Além das pessoas que ficam penduradas na linha aguardando atendimento, socorristas do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) reclamam de demora excessiva para receber indicações de onde as vítimas precisam ser levadas após receberem os primeiros socorros. A farra dos médicos que não cumprem a jornada integral na regulação do Samu estadual afeta diretamente esta agilidade.
É o que afirma o enfermeiro Cleiton Felix, ex-funcionário da central, que vem revelando a farra dos plantonistas que trabalham menos do que deveriam ao Grupo de Investigação (GDI) do Grupo RBS.
Para demonstrar essa situação na prática, a reportagem do GDI acompanhou socorristas atuando nas ruas. Em São Leopoldo, por exemplo, um sistema de motoambulâncias foi implantado para agilizar a chegada até quem precisa de ajuda. As motos chegam mais rápido nos locais de acidentes. E os primeiros socorros podem ser prestados antes mesmo da ambulância.
Em julho, os socorristas atenderam a um chamado em frente a um shopping de São Leopoldo. Uma mulher e o filho dela tinham sido atropelados enquanto cruzavam a faixa de pedestres. Quando a moto chegou, a vítima ainda não tinha conseguido contato com o médico regulador do Samu, que deveria atendê-la na central estadual que fica em Porto Alegre. Socorrista que trabalha com as motocicletas em São Leopoldo, Rafael Pohren explica a vantagem do mecanismo:
— Chegamos primeiro do que a ambulância. Prestamos os primeiros atendimentos e ficamos aqui acalmando o paciente, aguardando até a ambulância chegar.
Na ocasião, a ambulância para o transporte da mãe e da criança demorou cerca de 30 minutos. Depois que a ambulância chega e presta os primeiros socorros, o médico regulador que atende na central estadual do Samu tem outra tarefa: indicar para qual hospital ou posto de saúde o paciente deve ser levado.
A reportagem acompanhou outro atendimento, em Esteio, onde uma idosa sofreu uma queda e foi levada de maca para dentro da ambulância. Depois de atendida, o socorrista acessa um um aplicativo onde descreve a situação da paciente. E fica no aguardo de o médico indicar para onde ela deve ser levada. Em Esteio, foram 10 minutos até a socorrista ter um retorno do médico regulador, tempo em que a equipe de socorro ficou parada com a paciente dentro da ambulância.
— Mas já aconteceu de demorar mais, até uns 20 minutos — recorda a socorrista.
A reportagem do GDI ainda ouviu outros dois profissionais que preferiram não se identificar. Um dos socorristas, que atua no Litoral Norte, conta que chega a esperar meia hora pela indicação do médico regulador sobre o destino dos pacientes atendidos na ambulância.
O outro funcionário do Samu que prefere não se identificar conta uma história parecida, mas que teve consequências maiores. Ele chegou ao local de um chamado e concluiu que não poderia esperar pela regulação médica. Decidiu agir por conta própria, contrariando as normas do serviço de urgência. O socorrista foi demitido, mas entrou na Justiça e conseguiu ser reintegrado ao Samu. Agora, luta por uma indenização.
Entenda a farra nas escalas do Samu
Desde o final de agosto, o Grupo de Investigação (GDI) do Grupo RBS vem mostrando como um grupo de médicos reguladores da central estadual do Samu descumpriam suas cargas horárias de trabalho. Todos os citados atuam ou atuavam na central que fica em Porto Alegre e atende ligações de 269 cidades gaúchas. O foco dos descumprimentos está nos turnos da noite e da madrugada. Os profissionais que deveriam trabalhar 12 horas, entre 19h e 7h, atuam um terço ou menos desta carga. Mas eles recebem salários integrais, com abonos no relógio-ponto. Desde o início da série de reportagens, o governo estadual abriu uma comissão de sindicância para investigar a situação, além de afastar dos cargos o diretor de Central de Regulação da Secretaria Estadual de Saúde (SES-RS), Eduardo Elsade, e o coordenador do Samu estadual, Jimmy Luis Herrera Espinoza.
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