ficou com a taça) foram responsáveis por mostrar que o futebol (felizmente) não tem uma dinâmica estática, e que o trabalho abnegado e dedicado feito no Interior do RS precisa ser reconhecido.
Alguns podem não valorizar isso, alegando que, no fim das contas, os títulos do interior são coisas raras, com apenas o Novo Hamburgo, em 2017, conseguindo a façanha neste século. É uma verdade que precisa ser contextualizada, especialmente pela diferença de orçamentos envolvidos.
Para este início de 2024, as folhas salariais de Grêmio e Inter giram em, no mínimo, R$ 15 milhões por mês em cada um deles. Como comparação, o Juventude, maior orçamento do interior, ficou em torno de R$ 2,2 milhões, enquanto o Caxias investiu cerca de R$ 600 mil. Borré, novo reforço do Inter, custa ao menos R$ 1,3 milhão ao mês, com notícias de bastidores dando conta de que o valor pode ser de até R$ 1,8 milhão.
Ou seja, o dispêndio com apenas um atleta é muito maior do que investem, por mês, ao menos nove clubes que disputaram o torneio. Somente o dinheiro importa no futebol? Claro que não, e a própria coluna está dizendo isso desde o início, mas não é possível deixar de levar em conta essa disparidade.
Grêmio e Inter, obviamente, estão na deles. Gastam porque podem e têm a concorrência de outros clubes que investem ainda mais. No entanto, os números ilustram o tamanho do feito das equipes do interior. Cito o exemplo do Juventude, que nos quatro confrontos finais do campeonato foi superior em ao menos três, e no jogo final, embora tenha saído de campo derrotado, chegou a estar na frente, tendo mantido até a perspectiva do título durante um bom tempo.
E é importante ressaltar que as belas histórias do atual campeonato foram além do Ju e do Caxias, finalista e semifinalista na competição, e que obviamente fizeram bons papéis. O Guarany de Bagé, recém retornado da segunda divisão, fez uma campanha magnífica, garantindo permanência e classificação em grande estilo. O Brasil, mesmo desacreditado de início, deslanchou e se classificou-se com certa tranquilidade. O São Luiz e o São José (na prática, um interiorano na Capital), mantiveram a tradição de campanhas sólidas e dignas.
Para o bem do futebol gaúcho, o Interior vive.