A polêmica sobre o rito de escolha do novo presidente do Senado reflete, mais uma vez, a distância entre Brasília e o resto do Brasil. O embate entre os defensores do voto aberto e fechado passa longe dos motivos nobres que deveriam pautar o debate – transparência, respeito à lei e aos eleitores. O que está em jogo, mais uma vez, são nomes. Sabe-se que o voto fechado favorecerá ao senador Renan Calheiros, político tradicional que busca, mais uma vez, sua fatia de poder. Desgastado junto à opinião pública, Renan aumentará suas chances de vitória se seus apoiadores não tiveram de prestar contas públicas sobre o voto. É nesse sentido que caminham os fatos depois da decisão favorável ao voto fechado do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli.
É sintomático que um político formado no berço dos piores vícios da arte brasileira de favores e acordos nas sombras, seja o favorito para ganhar, também longe dos olhos dos eleitores, o estratégico posto no Congresso. O fôlego impressionante que o mais simbólico representante da velha política exibe dá a real medida sobre a enraizamento do clientelismo na vida pública brasileira. Na posição de presidente do Senado, ele poderá controlar quando e quais pautas irão à votação, colocando o governo Bolsonaro na incômoda posição de ter de fazer parte de um jogo que o Brasil já demostrou que gostaria de ver sepultado no passado.
Pode-se criticar a interferência do STF na eleição do Senado, mas é sempre bom lembrar que o Suprema Corte foi chamada a se manifestar pelos próprios senadores, que não conseguem se entender sobre um entendimento interno e que já deveria, há muito, estar consolidado.
A disputa entre voto aberto e fechado no Senado retrata um aspecto nefasto da vida pública nacional. A regra se molda às conveniências do momento, sem qualquer compromisso com a necessária segurança jurídica.
Enquanto nossos parlamentares canalizam energias para a disputa interna de poder, o Brasil tem pressa em resolver questões bem mais relevantes, como a reforma da previdência, a violência urbana, a crise na saúde e o déficit qualitativo na educação.
Embates desse tipo são normais e saudáveis nos parlamentos. A questão brasileira é o dimensão e os mecanismos obscuros usados no processo. Brasília, infelizmente, demora mais uma vez para ouvir o Brasil, que pediu, nas urnas, ética, transparência e foco no interesse público.