Há um equívoco na percepção dos brasileiros, neste final do ano, sobre o desempenho do Congresso. Recente pesquisa do instituto Datafolha indicou que deputados federais e senadores são reprovados por 45% da população, 10 pontos percentuais acima do resultado apurado em agosto. O parlamento teve, sim, seus deslizes ao longo de 2019, mas um olhar mais atento revela um saldo amplamente positivo para o Legislativo.
Há reparos a fazer, como as tentativas de elevar o fundo eleitoral de 2020 para R$ 3,8 bilhões e para abrandar as regras de fiscalização e punição para irregularidades cometidas por partidos e candidatos, mas nos dois casos, com pressão da opinião pública, houve recuo, mesmo que parcial. Salvo episódios esparsos de fisiologismo e corporativismo, é preciso ressaltar que, apesar da imagem desgastada, o Congresso atravessou 2019 disposto a votar matérias estratégicas e sem registro de grande escândalo de corrupção ou desvio de dinheiro público.
O parlamento teve, sim, seus deslizes ao longo de 2019, mas um olhar mais atento revela um saldo amplamente positivo para o Legislativo
Renovado, o Legislativo brasileiro teve neste ano o mérito de conduzir e aprovar a tão aguardada reforma da Previdência, basilar para a solvência do país, enquanto o próprio presidente Jair Bolsonaro pouco esforço pessoal fez para vê-la vitoriosa. O ímpeto reformista apareceu ainda na busca por ser o protagonista da reorganização do enredado sistema tributário do país, diante da desarticulação política do Planalto. Os temas econômicos, prioritários para uma nação que tenta se reerguer de uma severa crise, estiveram sempre na ordem do dia, enquanto pautas de costumes, secundárias, permaneceram hibernando. Várias medidas provisórias e decretos no mínimo questionáveis, originários do Executivo, acabaram prudentemente enterrados. Ou ao menos tiveram exageros podados.
A liderança do Congresso na agenda nacional permite até a conclusão despida de exagero de que o país vive uma espécie de parlamentarismo branco, com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, vestindo o figurino de estadista. É ainda justo reconhecer que Maia e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, foram guardiões do essencial papel do Congresso de ser peça-chave na engrenagem de freios e contrapesos que protege a democracia. Um sistema, aliás, muitas vezes acionado ao longo do ano por declarações disparatadas e flertes com ideias autoritárias do núcleo ideológico do governo, devidamente rechaçadas pelos presidentes das duas casas, tanto por respostas firmes quanto por atos parlamentares. O descrédito popular de deputados e senadores, portanto, pode ser considerado, neste momento, injusto. O Congresso, em 2019, foi o fiador da estabilidade política do Brasil.