O Ministério Público (MP) denunciou quatro das sete pessoas indiciadas pela Polícia Civil na investigação sobre irregularidades em um contrato de aluguel firmado pela Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc). A denúncia já foi aceita pela Justiça.
São réus no processo o ex-presidente da Fasc Marcelo Machado Soares (PP), os ex-servidores públicos José Carlos Lucas Machado e sua mulher, Meriângela Simas Perillo Machado, e a esteticista Ana Maria Simas. O MP denunciou os quatro sustentando que, com conhecimento e aval de Soares, teria sido desviado da Fasc, em favor dos outros três, um total de R$ 101.926,68.
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Os quatro acusados estão com os bens bloqueados pela Justiça a fim de garantir eventual ressarcimento em caso de condenação. Além da ação criminal que começou agora na 8ª Vara Criminal, também tramita uma ação de improbidade contra os quatro acusados.
Arquivamento de caso por falta de prova contra três
Ao fazer a denúncia, o MP se manifestou pelo arquivamento do caso em relação a outras três pessoas que haviam sido indiciadas no inquérito: Luigi Antônio Gerace, dono da imobiliária Luagge, José Juarez Silveira Pereira, que ocupava cargo em comissão na Fasc, e Landia Maria Araújo Cunha, servidora da fundação.
Conforme o MP, não há provas de que os três tivessem conhecimento ou participação nas ilegalidades, e também não há vínculo entre as condutas deles e as condutas dos que se tornaram réus. A imobiliária foi envolvida na investigação porque havia recebido da Fasc pedido para encontrar um imóvel para instalação de um abrigo, mas acabou não intermediando nenhuma negociação.
A suposta fraude no aluguel de uma casa para instalação de um abrigo para crianças e adolescentes no bairro Glória, em Porto Alegre, passou a ser investigada pela Polícia Civil e pelo Ministério Público depois de Zero Hora revelar o caso em novembro de 2016. ZH apurou que o casal José Carlos e Meriângela, que à época ocupava cargos em comissão na prefeitura da Capital, teria simulado a venda do imóvel para a esteticista Ana Maria, mãe de Meriângela. Isso porque é vedado por lei negócio entre servidores públicos e o empregador, no caso, o município. Para ser alugada pela Fasc, a casa não poderia estar em nome dos servidores.
O MP obteve autorização judicial para a quebra de sigilo bancário, fiscal, de e-mails e telefônico dos principais investigados. Com isso, apurou elementos que indicam ter havido fraude.
Ao analisar o teor de e-mails enviados por José Carlos a Soares, o MP formou convicção de que o então presidente da Fasc tinha ciência da irregularidade do processo. Em uma mensagem eletrônica de 7 de dezembro de 2015, José Carlos escreveu: "Oi, Marcelo, é possível realizar contrato sem passar pelo meu nome".
Laudo indica que valor de aluguel foi inflado
Na denúncia, também é registrado que José Carlos, Meriângela e Ana Maria, para dar aparência de legalidade ao contrato de aluguel, firmaram perante o 4º Tabelionato de Notas de Porto Alegre uma escritura pública de compra e venda.
O documento serviu para atestar que a casa fora vendida para Ana Maria por R$ 250 mil (R$ 200 mil já teriam sido pagos e R$ 50 mil estariam sendo pagos naquele ato). Análises técnicas do MP mostraram, entretanto, que Ana Maria não dispunha desse valor para comprar a casa.
Além disso, o MP confirmou que o valor do aluguel acertado entre as partes foi superfaturado. Laudo técnico indicou que o aluguel do imóvel seria de R$ 3,5 mil a R$ 4 mil, bem inferior aos R$ 10 mil pagos mensalmente pela Fasc. O contrato teria duração de cinco anos, num total de R$ 600 mil.
Com base na quebra de sigilos bancário e fiscal, o Núcleo de Inteligência do MP apurou que Ana Maria repassou a maior parte dos R$ 101.926,68 recebidos da Fasc para o genro e para a filha, por meio de depósitos bancários ou transferências. Foram R$ 64.837,00 para José Carlos e R$ 2,5 mil para Meriângela.
A Justiça registrou haver "meios probatórios suficientes para dar início à ação penal". José Carlos, Meriângela e Ana Maria estão sendo processados por peculato, falsidade ideológica de documento particular, falsidade ideológica de documento público e lavagem de valores. O ex-presidente da Fasc responde judicialmente por peculato. O casal foi exonerado dos cargos em janeiro.
CONTRAPONTOS
O que diz a Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc)
"A Fasc lançou o Edital 001/2017, publicado em 25 de abril de 2017. Com a proposta, os serviços de 10 abrigos residenciais próprios da Fundação passam a ser 100% conveniados. Dentre eles, está o abrigo do bairro Glória. O julgamento será realizado no dia 24/05/2017, e a comunicação do resultado do Edital será publicada no Diário Oficial de POA/DOPA em 25/05/2017. Sendo assim, os adolescentes da casa serão transferidos e ficarão sob responsabilidade da instituição que ganhar o chamamento público. E a casa (alvo da investigação) será entregue pela Fasc". Sobre a acusação envolvendo o ex-presidente, a Fasc não quis se manifestar.
O que diz Alexandre Dargel, advogado de Marcelo Machado Soares, ex-presidente da Fasc
"Marcelo não tem vinculação com qualquer prática criminosa e isso será provado no processo."
O que diz Carlos Thompson Flores, advogado de José Carlos Lucas Machado, Meriângela Simas Perillo Machado e Ana Maria Simas
"Em torno deste contrato (de aluguel) se instaurou uma confusão. Tivemos acesso à denúncia e o que foi imputado aos meus clientes não corresponde aos fatos, de maneira que a inocência será provada ao longo do processo."