Por Ana Luiza Caruso, delegada de polícia
Não o Heitor príncipe da mitologia que entrou para a história como guerreiro de Tróia. Falo de outro herói que, como tantos outros policiais mortos em serviço, entrou para o esquecimento, deixando órfãos e viúvas abandonadas à própria sorte.
Diariamente os policiais civis entram em guerra para tornar o mundo melhor e mais seguro, mas quem se importa com isso tudo? Que tipo de insanidade faz com que um policial troque tiros em um local dominado pelo tráfico? A crença de que somos necessários para a convivência em sociedade, para a paz social.
Esses heróis que permanecem no anonimato também precisam de proteção, de condições mínimas de tranquilidade e de apoio; mesmo dentro de um Estado que se encontra enfermo. Nosso olhar para o futuro não pode ser desmotivador e os finais de semana longe da família, sem compensação em horas extras, têm que valer a pena.
Como um policial pode manter sua saúde mental intacta vendo crianças violentadas, mulheres mutiladas, homens esquartejados, mães que perdem os filhos para o tráfico, jovens viciados e famílias dilaceradas todos os dias? Lutamos com desvelo contra as tragédias cotidianas da violência, mas quem nos procura não traz consigo as boas energias da alegria e do otimismo. E esse peso é altamente contagioso.
Ademais, estamos condenados a viver em uma patologia cíclica, no qual realizamos seis vezes a prisão de uma pessoa pelo mesmo crime e continuamos vendo ela frequentar os mesmos lugares que os nossos familiares.
E no cumprimento de nossa missão institucional, como seres humanos, somos conduzidos para doenças como a depressão, ao término de casamentos e em algumas vezes até ao suicídio. Enquanto se trabalha para enfraquecer a Polícia Civil, as organizações criminosas se fortalecem e morremos um pouco. Neste caso, todos nós. Para Heitor Bossler in memoriam.