Castigada por uma enxurrada histórica seis meses atrás, a região do Vale do Taquari recebeu repasses dos governos estadual e federal que superam meio bilhão de reais ao longo desse período, mas ainda enfrenta desafios para se reerguer por completo.
Um levantamento realizado com dados dos governos estadual e federal indica que os municípios mais afetados pela cheia de setembro do ano passado já receberam pelo menos R$ 511 milhões em ações como recuperação de estradas, reconstrução de escolas e unidades de saúde, recomposição do solo e investimentos em Defesa Civil, entre outras iniciativas. Essa conta não considera outros benefícios como liberação antecipada de FGTS, Bolsa-Família ou oferta de linhas de crédito.
O aporte financeiro contribuiu para reconstituir, em parte, o cotidiano nas cidades mais castigadas. Mas, conforme prefeitos da região, a demora na entrega de moradias provisórias ou definitivas ainda é uma dificuldade a ser vencida.
— A ajuda que recebemos do Estado e da União até o momento contempla 70% dos estragos. Vieram recursos para recuperar as encostas do Taquari, para saúde, educação. Mas ainda temos pontes que não foram contempladas, e nos habilitamos para a reconstrução de 300 casas. Mas ainda estamos aguardando — afirma o prefeito de Lajeado, Marcelo Caumo.
As primeiras moradias provisórias na região devem ficar prontas neste mês – há 20 unidades em fase final de construção em Roca Sales e 28 em Arroio do Meio. A dificuldade para liberar terrenos é uma das justificativas para a demora na entrega, possibilitada por meio de parceria entre municípios, Estado e Sindicato da Indústria da Construção Civil do Rio Grande do Sul (Sinduscon-RS).
No caso das residências definitivas, viabilizadas pelo governo federal, um dos desafios é vencer as etapas burocráticas de programas como o Minha Casa Minha Vida. Na semana passada, a União anunciou a liberação de R$ 44 milhões para erguer 600 casas para vítimas de calamidades em áreas rurais no Estado – 170 das quais no Vale do Taquari. Além disso, já estava acertada a construção, em áreas urbanas, de 150 unidades em Lajeado e 180 em Encantado.
— Esses contratos que já foram assinados foram os mais rápidos da história do programa (Minha Casa Minha Vida). Entendemos que se trata de uma situação de calamidade, mas há um processo que precisa ser cumprido. Também havia uma certa tranquilidade por conta das residências provisórias, só que acabaram atrasando — argumenta o secretário de Comunicação Institucional do governo federal, Emanuel Hassen, ex-prefeito do municípios de Taquari.
O prefeito de Muçum, Mateus Trojan, afirma que parte dos recursos recebidos do Estado e da União, complementados por verba própria, segue custeando 180 contratos de aluguel social em vigor no município, que tem necessidade de repor 400 casas comprometidas pela enxurrada de setembro.
— Como os repasses previstos pelo governo estadual estão terminando, estamos em tratativas para buscar uma renovação — afirma Trojan.
Muçum conseguiu ainda liberar R$ 9,6 milhões da União para reconstruir a ponte Brochado da Rocha, que liga a cidade à vizinha Roca Sales. O trabalho tem previsão de durar cinco meses.
O prefeito de Roca Sales, Amilton Fontana, afirma que ainda há quatro famílias vivendo em alojamentos garantidos pela prefeitura. Os demais atingidos se abrigaram em casas de parentes ou se beneficiam do aluguel social.
Dos relatórios de repasses à região informados pela União e pelo Estado, o maior valor transferido pelo governo federal (perto de R$ 120 milhões) se refere a recursos destinados à Defesa Civil, seguidos por remessas de kits-calamidade e outras iniciativas emergenciais (R$ 80 milhões) e por R$ 57 milhões para o setor da educação.
Em relação às verbas estaduais, de quase R$ 300 milhões reservados a regiões afetadas por eventos climáticos, pelo menos R$ 133,8 milhões beneficiaram o Vale do Taquari. Dessa fatia, R$ 60 milhões serviram para reparar estradas, R$ 14 milhões foram destinados à saúde, e pouco mais de R$ 10 milhões para Defesa Civil (veja a lista completa no quadro abaixo).
