A tentativa de levar suprimentos pode ter sido malsucedida do ponto de vista prático, mas produziu uma hecatombe política de repercussão global para o regime de Nicolás Maduro. Demonstrou em larga escala que o governo bolivariano tem pouco apreço pelo destino do sofrido povo venezuelano e que usa expedientes de tiranias para se vingar de seus adversários. O regime ficou bem mais podre desde o fim de semana.
Os atos de violência e até mesmo o uso de grupos armados para intimidar civis, provocando inclusive mortes, conseguiram impedir que o sofrimento da população fosse atenuado nesse momento. Deram também alguma sobrevida a um governo cada vez mais isolado, num país com as maiores reservas de petróleo do mundo, que não soube aproveitar essa riqueza natural para evitar o caos econômico.
Na Venezuela sob hiperinflação e sem oportunidades de emprego, a maioria de uma sufocada população não tem acesso hoje nem a bens essenciais, muito menos o direito à livre manifestação. Atos de inconformismo como os liderados pelo presidente interino Juan Guaidó, reconhecido por cerca de 50 países, nem sequer podem ser divulgados, devido ao cerceamento da liberdade de expressão.
Ainda assim, os excessos registrados nos últimos dias, responsáveis por níveis inéditos de conflito na fronteira entre o Brasil e a Colômbia, fizeram com que o autoritarismo do governo venezuelano fosse execrado internacionalmente. O bloqueio aos veículos com ajuda humanitária e a repressão reforçam o isolamento do regime, apressando a necessidades de saídas para o impasse na Venezuela. Ao mesmo tempo, transformam em motivo de chacota e escárnio os apoios que o falido regime ainda recebe, sabe-se lá em troca de que, de anacrônicos movimentos da esquerda latino-americana.
Representantes do Grupo de Lima, reunidos em Bogotá, inclinaram-se ontem por alternativas como ampliar as sanções comerciais e as pressões diplomáticas sobre Caracas, numa tentativa de enfraquecer ainda mais o cambaleante regime do ditador latino-americano. Cabe ao Brasil, como integrante da agremiação, persistir na defesa do restabelecimento da normalidade democrática no país vizinho, reduzindo níveis de tensão na fronteira que pareciam fazer parte do passado.