Auxílio ao Vale do Taquari
Veja um resumo dos valores destinados às principais ações nos municípios afetados pelas chuvas seis meses atrás
Governo federal
- Repasses via Defesa Civil - R$ 119,284 milhões
- Remessa de kits-calamidade, medicamentos, insumos de saúde, instalação de hospital de campanha, envio da Força Nacional do SUS - R$ 80 milhões
- Emergência do Sistema Único de Assistência Social (construção, reformas e melhorias em centros de referência em assistência social) - R$ 50,4 milhões*
- Repasses referentes a melhorias em Saúde - R$ 49,5 milhões (R$ 46,05 milhões para reequipar hospitais e R$ 3,5 milhões para reequipar unidades básicas)
- Recursos para Educação - R$ 29,186 milhões para obras em sete creches e escolas, e R$ 28,734 milhões para equipamentos
- Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) - R$ 14,9 milhões disponíveis para execução
- Desenvolvimento social - Serviço de Proteção em Situação de Calamidades Públicas e Emergenciais - R$ 5,6 milhões
* Inclui alguns municípios de outras regiões afetados pela chuva
Total: R$ 377 milhões
Governo estadual
- Reparação de estradas (Daer) - R$ 60 milhões
- Recursos extraordinários para a Saúde - R$ 14,710 milhões
- Repasses para fundos municipais de Defesa Civil no Taquari - R$ 10,950 milhões
- Recuperação de solo de áreas atingidas - R$ 9,801 milhões
- Custeio da Defesa Civil, forças de segurança e IGP - R$ 9,742 milhões
- Volta por Cima - Auxílio para situações de calamidade ou emergência destinado a população vítima das contingências decorrentes de eventos climáticos - R$ 8,219 milhões
- Horas-máquina para recuperação de estradas vicinais - R$ 5,898 milhões
- Obras e reformas emergenciais nas escolas - R$ 4,075 milhões
- Equipamento e mobiliário para espaços escolares - R$ 3,469 milhões
- Aluguel social - R$ 2,384 milhões
- Agiliza Efeitos Climáticos - R$ 2,042 milhões
- Desapropriação para atender famílias em Muçum - R$ 1,850 milhão
- Equipamentos de informática e mobiliários para quartéis da BM atingidos por enchente - R$ 576.396
- Auxílio aos municípios atingidos por eventos climáticos - R$ 146.150
Total: R$ 133,8 milhões
Empresários ainda buscam melhores linhas de financiamento
Outra estratégia adotada para amenizar o impacto da enchente no Vale do Taquari, a oferta de linhas de financiamento com condições especiais atendeu principalmente pequenos e médios negócios, foi recebida com restrições por parte do empresariado da região. A União chegou a anunciar R$ 1 bilhão em recursos a juro zero pelo BNDES – o que acabou não se confirmando.
— Não houve a efetivação do auxílio que se esperava para os empresários, principalmente no caso das grandes empresas, o que frustrou muito. O governo federal agendou uma reunião com o BNDES recentemente, os técnicos recolheram as demandas, mas não houve uma proposta concreta para eles — avalia o presidente da Câmara da Indústria, Comércio e Serviços do Vale do Taquari (CIC Vale do Taquari), Ivandro Rosa.
O Secretaria de Comunicação do Planalto informa que foram destinados via Caixa R$ 162 milhões para o Programa Nacional de Apoio ao Médio produtor (Pronamp) e R$ 20,4 milhões para o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), além de outros R$ 118 milhões via Banco do Brasil para o Pronaf (com R$ 23,5 milhões em subsídios de juros pela União).
— A questão é que, para as grandes empresas, não foi feita uma oferta atrativa. Isso ainda está sendo buscado — argumenta Ivandro Rosa.
Em nota, o BNDES informou que o programa emergencial de crédito solidário, que oferecia garantias para a contratação de financiamentos, viabilizou créditos de R$ 490,5 milhões até o final do ano passado, atendendo a cerca de 800 empresas. Outra linha, voltada a crédito rural por meio de cooperativas para áreas afetadas por intempéries, está com condições vigentes até o final deste mês, ainda sem resultados consolidados.